Capítulo VIII

Roteiro


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A requisição de palpites do Plano invisível é tão velha quanto o mundo.

O primeiro templo consagrado à fé religiosa na Terra terá sido, certamente, um tribunal de súplicas, em que o homem primitivo buscava a manifestação dos deuses.

E, em todos os tempos, o grito de socorro abafou o hino de hosanas.

O Espírito encarnado no planeta desempenha, acima de tudo, o papel de Édipo, rolando na tela das circunstâncias tecida por ele mesmo. O filho de Laio, contudo, decifrou os enigmas que lhe eram propostos pela Esfinge, nos arredores de Tebas, enquanto que o homem comum se apavora e cai, ante os problemas da Morte, ao redor do sepulcro.

Todavia, não evocamos a imagem para urdir considerações literárias em torno do tema antigo. Lembramos aqui o afã dos amigos terrestres, procurando-nos o concurso fraternal a fim de resolverem as questões que lhes dizem respeito. Os “vivos” pedem orientação aos “mortos” com estranho fervor, como se os esgares do transe final do corpo nos houvessem promovido a magos infalíveis. Organizações caridosas e personalidades mediúnicas são diariamente atormentadas, no Espiritismo, de mil modos, por milhares de solicitações dessa natureza. Com facilidade, renovaríamos no mundo os deliciosos oráculos gregos, cheios de fantasia pagã, se a luz do Cristo não nos presidisse agora aos impulsos, porque, sem dúvida, a massa de reclamações e de pedincharia endereçadas à nossa esfera é de espantar.

Simpatizantes da causa doutrinária querem pareceres do Além, acerca das mudanças do câmbio, de querelas judiciais ou surpresas do subsolo. No entanto, não é para esses trêfegos consulentes de médiuns invigilantes que alinhavamos as presentes observações.

Reportamo-nos aos companheiros sinceros que pedem um roteiro de espiritualidade para os serviços da vida.

Permanecem cansados e desiludidos, afirmam alguns. Inquietos e torturados, declaram outros. Pretendem de nós, por vezes, longos comunicados repletos de itens informativos. Exigem particularidades. Desejam que nos pronunciemos sobre a conduta que lhes compete na sociedade e no lar. Muitos nos situam ingenuamente entre os juízes de toga flamejante e aguardam de nossas mãos libelos fulminatórios, como se não estivéssemos igualmente em luta por extinguir os próprios defeitos e sanar as próprias imperfeições.

É para esses que recordamos as normas esposadas atualmente por nós. A única diretriz respeitável que poderíamos indicar aos companheiros de reta intenção é o retorno à estrada do Cristo. A exceção dos Espíritos missionários que consumiram a existência na renúncia santificante, o que estamos fazendo além do túmulo, em boa linguagem, é o trabalho de lavanderia. Temos a roupa suja e é impossível prosseguir sem vestes limpas, através de caminhos iluminados e claros.

A receita lógica, portanto, para a comunidade dos irmãos encarnados, é o reajustamento no bem legítimo. Os interessados na aquisição de conhecimento e santidade encetem o esforço no próprio círculo. Quem se candidate à elevação, principie por elevar-se. Quem pretenda o convívio das entidades superiores, comece por emergir do vale fundo em que se concentram os motivos mais baixos da vida e subam para o monte da iluminação… Não esperem que os desencarnados lhes venham assinalar deficiências. Também nós, convalescentes da alma, experimentamos a sede de cura definitiva.

Certa feita, enunciou Oscar Wilde que a arte de dar conselhos consiste em indicarmos para os outros aquilo de que mais carecemos. Não incidiríamos, depois da morte, pelo menos nós, os pecadores confessos, em erro semelhante.

Busquemos todos o Conselheiro Divino. Conjuguemos com Ele os verbos orar e vigiar, perdoar e amar, ajudar e servir. Iniciemos a tarefa pelos irmãos incompreensivos mais próximos.

A época da revelação espiritual, por entre laboratórios e gabinetes de pesquisa, deve ter passado para os estudiosos leais, que procuram a luz. A atualidade pede recolhimento no próprio ser. A mente necessita centralizar-se, a fim de sentir a claridade sublime do Alto, na intimidade da consciência.

Ai dos que não dominarem o corcel da imaginação na corrida que a civilização moderna improvisou para a morte!…

Se os aprendizes do mundo permanecem, efetivamente, à espera de orientação, por parte daqueles que os precederam na grande jornada, ouçam nosso apelo: Recorramos a Jesus, não só no título de Salvador Glorioso da Humanidade, mas também na condição de Mestre para a nossa experiência individual. Quantos estiverem entediados da exibição de “compridas túnicas” da extravagância, entre os fariseus de todos os tempos, voltem conosco à simplicidade original. Lavemos o pensamento nas fontes cristalinas da Verdade. Façamo-nos crianças e, buscando o Eterno Amigo, supliquemos a Ele com sinceridade infantil:

— Senhor, ouvimos-Te a palavra, quando chamavas os pequeninos. Ensina-nos a caminhar, a servir e a viver!…

E estejamos convictos de que o Guia dos Séculos nos tomará as mãos frágeis, sereno e acolhedor, para conduzir-nos “através dos vales da sombra e da morte”, onde, em companhia d’Ele, “não temeremos mal algum”.


(.Humberto de Campos)


Irmão X
Francisco Cândido Xavier

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