Diário de Bênçãos
Versão para cópia
Prefácio de Emmanuel
Leitor amigo.
Este livro é comparável à formosa roseira na primavera. No verde das hastes, ricas de seiva, se destacam espinhos de provação e saudade, mas sobre a auréola dos ramos, desabrocham rosas de júbilo e reencontro, de esperança e alegria, peroladas pelo orvalho das lágrimas de reconhecimento a Deus e de confiança no Tempo.
Mãe e filha aqui se enlaçam, entre o Plano Físico e o Plano Espiritual, ambas aparentemente separadas pela morte, no entanto, sempre unidas na afeição que nunca desaparece.
Dispensamo-nos de comentários outros para entregar este diário de bênçãos à sua apreciação, através da qual verificaremos juntos a Infinita Bondade do Senhor, a se nos revelar na perenidade da vida e na sublimação do amor imortal.
Uberaba, 30 de janeiro de 1983.
[Obs. VERSÃO OBJETIVA: Esse livro não foi transposto integralmente para essa versão digital. Do seu conteúdo foram utilizadas as seguinte páginas do respectivo livro impresso: 5-16, 25-27, 30, 39-43, 47, 53-58, 71-96. Gratos pela compreensão.]
Notas e identificações de Rubens S. Germinhasi
Prezados Leitores:
Nesta página apresentamos os familiares e amigos de Cristiane, identificados nas diversas mensagens psicografadas pelo médium Francisco Cândido Xavier.
Pais: Luiz Bernardo Rodrigues de Moraes e Vilma Ducatti Rodrigues de Moraes.
Irmãos: João, Luiz e Ageu Rodrigues de Moraes.
Avós: Dulcina Lara Ducatti, materna.
Olimpia Belo Lara, desencarnada em 21.01.1964, bisavó materna.
Lourenço Ducatti, desencarnado em 21.12.1914, trisavô materno.
Maria de Souza Coelho Rodrigues, paterna.
Tio: Veimar Carlos Ducatti, irmão da Sra. Vilma Ducatti Rodrigues de Moraes, médico em Ituverava, Estado de São Paulo.
Amigos: Virna Gusmão, Paulinho Achy, Dr. Edson Evangelista de Souza, médico psiquiatra.
Irmã Jovina: Fundadora e Dirigente de um pequeno asilo de pobres na Bahia.
Albanize (Alba, Iaia): Amiga da Sra. Vilma Ducatti Rodrigues de Moraes, desconhecida anteriormente por Cristiane. Dione, Denio Dener, Danilo e Débora, filhos da Sra. Albanize Primo.
Yara e Tereza: amigas da Sra. Vilma Ducatti Rodrigues de Moraes, desconhecidas anteriormente por Cristiane.
Taciana: recém nascida e nova integrante do lar da Sra. Vilma Ducatti Rodrigues de Moraes.
Daniel: irmão gêmeo de Taciana, integrado no lar da Sra. Albanize Primo.
Dr. Bezerra de Menezes: Médico e Ex-Presidente da FEB, Federação Espírita Brasileira, desencarnado em 1900.
Agradecimentos
A Jesus
Permiti Senhor que eu possa iniciar as folhas deste “Diário de Bênçãos” e que Mãe Maria de Nazaré me oriente. Aos Benfeitores e Amigos Espirituais rogo proteção.
A você Chico Xavier
A quem cheguei um dia, desesperada, cega pela dor, hoje agradeço a luz que se fez em minha mente, pelas palavras confortadoras de sua mediunidade que nos garante a certeza de que existe vida além da morte do corpo, de que Cristiane vive, assim como os entes queridos que partiram. Jesus o abençoe sempre.
A vocês Mães…
Jovens ou velhinhas, ricas ou pobres, casadas ou solteiras, todas… mães. A vocês, este apelo. Amem seus filhos… no ventre… na vida… na morte. Não os impeçam de nascerem, não os acorrentem enquanto aqui estiverem, não os entristeçam ao partirem. Chorem sem revolta Saudades… transformem em sorrisos, distribuindo-os a quem sofre. Convertam suas lágrimas em alimento aos necessitados.
Ajudando, seremos ajudados.
Trabalhar na paz é ter a paz.
A vocês: Luis, meu marido, e meus filhos
Deus os abençoe pela paciência, coragem e o sofrer calado, vocês, meus heróis.
Embora não espíritas, não impediram que eu buscasse conforto nesta doutrina maravilhosa.
Sei, ainda, como eu, que fitam o céu, procurando uma resposta no infinito.
Creiam no pensamento preferido de Cris. “Onde houver uma estrela brilhando, ali eu estarei.”
