Chico Xavier Pede Licença
Versão para cópiaLema da Vida
Indagas, muita vez, alma querida, Como apagar ofensas, Conforme ensinas, crês, queres ou pensas No perdão por dever… Fita o mundo em que moras, Todo bem que se faz ou que se imortaliza Conserva por divisa: Renovar e esquecer. A noite cria a escuridão que aflige Pelo fardo das sombras exteriores, Mas eis que surge a aurora e canta em cores, Saudando o novo dia a renascer… Nada recorda as trevas dissipadas, O Sol fulge nos lares onde estamos, Não longe louvam pássaros nos ramos: Renovar e esquecer. O grande rio abaixa-se de todo Para abraçar os córregos da serra E colhe humildemente os detritos da terra, A servir e a correr; Por mais que se lhe atire pedra e lodo à face, Não revida, não chora, não blasfema, Segue espalhando amor, sustentando por lema: Renovar e esquecer. No mar, a tempestade grita em fúria… A nave mais potente, a mais ampla e veloz, Recorda simplesmente uma casca de noz Em férrea luta por sobreviver… Depois a paz do Céu derrama-se no abismo, O torvelinho cessa, a estrada é mansa E a maré balbucia a oração da esperança: Renovar e esquecer. Assim também, se amados te esqueceram, Se pelos bens, que aguardas e produzes, Recebes tão somente as lágrimas e as cruzes De provas que te fazem padecer, Desculpa, serve, ampara, ama e auxilia E encontrarás enfim, por mais triste ou cansada, A clara voz de Deus, lembrando-te na estrada: Renovar e esquecer. |
Ao remeter-nos o poema, Chico Xavier nos conta que ele foi recebido numa reunião em que havia numerosas pessoas de fora — grande número de pais e mães — que tinham ido a Uberaba. E acrescenta:
“Entretanto, a maioria apresentava ressentimentos e queixas contra familiares que se vão alterando com os novos tempos. Filhos que não mais desejam a atmosfera do lar, outros que se não harmonizam com os compromissos assumidos, muitos que se mostram agressivos em excesso, parentes que se revelam modificados, companheiros em atrito. No estudo evangélico da noite tivemos o de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. No encerramento, nossa irmã e benfeitora espiritual, Maria Dolores, nos trouxe a página “Lema da Vida”. Os conflitos são tantos! E a necessidade do perdão recíproco é cada vez maior.”
A mensagem poética dirige-se às criaturas em conflito nesta hora difícil do mundo. Não se trata de uma poesia para efeito puramente estético, mas de uma mensagem espiritual vazada em forma poética. À maneira dos salmos de David e dos cantares de Salomão, ou ainda dos poemas orientais, as poesias mediúnicas devem ser lidas e meditadas. Não se dirigem ao homem exterior, mas ao homem interior, ao espírito. Nesse poema a força poética se concentra na relação da criatura com a Criação, do homem com a Natureza. As imagens exteriores agem como elementos didáticos para despertar o espírito.
O lema da vida — renovar e esquecer — estabelece a ligação telúrica do espírito com os elementos da Natureza. O tema evangélico, que se estudava na reunião, era a mensagem mediúnica de Simeon, “”, recebida em Bordeaux, na França, em 1862. Para nos renovarmos espiritualmente precisamos não apenas de perdoar, mas também de esquecer as ofensas.
O problema do esquecimento é encarado em termos existenciais, de renovação do espírito na existência. Mas esse problema pode também ser encarado em termos de reencarnação, explicando-se, então, o esquecimento das vidas anteriores, para que o espírito se renove nas vidas sucessivas. Assim, o lema da vida — renovar e esquecer — inverte os seus termos ao projetar-se além da vida, nas vidas sucessivas, tornando-se esquecer para renovar.
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