Jesus no Lar

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Capítulo XXVI

O valor do serviço


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Filipe, velho pescador de Cafarnaum, enlevado com as explanações de Jesus sobre um texto de Isaías, passou a comentar a diferença entre os justos e injustos, de maneira a destacar o valor da santidade na Terra.

O Mestre ouviu calmamente, e, talvez para prevenir os excessos de opinião, narrou, com bondade:

— Certo fariseu, de vida irrepreensível, atingiu posição de imenso respeito público. Passava dias inteiros no Templo, entre orações e jejuns incessantes. Conhecia a Lei como ninguém. Desde Moisés aos últimos Profetas, decorava os mais importantes textos da Revelação. Se passava nas ruas, era tão grande a estima de que se fizera credor, que as próprias crianças se curvavam, reverentes. Consagrara-se ao Santo dos Santos e fazia vida perfeita entre os pecadores da época. Alimentava-se frugalmente, vestia túnica sem mancha e abstinha-se de falar com toda pessoa considerada impura.

Acontece, todavia, que, havendo grande peste em cidade próxima de Jerusalém, um Anjo do Senhor desceu, prestimoso, a socorrer necessitados e doentes, em nome da Divina Providência.

Necessitava, porém, das mãos diligentes de um homem, através das quais pudesse trabalhar, apressado, em benefício de enfermos e sofredores.

Lembrou-se de recorrer ao santo fariseu, conhecido na Corte Celeste por seus reiterados votos de perfeição espiritual, mas o devoto se achava tão profundamente mergulhado em suas contemplações de pureza que não lhe sobrava o mínimo espaço interior para entender qualquer pensamento de socorro às vítimas da epidemia.

Como cooperar com o emissário divino, nesse setor, se evitava o menor contato com o mundo vulgar, classificado, em sua mente, como vale da imundície?

O Anjo insistia no chamamento; contudo, a peste era exigente e não admitia delongas.

O mensageiro afastou-se e recorreu a outras pessoas amantes da Lei. Nenhuma, entretanto, se julgava habilitada a contribuir. Ninguém desejava arriscar-se.

Instado pelas reclamações do serviço, o Enviado de Cima encontrou antigo criminoso que mantinha o propósito de regenerar-se. Através dos fios invisíveis do pensamento, convidou-o a segui-lo; e o velho ladrão, sinceramente transformado, não hesitou. Obedeceu ao doce constrangimento e votou-se sem demora, com a espontaneidade da cooperação robusta e legítima, ao ministério do socorro e da salvação.

Enterrou cadáveres insepultos, improvisou remédios adequados à situação, semeou o bom ânimo, aliviou os aflitos, renovou a coragem dos enfermos, libertou inúmeras criancinhas ameaçadas pelo mal, criou serviços de consolação e esperança e, com isso, conquistou sólidas amizades no Céu, adiantando-se de surpreendente maneira no caminho do Paraíso.

Os presentes registaram a pequena história, entre a admiração e o desapontamento e, porque ninguém interferisse, o Senhor comentou, em seguida a longo intervalo:

— A virtude é sempre grande e venerável, mas não há de cristalizar-se à maneira de joia rara sem proveito. Se o amor cobre a multidão dos pecados, o serviço santificante que nele se inspira pode dar aos pecadores convertidos ao bem a companhia dos anjos, antes que os justos ociosos possam desfrutar o celeste convívio.

E reparando que os ouvintes se retraíam no grande silêncio, o Senhor encerrou o culto doméstico da Boa-Nova, a fim de que o repouso trouxesse aos companheiros multiplicadas bênçãos de paz e meditação, sob o firmamento pontilhado de luz.




Neio Lúcio
Francisco Cândido Xavier


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