Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1869

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Capítulo IX

Janeiro - Obsessões simuladas

Janeiro
Esta comunicação nos foi dada a propósito de uma senhora que deveria vir pedir conselhos para uma obsessão, e a respeito da qual tínhamos julgado que deveríamos previamente aconselhar-nos com os Espíritos.

“A piedade pelos que sofrem não deve excluir a prudência, e poderia ser uma imprudência estabelecer relações com todos os que se apresentam a vós, sob o império de uma obsessão real ou fingida. É ainda uma prova pela qual deverá passar o Espiritismo, e que lhe servirá para se desembaraçar de todos aqueles que, por sua natureza, embaraçariam o seu caminho. Troçaram, ridicularizaram os espíritas; quiseram amedrontar aqueles a quem a curiosidade atrai para vós, colocando-vos sob o patrocínio satânico. Nada disto teve êxito. Antes de se render, querem assestar uma última bateria que, como todas as outras, resultará em vosso proveito. Não mais podendo acusar-vos de contribuir para o aumento da alienação mental, enviar-vos-ão verdadeiros obsedados, diante dos quais esperam que fracasseis, e obsedados simulados, que vos será impossível curar de um mal imaginário. Tudo isto não retardará nenhum pouco o vosso progresso, mas com a condição de agir com prudência e de aconselhar aqueles que se ocupam dos tratamentos obsessionais a consultarem os seus guias, não só sobre a natureza do mal, mas sobre a realidade das obsessões que eles poderão ter que combater. Isto é importante, e aproveito a ideia que vos foi sugerida, de antes pedir um conselho, para vos recomendar a agir sempre assim no futuro.

“Quanto a essa senhora, ela é sincera e realmente sofredora, mas atualmente nada há que fazer por ela, senão aconselhá-la a pedir, pela prece, a calma e a resignação para suportar corajosamente a sua prova. Não são instruções dos Espíritos que lhe são necessárias; seria mesmo prudente afastá-la de toda ideia de correspondência com eles, e aconselhá-la a entregar-se totalmente aos cuidados da medicina oficial.”

Doutor DEMEURE.

OBSERVAÇÃO: Não é só contra as obsessões simuladas que é prudente se pôr em guarda, mas contra os pedidos de comunicações de todas as naturezas, evocações, conselhos de saúde etc., que poderiam ser armadilhas feitas à boa-fé, de que a malevolência poderia servir-se. Convém, pois, não aceder aos pedidos dessa natureza, senão com conhecimento de causa, e em relação a pessoas conhecidas ou devidamente recomendadas. Os adversários do Espiritismo veem com pesar o desenvolvimento que ele adquire, contrariamente às suas previsões. Eles aguardam e provocam ocasiões de pilhá-lo em falta, quer para acusá-lo, quer para expô-lo ao ridículo. Em semelhante caso, é melhor pecar por excesso de circunspecção do que por imprevidência.

ALLAN KARDEC.


Janeiro 2 (Paris – Grupo Desliens, 20 de dezembro de 1868 – Médium: Sr Nivard)

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1. — Lê-se no Droit:

“O Sr. Jean-Baptiste Sadoux, fabricante de canoas em Joinville-le-Pont, avistou ontem um jovem que, depois de ter vagueado por algum tempo sobre a ponte, subiu no parapeito e se jogou no Marne. Imediatamente foi em seu socorro e, ao cabo de sete minutos, retirou-o. Mas a asfixia já era completa, tendo sido infrutíferas todas as tentativas feitas para reanimar aquele infeliz.

“Uma carta encontrada com ele revelou tratar-se do Sr. Paul D…, de vinte e dois anos, residente à rua Sedaine, em Paris. A carta, dirigida pelo suicida ao seu pai, era extremamente tocante. Pedia-lhe perdão por o abandonar e dizia que havia dois anos era dominado por uma ideia terrível, por uma irresistível vontade de se destruir. Acrescentava que lhe parecia ouvir fora da vida uma voz que o chamava sem tréguas e, malgrado todos os seus esforços, não podia impedir-se de ir para ela. Encontraram, também, no bolso do paletó, uma corda nova, na qual tinha sido feito um nó corredio. Depois do exame médico-legal, o corpo foi entregue à família.”

A obsessão aqui está bem evidente e, o que não o está menos, é que o Espiritismo lhe é completamente estranho, nova prova de que esse mal não é inerente à crença. Mas, se o Espiritismo nada tem a ver com o caso, só ele pode dar a sua explicação. Eis a instrução dada a respeito por um dos nossos Espíritos familiares, e da qual ressalta que, mau grado o arrastamento a que o jovem cedeu para a sua infelicidade, não sucumbiu à fatalidade. Tinha o seu livre-arbítrio e, com mais vontade, poderia ter resistido. Se tivesse sido espírita, teria compreendido que a voz que o solicitava não podia ser senão de um mau Espírito e as consequências terríveis de um instante de fraqueza.


2. (Paris. – Grupo Desliens, 20 de dezembro de 1868. – Médium: Sr. Nivard.)


A voz dizia: Vem! vem! Mas essa voz do tentador teria sido ineficaz, se a ação direta do Espírito não se tivesse feito sentir. O pobre suicida era chamado e era impelido. Por quê? Seu passado era a causa da situação dolorosa em que se achava; apegava-se à vida e temia a morte. Mas, pergunto, nesse apelo incessante que ouvia, encontrou força? Não; hauriu a fraqueza que o perdeu. Superou os temores, porque, enfim, esperava encontrar do outro lado da vida o repouso que o lado de cá lhe negava. Foi enganado: o repouso não veio. As trevas o cercam, sua consciência lhe censura o ato de fraqueza e o Espírito que o arrastou escarnece ao seu redor e o criva de motejos constantes. O cego não o vê, mas escuta a voz que lhe repete: Vem! vem! E depois zomba de suas torturas.

A causa deste caso de obsessão está no passado, como acabo de dizer; o próprio obsessor foi impelido ao suicídio por esse que acaba de fazer cair no abismo. Era sua mulher na existência precedente e tinha sofrido consideravelmente com a devassidão e as brutalidades de seu marido. Muito fraca para aceitar com resignação e coragem a situação que lhe era dada, buscou na morte um refúgio contra seus males. Vingou-se depois, e sabeis como. Entretanto, o ato desse infeliz não era fatal; tinha aceito os riscos da tentação; esta era necessária ao seu adiantamento, porque só ela podia fazer desaparecer a mancha que havia sujado sua existência anterior. Aceitara seus riscos com a esperança de ser mais forte e se havia enganado: sucumbiu. Recomeçará mais tarde; resistirá? Isto dependerá dele.

Rogai a Deus por ele, a fim de que lhe dê a calma e a resignação de que tanto necessita, a coragem e a força para não falir nas provas que tiver de suportar mais tarde.


Louis Nivard.



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