A você Cris…
Meu pensamento para que Jesus a abençoe sempre.
Cristiane
Menina meiga, de cabelos loiros, assim é você minha pequena.
Seus olhos esverdeados exprimem tão bem, as ondas do mar em dias de calma.
Deus quando fez você, minha filha, deu tudo de belo que havia no céu.
A luz das estrelas…
O sorriso dos anjos…
A meiguice da Lua…
Deu para mim o sonho mais lindo, que fosse possível um dia sonhar…
E eu lhe disse:
— A vida é bela e a infância é mais.
Viva… sorria…
Mas chorar…
Não quero vê-la jamais
Um pouco de Cris
Quem é Cris?
Cristiane Rodrigues de Moraes, nasceu na cidade de Piracicaba, Estado de São Paulo, em 28.1.1964, faleceu em 20.6.1980, por acidente em Itambé — Bahia, com arma de fogo e sepultada na cidade que muito amou: Tietê — Estado de São Paulo.
Filha maravilhosa. Alegre, irrequieta e estudiosa. Gostava de poesias e romances. De fácil comunicação. Seu poeta preferido, Vinicius de Moraes.
Em 1978 obteve o primeiro lugar num concurso literário, na cidade de Tietê — SP. Eleita rainha da Primavera da E.E.P.G. Barão do Rio Branco, em Piracicaba, contagiava com sua alegria e sorriso encantador. Escolhida pelas colegas, em fins de 1977, “A melhor Amiga do Ano”, recebeu, numa festa íntima, um lindo troféu o qual, juntamente com seu coelho de feltro “Mingau”, sua raquete de tênis e
outras lembranças, acompanharam bem de perto o seu corpo, como a dizer “Continuamos Amigos”.
Natural de sua idade, adorava música jovem, mas, tinha por uma de suas preferidas “O ÉBRIO”, de Vicente Celestino. Vez outra, gostava que o pai cantasse e, na parte declamada, seus olhos marejavam.
Não temia a morte, dizia saber não viver muito.
Certa ocasião, ainda pequena, perguntou: — Se a gente morresse e pudesse voltar em outra coisa, o que a mamãe gostaria de ser?
Respondi que talvez uma flor… Ela, na sua preferência, gostaria de ser uma estrela. Do alto veria a todos na Terra e todos a veriam também. Agora percebo quão profundo aquele pensamento.
Amava o mar, a natureza e o pôr do sol. Sonhava ser águia, formar se em oceanografia e ser uma viajante para o Havaí.
Tudo quis ser. Hoje… é a nossa saudade, a saudade dos que a quiseram e a minha certeza de que a vida continua, que permanece mais viva que antes, dando-nos força e coragem.
Partida
O dia amanheceu lindo, 20 de junho de 1980, sexta-feira.
Em agitada tarde de preparação para viagem, estaríamos a festejar o São João, juntamente com amigos numa cidadezinha próxima. Seria uma semana de festas.
No canto, as malas esperavam o tempo de viajar como que sorrindo com a múltipla variedade de roupas no seu interior, simbolizando a alegria.
A casa vibrava com o som do último disco comprado por Cris. Naquela manhã, minha última lembrança… Cris deitada no tapete, de bruços, ouvia esse disco com companhia de amiga.
Saí em busca de genipapo para um licor, foi num instante… de repente… tudo acabado. Não sabia como e nem por quê. Parecia uma enorme loucura, uma terrível mentira, um doloroso pesadelo.
Cristiane morria em minhas mãos… e com ela, também, me sentia morrer.
Poema da flor que partiu
Este é um poema de insônia, de noites de prantos, de lágrimas sentidas, de mãos vazias…
Era uma flor de longos cabelos loiros, trançados de sonhos; de esperança, de vontade de viver, de amar e de sorrir.
Era uma promessa eterna de esperança, a ânsia da ilusão primeira.
Era o ser querendo vida, era a alma cantando; falando de amores, era o Sol de toda manhã, era a chuva do céu caindo.
Meu desejo em sonhos, era a cor do arco-íris; nos seus passos… meu compasso de emoções.
Vi seu riso, suas tristezas, suas angústias…
Vi seu pranto, suas poesias, sua esperança…
Este é um poema de lembranças tão lindas…
De noites escuras que hoje choro por você…
Da minha flor, as tranças se soltaram, os sonhos caíram…
Não pode mais amar, não pode mais sorrir.
Meu arco-íris, perdeu suas cores, meus passos já não têm compasso…
Caminham por horas mortas, levados pelo meu triste canto
O amanhã já não traz mais seu Sol, a chuva já não cai mais do céu…
Cai do pranto dos meus olhos.
