Coração e Vida

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Capítulo VIII

A promoção


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Resplendia o jardim celeste em pleno Espaço.

Era o maravilhoso dia

De alto deslumbramento

Do encontro de união e de alegria

Dos que haviam servido, passo a passo,

Nas tarefas do amor sem recompensa

Na Terra, onde o egoísmo

Tanta vez se condensa.


Era uma nesga azul de solo rarefeito

Matizada de flores

Bordadas de arabescos multicores

Onde podia respirar apenas

Quem já pudesse irradiar

As vibrações serenas

Da fé sublime alçada ao bem perfeito.


Não eram muitos os conquistadores

Daquela posição de excelsos resplendores;

Quarenta e dois Espíritos somente,

Todos eles modelos de bondade,

Eram ali o escol da Humanidade,

Em atitude calma e reverente

Esperando a sonhada promoção

Que constaria

Do poder de elevar-se à próxima ascensão.


Na luminosa e ilustre confraria

Estavam sacerdotes de renome,

Filósofos, notáveis pensadores,

Nobres mulheres, santas heroínas,

Monges mostrando frontes peregrinas,

Jovens que haviam sido vencedores

De tentações terríveis…

Todos trocavam frases de altos níveis…

Somente alguém, ali, em meio a tudo,

Que era festa de brilho e de beleza,

Parecia um mendigo triste e mudo,

Era o irmão Jonaquim,

Desconhecido entre os demais…

Vestia-se com peles de animais,

Remarcadas de lama…

Na expressão rude e feia,

Exibia sinais de sangue, lodo e areia;

Jazia ele a um canto, humilde e pensativo,

Enquanto o grupo conversava em festa.


Chegara o instante, enfim,

Da nobre promoção;

Aquele dos presentes que tivesse

O menor peso espiritual

Seria alçado à frente

Do caminho esplendente

Para mansões mais altas e mais belas

Da Vida Universal.


Vieram ao recinto os dois encarregados,

Ambos chamados Anjos da Balança,

E os candidatos sem qualquer despeito,

Deixaram-se pesar num instrumento perfeito

Que lhes patenteava

A evolução imensa…

E o peso em cada um

Era leve, tão leve,

Que não se via quase

Uma pequena base

Para que se notasse a diferença…


O recatado Jonaquim

Ficou de longe, muito ao longe,

E sendo o último no exame

Foi chamado por fim.


Ele veio acanhado,

Pés descalços no apoio de um bordão,

E um dos dois mensageiros perguntou:

— Jonaquim, meu irmão,

Dizei: qual foi na Terra a vossa religião?

Precisamos aqui de vossos dados

Para serem por nós

Devidamente revisados.


No entanto, Jonaquim, humilde, respondeu:

— Anjo bom, sou sincero… Crede!… Eu

Não tive sobre a Terra a fé pregada,

Acreditei, como acredito agora

Na presença de Deus que nos guarda e aprimora,

Entretanto,

Por mais que eu desejasse procurar

Um templo ou algum lugar

Para aprender como se adora a Deus,

Nunca pude sair,

Da choça em que morei, ao pé de antiga estrada

Onde os que sofrem eram irmãos meus…

Era um deserto a terra em que vivi…

Despendi muito tempo

A transportar crianças e doentes

Que ansiavam por água em solos diferentes…

Minha estreita choupana

Era uma porta aberta à desventura humana…

Ouvi a confissão de míseros velhinhos

Que clamavam, em vão, pelos parentes,

Agonizando, desvalidos,

E aguardando, debalde, os próprios descendentes…

De quantos eu cerrei, na morte, os olhos baços

Não saberei o número por certo…

Só Deus sabe os que vi morrendo nos meus braços

E os que enterrei, a sós, na penúria sem nome,

E as crianças sem apoio que me buscavam,

Sentindo sede e fome…

Deus me perdoe se nunca fui às crenças

Para estudar a fé e entender diferenças…

Ouvi dizer, na Terra, que houve um homem

Que nunca descansou, fazendo o bem,

Que amou aos bons e aos maus sem ferir a ninguém!…

Ah! como desejava tê-lo visto!…

Dizem que se chamava Jesus-Cristo;

Nunca lhe ouvi, no mundo, os lúcidos ensinos

E ouvi também dizer que por serem divinos

Ele morreu na cruz…


A pequena assembleia

Escutava, expectante e enternecida

Aquele que soubera amenizar a vida.

E os Anjos da Balança

Puseram Jonaquim, sob o exame preciso,

Em nome de Jesus…

Depois anunciaram num sorriso

Que o velho Jonaquim tinha o peso da luz.




Maria Dolores
Francisco Cândido Xavier


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