Retratos da Vida
Versão para cópiaAssunto entre amigos
Recebi o seu bilhete, Meu caro Juca Vilaça. Pede você que lhe escreva Algo mais sobre a cachaça. Explica você: “Cornélio, Abra o caso mais a fundo, Fale mais dos resultados Quanto à pinga no outro mundo.” Você tem razão. A pinga, Por mais que a verdade doa, Sem controle que a governe, Arrasa qualquer pessoa. Além de ser forte agente Da obsessão tal e qual, Provoca desequilíbrio No corpo espiritual. Prejudica e desfigura Muito mais do que se pensa, Cachaça, por si, carrega Tristeza, inércia, doença… Em qualquer parte onde surja, Lembra sempre, em qualquer clima. Enxurrada morro abaixo Ou fogo de morro acima. Muito difícil contê-la Quando segue de arrastão Porque mergulha a cabeça Em sombra ou destruição. Você recorda o Pereira Da Mata do Xique-Xique… Desencarnado, ele mora Numa beira de alambique. Morreu de tanto beber Nhô Totico da Água Santa; Hoje, sem corpo, anda à caça De quem lhe empreste a garganta. Rafael foi-se em bebida, — O pobre do nosso Rafa, — E agora em vida diversa Só pensa em copo e garrafa. Daqui, vejo, rua em rua, Sem rumo em que se comande, Nosso Ercílio do copinho Que tombou em litro grande. Embriagada vivia Dona Quiquita Borela… Depois da morte procura Quem tome pinga com ela. Uma história das mais tristes A do nosso Chico Souza… Perdendo o corpo em ressaca, Não se lembra de outra cousa. Largando o mundo, aos copázios, Nhô Bernardo do Lajão, Continua, após a morte, Na mesma perturbação. Cachaça, meu caro amigo, Tem este traço comum: Estraga de qualquer modo A mente de qualquer um. Em muito caso de angústia, Nas provas justas da vida, Muito suicídio e loucura São do excesso de bebida. Nas festas e cerimônias Não se canse de aprender A arte de alçar o copo Nobre e firme sem beber. Pinga ajuda o coração?!… Disso há gente que se gabe, Mas se cachaça é remédio A medicina é que sabe. Quanto a nós, recorde o aviso Do nosso Nico Belém: — “Água que gato não bebe Não auxilia a ninguém.” |
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