Este é um poema de tristeza, de desespero, de felicidade passada..
Minhas noites agora, Senhor, são gotas de um mesmo pranto, é uma amarga solidão.
Caminho só pelas calçadas, buscando em cada vulto, o perfume da minha flor, o seu riso que encantava…
Buscando em cada passo o seu andar de criança… já quase de uma mulher.
Hoje busco em cada verso, um pouco dos versos seus, procuro em cada sorriso, um pouco do riso seu.
Este é um poema de dor mesclado de amor e saudades, é um poema triste de quem não sabe mais sorrir…
É o poema de uma mãe, que numa tarde fria de junho, viu o Sol se apagar…
Viu dois olhos se fecharem, enquanto suas mãos procuravam um pouco de sangue a pulsar.
A esperança foi sumindo…
O meu pranto foi caindo…
E… junto da minha flor, eu morri também.
(Rui Barbosa — Bahia — 21.12.1980)
Conhecimentos novos
Muito sonhara com o futuro de minha filha, em vesti-la de noiva ao lado de alguém que a amasse. Sua família constituída.
De repente, o sonho acabou, Cris estava morta.
Não podia ser… uma vida toda para se acabar.
Deveria existir algo além…
Como saber, como acreditar?
Tentava me iludir, fugir da triste realidade, mas os comprimidos me tomaram conta.
Na dor, pensei morrer também. É digno de se notar, a partida de um ente querido aproxima as pessoas. Os amigos tentam orientar-nos de todas as maneiras. Muito auxiliada pelo casal Dr. Edson Evangelista de Souza e sua esposa Maria da Penha Torres Evangelista, ao invés do psiquiatra que pensei consultar, aconselharam-me o estudo da Doutrina Espírita. Encontraria o equilíbrio e as explicações para o que acontecera.
Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, os ensinamentos de Jesus e, em cada página, a resposta a meus anseios e minhas dúvidas.
Das mãos de Maria Cláudia Decico, amiga de infância, recebi o livro “Presença de Laurinho”, pelo Espírito de Laurinho. Foi a semente que germinou em meu coração.
A esperança brotava.
Compreendi. Cristiane não está só. A juventude está viva em outro lugar. Não entendia como e de que maneira. Ainda tudo era confuso.
Exortei a Laurinho que ajudasse Cris. Partira há mais tempo. Deveria ter amigos que a protegessem e aos de casa pedi que me levassem a Uberaba.
Não sabia como chegar ao Chico. Esclareci-me e fui.
No local me informei com um policial:
— Chico está viajando, talvez nem chegue a tempo de atender esta semana. Que voltássemos em outra ocasião.
Encostei-me no portão e dirigi meu pensamento a Chico, sem conhecê-lo:
— Ajude-me a voltar mais tranquila. Tornarei outro dia. Retornei serena para casa, onde passei momentos felizes ao lado de minha filha. Suas lembranças doíam, imaginava vê-la chegando como antigamente, levantando-me para o alto, dizendo:
— Sou mais forte que você…
Palavras certas naquele momento, pois sentia-me mais leve que uma folha, cairia onde o vento da saudade me jogasse. Não tinha forças sequer para orar.
A esperança que antes nascera, acabava-se.
A ideia de mudar me para outra cidade, entendia como solução. Não suportava olhar aquelas ruas, os amigos, a praça. Aquilo tudo era Cris.
Mudei-me. Na nova residência não encontrei ânimo para desencaixotar as louças e roupas. Cada objeto era procurado na ocasião necessária. A casa estava fria, sem toalhas na mesa, um vaso ou enfeites, apenas o essencial para comer e dormir.
Certa feita, em casa sozinha, resolvi ouvir o disco preferido de Cristiane, música de Fagner, “As flores não falam”. Não resisti ao pranto. Em seguida o desespero, o grito e a imensa dor.
Procurei em seus pertences, cadernos, livros e outros objetos, algo que pudesse saber mais sobre minha filha. Na primeira caixa, ao tomar um livro de poesias, caiu sobre a cama um cartão postal e no verso os dizeres:
“Na vida nem tudo são flores, há pedras e espinhos, nem por isso deixaremos de caminhar. Te amo, beijos”
Com os olhos fixos naquele cartão, entendi que Cris vivia e amparava-me. A esperança voltava.
Minha casa criou cor, o ar já não era frio. Havia toalhas e flores. Novos amigos chegaram e, com eles, novas palavras de conforto e ânimo.
Meus frequentes encontros, sonhados, aliviavam as saudades e ajudavam a reerguer minha vida.
Na sequência, alguns dos sonhos maravilhosos que a misericórdia de Jesus permitiu.
