Retratos da Vida

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Capítulo XIV

Ambição desregrada


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Recebi a sua carta,

Meu caro amigo Silvestre,

Você faz uma consulta

Em grave questão terrestre.


Você deseja saber

O que ocorre aos que se vão

Para a vida, além da morte

Em desregrada ambição.


O amigo não desconhece:

Ambição de fazer bem,

Anseio de ser melhor

Não fazem mal a ninguém.


Mas a febre do egoísmo

De quem quer mais, mais e mais

Sem precisão ou proveito

Arrasa as forças mentais.


Nesses casos, a pessoa,

Larga o corpo, exige e erra,

De ilusão para ilusão,

Perambulando na Terra.


Você recorda o Nhô Neca

Que arruinou muita viúva,

Desencarnado é um mendigo

Mas pensa que é manda-chuva.


Depois de morto, o João Panca

Que só queria dinheiro,

É vigia de um tesouro

Que enterrou no galinheiro.


Nicão despojava os órfãos

Fosse a cara de quem fosse,

Morreu, mas anda chumbado

Ao sítio do Rio Doce.


Depois de deixar o corpo,

A sovina Dona Bela

É vista à porta dos bancos

E diz que os bancos são dela.


Finou-se a falar em ouro

O nosso Nhonhô da Mata,

Ele agora cata pedras,

Achando que ajunta prata.


Posseando bens dos cegos,

Desencarnou Mário Landi,

Pelo remorso, é um fantasma

Assombrando a Roça Grande.


Tomou muita terra alheia

Nhô Chico do Lavajão,

Desencarnado ele clama

Em sete palmos de chão.


Morreu louco de avareza

O esperto Quinquim de Souza,

Tendo acordado na tumba

Quer vender a própria lousa.


Guarde a certeza, meu caro,

Na trilha da criatura,

Ambição mais ambição,

A soma é sempre loucura.


Louva a paz do necessário

Que o trabalho nos consente,

Tudo aquilo que é demais

É desarranjo na mente.


Você mais cedo ou mais tarde,

Tal qual comigo se deu,

Ressurgirá no outro mundo,

Sozinho como nasceu.




Cornélio Pires
Francisco Cândido Xavier


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