01/12/1948

Meus caros filhos, Deus abençoe a vocês, concedendo-lhes muita paz e saúde.

Comungando-lhes o contentamento doméstico, regozijo-me com a perene festa de amor em que conseguimos manter os corações, no campo da vida. Este é o doce milagre da experiência cristã – renovar o interesse no bem e pelo bem, através de mil modos diferentes, enriquecendo-nos a jornada de bênçãos sempre novas.

No instituto evangélico, dar significa receber incessantemente junto às fontes do suprimento divino. Vocês oferecem o espírito ao sol da fé viva e os clarões dele lhes iluminam a marcha. Consagram as horas ao trabalho sadio e o trabalho lhes carreia respostas sempre mais altas, compelindo-os a mais elevado espírito de serviço. Em razão dessa atividade, vocês vão descobrindo maiores extensões do continente da alegria em Cristo, o nosso doador da vida eterna.

Não adianta morrer procurando o Paraíso quando não construímos, dentro de nós mesmos, recursos para percebê-lo. Grande massa de nossos companheiros se demora, depois do túmulo, na posição do doente mental, repleto de fobias indefiníveis, de pensamento encarcerado a objetos e paisagens que a voragem dos anos tragou desde muito tempo. Cristalizam-se no particularismo inferior a que se filiam na Terra e não possuem aqueles “olhos de ver” e os “ouvidos de ouvir”, (Jo 12:40) a que se reporta o Mestre dos mestres na Boa Nova inesquecível. A existência humana, no fundo, é . O peregrino precisa aproveitar a oportunidade em lições de auxílio mútuo e em ensinamentos que a região exterior lhe oferece para que não se arrisque a parar longos dias em pousos que lhe não interessam os objetivos finais da chegada.

Felizmente, vocês vão compreendendo, cada vez mais, esse imperativo da natureza espiritual e entesouram lucros imperecíveis, que crescerão sempre em beleza e valor.

Procuremos as vantagens das horas e enchamo-las de criações mentais santificantes e renovadoras. A experiência possui os seus ciclos determinados. Que possamos valorizar o nosso com a mais substanciosa provisão de otimismo e esperança na vitória do sumo bem são os meus votos.

Meu caro Rômulo, valho-me da presente carta para fazer-lhe sentir o meu reconforto em lhe identificando a paciência no tratamento dentário. Você tem primado pela serenidade e isso representa avançado teor de assimilação do Evangelho. De qualquer modo, enquanto você estiver naqueles minutos longos de experimentações e de ensaios não deixe de conversar mentalmente comigo, que venho acompanhando o serviço com muita atenção.

Extraí valiosa lição nestes dias de assistência paternal. É a de que nos achamos distantes da época em que o dentista podia tratar dos próprios dentes. A sugestão de cooperativismo que um gabinete dentário nos impõe à primeira vista é sumamente valiosa. Chega sempre uma ocasião em que somos compelidos a procurar a colaboração uns dos outros. E sinto-me contente anotando a “paz construída” com que você se vai submetendo aos impositivos da hora. Em breve, receberá o período de readaptação dos dentes novos e espero o seu testemunho de adesão espiritual ao assunto.

Não se preocupe com a leve inchação que vem registrando em torno do órgão visual. Use o Lachesis com o Cantharis e Plumbum. O nosso clínico acha que esse trio é mais acertado. Creia que venho acompanhando suas meditações mais íntimas no setor do serviço público. Você tem razão. Administrar retamente é sofrer muito com as dificuldades do plano em que ainda se encontra. Há muita gente que recebe os títulos direcionais à maneira de colunas que se ataviam de formosos adornos. Simples colunas enfeitadas que não pensam, não criam, nem agem quando não se precipitam nas cabeças alheias. Mas guardar a responsabilidade sentindo-lhe o peso é outra coisa e eu sei que a sua mente permanece assediada de inquietantes problemas, comprimida entre duas grandes classes – a dos que obedecem, fazendo jus ao salário simplesmente, e a dos que governam, com as mesmas características. Numa festividade, onde muitos brincam, a preocupação pelo dia seguinte pertence a poucos. E o Brasil não está longe de semelhante quadro. Grande povo e grande nação. Indiscutivelmente, a mais promissora do mundo à frente do porvir, mas a sua alma coletiva ainda será temperada à maneira do aço puro, isto é, no clima do fogo purificador. Sejamos, porém, células sadias e conscientes das obrigações que nos cabem. Há quem veja de cima o esforço individual e o julgamento dos homens, na realidade, é constante. Cada dia é dia do Senhor e dentro de todas as horas a bondade e sabedoria dele se manifestam. Retomando o fio de nossas considerações familiares, as suas ponderações silenciosas não deixam de alterar o sistema orgânico. Quanto esteja, pois, em suas mãos, defenda o seu “templo”, onde tantas bênçãos vão sendo enceleiradas para a sua riqueza na eternidade, hoje, aqui, agora. Estimaria ter escrito à Wanda uma carta de aniversário no mês de novembro findo, todavia, as oportunidades não corresponderam aos meus desejos, mas espero dirigir-me à minha querida neta logo seja favorecido pelo ensejo adequado para comentarmos os nossos ideais e os nossos programas de sublimação crescente. Com os meus “parabéns”, roguei a Jesus a conserve assim, em nível tão alto de sentimento, diante das circunstâncias que o mundo improvisa à frente dos jovens modernos. A mocidade é, realmente, a sementeira do futuro e a depositária das esperanças celestes, mas quando unida aos desígnios de Mais Alto, em marcha para os testemunhos edificantes que a luta lhe oferece. Nesse sentido, cumprimento-lhe a determinação de agir cristãmente, de alma consagrada ao que é bom e belo, nobre e santo, justo e perfeito. Ainda que não alcancemos semelhantes padrões apressadamente, é uma felicidade elegê-los, desde agora, por marcos a atingir. Esteja certa, acima de tudo, de que o vovô não lhe esquece e lhe ouve, atento, as preces íntimas, filhas dos seus ideais superiores.

Minha saudação cordial ao nosso Chico Guimarães. Hoje uma parenta dele compareceu e recebeu nossa cooperação fraternal. Se a alegria de vocês é sagrada na comunhão aí, na luta carnal, a nossa aqui, em torno de vocês, não o é menos. Grande é o nosso júbilo em nos sentirmos sintonizados pela lembrança de vocês.

Informo à nossa estimada Maria que o General Aurélio continua sendo objeto de nosso maior carinho.

E desejando a vocês muita tranquilidade, saúde, bom- ânimo e luz divina no curso de todas as horas, abraça-os, muito afetuosamente, o papai muito amigo de sempre,