Páginas do Coração

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Capítulo VII

Quando abandonamos o invólucro material

Mensagem recebida em 13 de dezembro de 1950.


Meu querido Ricardo. Jesus nos proteja e ilumine em nossa jornada para a verdadeira libertação.

Mais uma vez aproveito a doce oportunidade de um entendimento com o seu caridoso coração, de modo a consolidarmos os nossos propósitos de trabalho na Seara do Senhor.

Quero dizer a você que a nossa alma, quando abandona o invólucro material, muito dificilmente consegue afastar-se plenamente do mundo. Só aqueles que, durante a experiência terrena, puderam operar em si mesmos a perfeita ligação com o Plano Superior, alçam voo à paragens mais belas e mais elevadas que lhes correspondem à grandeza dos ideais esposados no mundo. Para a maioria, porém, a retirada é apenas parcial.

Desintegra-se o corpo, mas a alma permanece unida aos entes ou aos objetos que ama. Não é fácil modificar o curso do pensamento, quando fixamos a nossa mente em determinados pontos da vida, por muitos anos consecutivos. E, no meu caso, como você não pode ignorar, as esperanças e sentimentos de esposa e mãe, naturalmente me deveriam reter ao pé de nosso antigo círculo terrestre. As lutas do espírito surgiram dentro de mim, com toda a força, porque, se na realidade me achava ligada à existência que vinha de deixar, no fundo me sentia impossibilitada para qualquer manifestação. Mas tanto orei e tanto pedi a Jesus, que o seu coração de companheiro se dispôs a escutar-me e em seus braços de colaborador do bem tive a felicidade de encontrar os instrumentos para a minha tarefa nova.

Ah! Se todos na Terra conhecessem o valor da saudade que se transforma em serviços aos semelhantes, por certo haveria menos pesar aí e aqui, porque no clima da caridade, nós nos sustentamos realmente uns aos outros.

Desde o instante em que você considerou seriamente a minha palavra singela, a fé se renovou dentro de mim… Não era possível acordar a todos aqueles que amamos. Às vezes é necessário darmos tempo ao tempo, e muitos corações ligados aos nossos são ainda como as crianças que precisam de repouso e alimento leve para se fortificarem à frente do futuro.

Ninguém deve estabelecer normas de violências no campo da vida e, por isso, bastam-me o seu devotamento e a sua cooperação. Não estamos mais a sós, desde o dia em que foi você tocado no íntimo para o amor, para a luz e a verdade. Somos duas almas respirando numa só, partilhando a mesma vida.

Cada dia para nós dois é valioso período de serviço com Jesus, porque, se posso com a graça do Senhor, formular as ideias, você é a força de execução, amparando e ajudando na sementeira do socorro fraterno que nos cabe distribuir.

Você poderá encontrar em mim a inspiração, mas em seu espírito guardo os meus braços. Posso falar sem palavras ao seu íntimo, no sublime silêncio da prece, mas é a sua voz nas boas obras que me restaura as energias, a fim de seguirmos para diante sem desfalecer. Não esmoreçamos desse modo, no terreno da luta que nos compete pisar.

A atualidade, meu querido Ricardo, é nossa oportunidade de trabalhar e servir plantando no contentamento dos outros a nossa felicidade porvindoura. A caridade é por isso mesmo, a nossa abençoada tenda de luz, edificada em toda parte onde exista alguém que clama por auxílio e compreensão.

Há muita gente que pretende amparar os desencarnados com as lápides de alto preço ou com as exibições suntuosas do mundo nas cerimônias religiosas de luxo, mas hoje posso assegurar a você que a bondade para com o próximo é a melhor maneira de colaborar pela nossa alegria e pelo nosso bem-estar além do túmulo.

No esforço de contribuir pela edificação dos outros, como que acendemos a divina estrela do Amor acima de nossa fronte, clareando-nos os passos e repartindo o peso da cruz, — que é a saudade amargurosa — o que fica e o que parte se consolam mutuamente e se amparam na caminhada para a luz dos cimos da vida.

Haja o que houver, continuemos de mãos firmes no arado, sem “olhar para trás”. (Lc 9:62) Somos dois viajores felizes, porque nos sustentamos reciprocamente tangidos pelo mesmo carinho e pelas mesmas bênçãos. De volta ao nosso lar querido, guarde a certeza de nossa ventura permanente.

Agradeço a nossa estimada irmã Aurora quanto vem fazendo em nosso favor e em todas as orações de nosso grupo fraterno, roguemos a proteção do Alto para o nosso Virgínio que vai sendo assediado, em espírito, por enorme falange de antigas vítimas que contra ele se voltam extremamente revoltadas.

E esperando, meu querido Ricardo, que os seus estudos e meditações, trabalhos e obras, na estrada cristã se encontrem sempre iluminados pela verdadeira alegria e pela divina esperança de que se devem alimentar os nossos corações, deixa-lhe um ósculo de gratidão e confiança, amor e fé viva, a sua companheira de todos os dias que encontra em você o refúgio da consolação e da paz, hoje e sempre.




Candóca
Francisco Cândido Xavier

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Lucas 9:62

E Jesus lhe disse: Ninguém, que lança mão do arado e olha para trás, é apto para o reino de Deus.

lc 9:62
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