Cartas do Alto
Versão para cópiaMensagem a Luis Guerrero Ovalle
Ovalle, amigo,
Diante de nós é a paisagem tumultuada. O mundo em transição.
De um lado, a ausência de amor nos corações e, de outro, as ideologias envenenadas conturbando o espírito e ameaçando-lhe as construções milenárias.
A abundância de recursos materiais não soluciona o problema, de vez que a fortuna raras vezes é manejada pelo homem a serviço da alma, enquanto a Ciência, na exaltação de cultura exclusiva do cérebro em que se desvaira, não consegue penetrar a esfera do sentimento em proveito da criatura imortal para quase se deter, tão-só, no campo de transitória dominação.
Entre as calamidades morais que pesam sobre a fronte do planeta, encontramos no Espiritismo, em sua expressão de Evangelho restaurado por Allan Kardec, a luz capaz de clarear o caminho e dissipar as trevas.
Exumar o Cristo de Deus e associá-lo à nossa vida na Terra, tanto quanto desentranhar o nosso próprio coração do labirinto de enganos em que nos desgovernamos, há séculos, para reuni-lo ao Cristo de Deus, é a nossa tarefa primordial na Doutrina Espírita, que nos solicita trabalho e consagração.
Em toda parte, surpreendemos a multidão à espera da Boa Nova restaurada, com fome de paz e sede de esperança.
Não se trata de um movimento de fé enquistada na interpretação dogmática, em matéria de religião. Temos à frente a sementeira da fé viva e da religião dinâmica da sabedoria e do amor, cujo templo se erige em cada consciência e cujo serviço de veneração a Deus se estende de cada um de nós em favor dos semelhantes.
Kardec, sem dúvida, em nome do Senhor, descerrou a estrada libertadora e edificante que nos cabe trilhar. E, de nossa parte, urge explicar-lhe os conceitos, ampliar-lhe as tarefas, adubar-lhe a lavoura da verdade e abraçar-lhe o apostolado de regeneração com todas as nossas forças. Se é justo que a Doutrina Espírita exija a presença dos heróis da caridade sarando corpos enfermos, vestindo os nus, albergando os desamparados e recolhendo os pequeninos sem teto, não nos será lícito esquecer a necessidade dos artífices da palavra e do pensamento, capazes de burilar as ideias novas com vistas ao esclarecimento popular.
Dar pão que recupere as forças físicas em processo de exaustão, mas oferecer o pão espiritual que revivifique a alma estirada na indisciplina ou na ilusão, em revolta ou desalento.
Divulgar o Espiritismo na atualidade da Terra é tão importante quanto fazer luz para arredar o poder da noite.
Em nome, pois, de muitos companheiros que delegam ao servidor humilde que somos a distribuição de falar-lhe diretamente ao coração de seareiro da verdade, concitamos o querido amigo ao prosseguimento de sua obra, notadamente no campo da língua hispânica, que abrange extensa família de povos na família dos povos da humanidade.
Trabalhar, sim, meu amigo. Aperfeiçoar a frase e revesti-la de luz. Cunhar o texto construtivo com o material das realidades da vida e apresentá-lo no veículo do amor que salve e levante, construa e recupere corações.
Abrir clareiras na selva das sombras que se agigantam, organizando sendas novas de libertação e reconforto, que outros pavimentarão, mais tarde, para o intercâmbio perfeito entre o futuro e a verdade espiritual que lhe comandará os destinos.
Apontar o rumo certo às gerações vindouras e criar, com a força do verbo, o caminho adequado que conduza os homens de hoje para as vitórias de amanhã.
Usar a palavra e santificá-la, seja na tribuna, ou na pena, junto das multidões ou na intimidade dos simpósios, proclamando os conhecimentos superiores da imortalidade do ser, da justiça na reencarnação, dos princípios de causa e efeito, dos imperativos da solidariedade universal, da necessidade do aprimoramento íntimo, do poder do trabalho, da alavanca renovadora do bem e do triunfo sobre a morte, a fim de que o homem se reconheça herdeiro de Deus, com todas as possibilidades dos filhos de Deus, na Terra, quanto em outras pátrias do reino cósmico, em plenitude de eternidade.
Sigamos à frente, oferecendo o melhor de nós mesmos à grande causa da humanidade. Esquecer injúrias, recordar bênçãos. Desculpar a incompreensão e cultivar o entendimento. Cobrir a discórdia com o bálsamo da oração e refazer o plantio da paz, seja onde for. Nunca inventariar deserções e desapontamentos, e entesourar confiança e otimismo na convicção de que todos somos irmãos a caminho do regozijo final, guardando cada um de nós uma visão provisória da vida, conforme o degrau em que nos coloquemos na sublime escalada. Nunca recuar, mas avançar sempre. Chorar, por vezes, porque a lágrima é suor do coração em testemunho de fé purificadora, mas nunca desanimar ou aderir às perturbações que, frequentemente, nos convidam à queixa e ao desequilíbrio à margem da senda que se nos abre às realizações.
Saudamos, em sua presença e na presença da companheira que lhe partilha a obra de amor e verdade, a presença de irmãos que retornam ao próprio lar. Com o lume da alegria e da confiança, nós, os companheiros desencarnados, dos que lhes recebem a carinhosa visita, temos constantemente de repetir-lhes no abraço jubiloso: “Irmãos queridos, em todo tempo estaremos reunidos no domicílio de nossas aspirações, compartilhando a mesma tarefa, na mesma vibração de fraternidade e de esperança”.
Entreguemo-nos ao trabalho do bem na segurança interior de nossa fé. Ofereçamos ao Senhor o melhor de nossas vidas e estejamos seguros de que o Senhor jamais nos relegará para fora de sua bênção.
Irmãos queridos, caminhemos de corações entrelaçados na subida áspera e luminosa em direção aos objetivos supremos dos nossos ideais, e que Deus nos inspire, esclareça, guarde e abençoe.
Reformador — Setembro de 1980 [Na revista précitada à página 285 há excelentes informações sobre o irmão a quem a mensagem foi dirigida].
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