Retratos da Vida
Versão para cópiaNotas da sovinice
Você deseja saber, Caro Antônio da Planura, O que sucede aos sovinas Depois que a morte os procura. O assunto pede cuidado, Porquanto, em tudo, na essência, Não se deve caminhar Com base na imprevidência. Observe a natureza: Na horta uma simples erva, Vive, ajuda e se garante Mantendo a própria reserva. A árvore ampara sempre Na bondade de que é feita, Mas resguarda a seiva própria Para dar outra colheita. Melhor é viver no mundo, Relembrando a história antiga: Nem tanto quanto a cigarra, Nem tanto quanto a formiga. Em verdade, nunca vi, Em meus caminhos terrenos Quem não tenha um tanto mais Para dar a quem tem menos. Toda pessoa precisa De escoras, forças e meios, De maneira a não pesar Nos orçamentos alheios. Mas sovinice, meu caro, Na melhor definição, É o pesadelo da posse Com trevas no coração. Você recorda Nhô Bruno, Falecido em Miradouro; Sem corpo, dorme no pó, Julgando que dorme em ouro… Enterrou muita moeda, O nosso amigo Marçal, Desencarnado, é vigia Na barranca do quintal. Agora depois da morte, Alarico do Estaleiro, Anda buscando o colchão Em que prendia o dinheiro. Sem corpo, Nhá Benta Paula Hoje é um fantasma perfeito, Mora no armário das joias Que guardava sem proveito. Conquanto rica, Nhá Cota, Desencarnada em Cumbica, Vive na cova, pensando Que mora em mina de mica. Apegada nas baixelas, Morreu Nhá Joana de Deus, Sem corpo, vive agarrada Ao que ficou nos museus. Muito rico, mas sovina Finou-se Juca do Grampo, Comeu por economia Tatu ervado no campo. Falando em ouro e mais ouro Morreu Altino de Grotas, Mora no barro pensando Que está num montão de notas. Nosso prezado Nhô Tuca, Morto no Sítio dos Lessas, Vive com medo dos santos Aos quais fintava promessas. Prudência, caro Antonico, É paz na hora futura, Entretanto, sovinice De qualquer modo, é loucura. Trabalhe, faça proveito Do que ajuntou pelo bem, Saiba, sempre, antes de tudo, Que Deus não falta a ninguém. |
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