Chico Xavier Inédito

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Capítulo IX

Lâmpada acesa

Jésus Gonçalves reencarnou no pequeno vilarejo de Borebi, em 12 de julho de 1902. Pobre, órfão nos primeiros anos de vida, autodidata, conseguiu vencer na vida, adquirir estabilidade profissional, social e familiar. A vida, porém, reservava-lhe duros resgates. Diagnosticado com hanseníase (lepra) antes dos 30 anos, foi internado compulsoriamente no Hospital de Aymorés (Bauru-SP) e lá passou a viver o grande drama íntimo da revolta pelos sofrimentos físicos e a solidão que a moléstia lhe impunha. Ateu, no viço da juventude, ele procurava na poesia, no teatro e na música, derivativos para enfrentar sua desdita. Foi assim que criou grupos dramáticos e musicais em Aymorés e Pirapitingui, para onde se transferiu em 1937. No ano de 1943, converteu-se ao Espiritismo e, até 1947, quando desencarnou, foi um exemplo vivo de fé e de resignação e um excepcional propagandista da Doutrina.

Após o desencarne, foi-lhe revelada a situação de resgate compulsório que havia passado nesta encarnação como leproso pelos desvarios e crimes cometidos em suas encarnações como Alarico I e Alarico II e a sua redenção espiritual. Em vida, ele que se correspondia com Chico Xavier, logo após seu desencarne começou a enviar comunicações belíssimas em poesia e prosa por intermédio do médium, sempre falando de suas vidas pretéritas e incentivando companheiros à solidariedade junto aos seus irmãos hansenianos, como a presente mensagem dedicada ao confrade Flores e, seu grupo, que visitavam os Sanatórios em que estavam recolhidos esses doentes.


Irmão Flores,

Deus o abençoe pelo serviço aos hansenianos. Eu também peregrinei nos vales das sombras, de corpo chagado e oprimido, afim de curar as úlceras da alma endividada e endurecida… Sim, meu amigo, o cântico da gratidão é mais harmonioso nas vozes que muitas vezes se consumiram, no desespero e na angústia, como a flor é mais bela e milagrosa na haste castigada de espinhos. Sou daqueles leprosos do Evangelho que não voltaram ao Divino Médico para agradecer, mas que, em seguida a dolorosas jornadas nas trevas, regressa aos discípulos d’Ele, renovado e humilde por beijar-lhes as mãos. Temos grande serviço a fazer, em favor do ressurgimento da esperança na alma daqueles que se refugiaram na solidão. Consciências em luta acerba sob golpes do escopo do sofrimento, as nuvens da aflição no pensamento atormentado transformam-se em portadoras da tempestade de lágrimas asfixiantes. Seja o Espiritismo Cristão uma lâmpada acesa dentro da imensa noite. Não basta o pão que mitigue a fome ou o bálsamo que nos suavize as feridas no corpo da . Temos necessidade de carinho, de fraternidade, de compreensão. É nessa base de entendimento evangélico que conseguiremos mais eficiente equação ao problema de conforto aos hansenianas, nossos irmãos. Por que não sorrir ao semelhante que a provação redentora pune e aprimora? Por que retirar o gesto amigo ao companheiro relegado quase sempre ao infortúnio e à desesperação? Doutrina consoladora e sublime, o Espiritismo vem abrir-nos horizontes novos.

O hanseniano não é um revoltado congênito nem um celerado que as leis sociais possam condenar ao supremo abandono. Haja mais amor e a sementeira da fé viva florescerá para os que receberam com a enfermidade terrível o banimento do lar e a deserção, muitas vezes dos corações mais queridos. Estamos a postos e rogamos geral auxílio. Não esmolamos dinheiro para os corações infortunados que a dor situou em resvaladouros de infinita amargura. Pedimos fraternidade, compreensão, esperanças e luz. Unamo-nos, amigos, no serviço de proteção espiritual que aclare a senda dos companheiros que descreram da piedade humana! Afeiçoemo-nos ao Evangelho que nos recomenda o amor sublime uns aos outros.

E agradecendo-lhe, meu amigo, pela tarefa iniciada, em beneficio da renovação interior dos filhos da lepra redentora, sob a claridade do Espiritismo cristão, deixamos a todos os cooperadores do bem o apelo a favor dos que choram na sombra, em nome d’Aquele Divino Amigo que se imolou, por nós, nas chagas da cruz.


Jésus Gonçalves


(Mensagem recebida pelo médium Francisco Cândido Xavier, em 23-8-1948, em reunião pública em Pedro Leopoldo.)


Eduardo Carvalho Monteiro


Jésus Gonçalves
Francisco Cândido Xavier

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