Primeira entrevista com Chico Xavier
Consegui voltar a Uberaba.
Com muita fé, viajei. Algo me faria mais feliz e conformada.
Em conversa, Chico trouxe-me a certeza e a esperança em realidade. Citou nomes impossíveis de serem por ele conhecidos, e pensei: — Se esse homem vê e sabe os nomes de meus familiares, principalmente do meu bisavô, desencarnado há muitos anos, que nem mesmo meu pai conheceu, por que também Cris não estará viva? Claro que sim. Cris vive, meu Deus! Vive e esse homem pode vê-la!
Uma nova visão da vida, uma nova visão da morte.
Quanto às informações do Plano espiritual, recebi este bilhete: “Tão logo se nos faça possível, cooperaremos na obtenção das notícias solicitadas. Confiemos no amparo de Jesus, hoje e sempre”.
Regressei para casa, com um pouquinho de conhecimento da Vida no Além. Sabia que minha filha continuava viva, que ninguém se torna em nada, apenas muda de residência.
Epílogo de Sonhos
Meu Deus, que coisa linda, que joia rara…
Era essa a filha que eu queria, era essa a Cristiane que eu esperava!
Quantos planos para ela, há tanto tempo esperada.
Sua primeira fitinha… seu primeiro vestidinho, me faziam delirar.
E seus olhos cinza e verdes… como o mar.
Seus cabelos loiros… como a noite de luar.
Eu era feliz com minha flor e meus botões, colorindo meu jardim.
Nunca pensei que nos meus sonhos pudessem haver espinhos… e foram tantos e machucaram muito.
Chega Cristiane correndo: — Mãe… senta e toma um copo de água com açúcar, não fale nada, somente ouça o que vou contar… me ajuda mãe, você é um amor, um anjo… lhe dou um beijo.
E lá vai a mãe — nesse caso eu — quebrar os galhos da filha.
Outra vez fala baixinho: — Mãe… briguei com “fulano”, diga que é a senhora que não quer… diga, mãezinha, me ajude, assim ele não me amola mais.
Quando a via chorando, pegava seus cabelos em minhas mãos e os enrolava.
— Diga-me, filha, que é que há? Não gosto de vê-la chorar.
— É “fulano” mãe, mas agora não quero mais saber dele…
Numa folha, encontro escrito:
“Fulano”…
te amo…
te curto…
te adoro…
te gosto…
Dou risadas e lembro-me — Ah! essa mocidade! Que tempo bom!
Amanhã será outro dia. Procuro minha filha e digo: — Sorria, não me deixe vê-la chorar nunca mais.
Junho se aproximando… o mês já transcorrendo… as festas juninas chegando…
Junho parou… tudo acabado… caíram sonhos… castelos ruíram… conversas e segredos se foram!
A dor calou fundo dentro da gente!
Lembro-me daqueles versos de Frei Luís de Granada:
Ó morte, como é amarga tua memória
Como é rápida tua vinda
Como é duvidosa tua hora
Como é universal a tua soberania!
Lágrimas, gritos, revolta… mas, oh! morte. Tu podes mais que tudo, não pedes licença… entra e leva;
e levaste minha flor!
Agora somos nós os ÉBRIOS… de dor, de saudades… loucos, sem rumo… Lágrimas, até quando terei para derramá-las?
Natal chegando… o povo feliz… aniversário de CRISTO… e nós, meu DEUS, que faremos? Como suportar essas saudades… essa angústia que sufoca, que interroga?
Oração, meu alimento diário. Prece, meu remédio noturno… Seis horas, hora da Ave Maria, hora da minha prece, hora da minha CRIS… Seu rosto em cada galho daquela árvore; ganha no último aniversário.
Lá no alto, você pequena… depois crescendo, crescendo…
Na última folha da árvore, você linda… já mocinha, sorrindo para mim.
Deve ter alguma folha, aí nesse céu infinito, para DEUS colocar sua foto, rindo… sorrindo… nessa outra árvore da vida, da qual agora você faz parte. Você vai ser a folha mais verde, vai ser a folha mais meiga, vai ser a folha mais linda! Sabe por quê?
Porque DEUS está feliz… levou você de volta… era aí o seu lugar. Você nos foi emprestada como a joia mais cara de uma realeza… decadente.
Você foi uma estrela… no céu da nossa vida…
Quando olhei… vi a estrela cair… era uma estrela cadente.
Quando fechei os olhos… chorei.
É NATAL… É PAZ… É SAUDADES… É O EPÍLOGO DE UM SONHO!
Dezembro de 1980.
Rui Barbosa — Bahia.
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