Capítulo XX

A decadência intelectual dos tempos modernos


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Pesam sobre os corações atribulados da Terra amargas apreensões, com respeito ao fatalismo da guerra. E, infelizmente ninguém poderá calcular a extensão dos movimentos que se preparam, objetivando a luta do porvir. A Europa moderna não representa a vanguarda da cultura dos povos e é fácil estabelecer-se um estudo analítico de sua situação de pura decadência intelectual, depois da catástrofe de 1914-1918.



As ditaduras europeias revivem, na atualidade, a época napoleônica da pátria francesa, quando, segundo Chateaubriand, tudo respirava o senhor, homenageava o senhor, vivia para o senhor. No Velho Mundo, em quase todos os países que o constituem, vive-se o governo e mais nada. O livro, a escola, o jornal, a oficina, são núcleos de recepção do pensamento dos maiores ditadores que o mundo há conhecido. A imprensa, manietada pelas medidas draconianas, não pode criar o cooperativismo intelectual das classes e das administrações, obrigada a viver a fase de absoluta união com os programas de governo; os grandes pensadores que sobreviveram à [1ª] Grande Guerra não podem produzir expressões de pensamento livre que abranjam a solução dos enigmas destes tempos novos, trabalhados por leis vexatórias e humilhantes e vemos, pelo mundo inteiro, a invasão das forças perversoras da consciência humana. Jornais integrados nas doutrinas mais absurdas, falsa educação pelo rádio que vem complicar, sobremaneira, a situação, e os livros da guerra, a literatura bélica, inflada de demagogia e de estandartes, de símbolos e de bandeiras, incentivando a separatividade. Qualquer estudioso desses assuntos poderá verificar a realidade de nossas afirmativas.

Os homens, nessa fase de preparação armamentista, vivem uma época de profunda pobreza intelectual.

O porvir há de falar aos pósteros, dessas calamidades dolorosas. O mundo chegou a uma fase evolutiva em que é preciso encarar-se de frente a questão de fraternidade humana para resolve-la com justiça.



Os governos fortes, fatores da decadência espiritual dos povos, que guardavam consigo a vanguarda evolutiva do mundo, não podem trazer solução satisfatória aos problemas profundos que vos interessam.

Afigura-se-nos que a função das ditaduras é preparar as reações incendiárias das coletividades. A atualidade do mundo necessita criar um novo mecanismo de justiça econômica entre os povos. Que se aventem medidas conciliadoras para essa situação de pauperismo e alto imperialismo das nações. Os que estudam a política internacional podem resolver grande parte dos fenômenos revolucionários que convulsionam o mundo, analisando a chamada questão das matérias primas. Matérias primas, quer dizer colônias, e colônias significam possibilidades de vida e de expansão. É verdade que na Espanha atual, antes de tudo, reside o imperativo da dor, redimindo grandes culpados de outrora, constituindo essa dolorosa situação um dos quadros mais pungentes das provações coletivas; mas não somente as ideologias extremistas ali se combatem, pressagiando um novo organismo político para o planeta. Um dos dois diretores de um manicômio espanhol asseverava, há pouco tempo que mais de quatrocentas pessoas, em um ano, tinham procurado refúgio naquele pouso de alienados, como loucas, em virtude das necessidades da fome. A Espanha é pobre de terras. De cem hectares de terrenos, talvez somente uns trinta poderão oferecer campo propício à agricultura. E não só a velha península se debate nessas necessidades tão duras. A China não está suportando o aumento contínuo da sua população? O Japão se vem fortificando para poder nutrir o seu povo. A Polônia estuda um projeto de colocar na África ou na América mais de cinco milhões de criaturas, que a sua possibilidade econômica não comporta.



Nessas aluviões de protestos, ouvem-se os tinidos das armas, e melhor fora que o homem voltasse as vistas para o campo fraterno, antes da destruição que se fará consumar. Seria melhor estudar-se a questão carinhosamente, analisando-se os códigos das leis imigratórias e que as nações não se deixassem dominar pelo prurido de mau nacionalismo, tentando estabelecer um plano de concessões racionais e resolvendo-se a questão da troca de produtos entre os países, solucionando-se o enigma da repartição que a economia política não pôde conseguir até hoje, apesar da sua perfeição técnica, no círculo da direção das possibilidades produtoras.

O que verificamos é que, sem a prática da fraternidade verdadeira, todos esses movimentos pró-paz são encenações diplomáticas sem fundo prático, não obstante intenções respeitáveis.

Mas, consideremos também que o mundo não marcha à revelia das leis misericordiosas do Alto, e estas, no momento oportuno, saberão opor um dique à chacina e ao arrasamento; confiemos nelas, porque os códigos humanos serão sempre documentos transitórios, como o papel em que são registados, enquanto não se associarem, parágrafo por parágrafo, ao Evangelho de Jesus.




Emmanuel
Francisco Cândido Xavier


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