Espelhos da Alma: Uma Jornada Terapêutica
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DRAMA HUMANO
—Acabo de ouvir a conferência com alma e coração contritos.
Jamais as palavras de qualquer procedência penetraram-me tão profundamente o ser como agora. Encontro-me extasiada e perplexa, ante a minha situação. - Revelou a jovem bem posta, elegantemente trajada, com lágrimas de sincera unção. - Necessito de alguém que me ajude.
—Estou às suas ordens.
– Respondeu o intérprete da Mensagem.
—É uma longa história e há tantos na fila, desejando falar-lhe, que não me encorajo!...
—Aguarde, então, um pouco, por favor!
Terminados os abraços e a ligeira assistência fraterna a uns e outros, o discípulo de Jesus chamou-a.
—Tentarei ser breve. - Explicou a jovem -. Sou uma bailarina de profissão, a fim de poder gozar, na velhice, de algum benefício social, no entanto sou realmente uma vendedora de ilusão. O meu padrasto seduziu-me no próprio lar, quando eu contava 14 anos. Ameaçou-me, caso eu revelasse à minha mãe ou a qualquer pessoa. Vivi aterrada, traindo a minha genitora que tudo ignorava, explorada por um monstro que me perseguia. Não podendo magoar minha mãe com a verdade, fugi de casa, por amor a ela e para ver-me livre... Fez uma pausa, a fim de ordenar as lembranças e prosseguiu:
—De ludíbrio em ludíbrio terminei num lupanar, onde hoje resido. Há dois anos conheci um cavalheiro que me retirou dali e ofereceu-me segurança, amor e paz. Mais idoso do que eu 30 anos, eu o respeitava e tinha-lhe profunda amizade. Um dia, quando conversávamos, informou-me ser casado, pai de dois filhos, um rapaz e uma jovem da minha idade. Amava a esposa e não tinha coragem de abandonar a família, embora me amasse muito, também.
Sem saber-me explicar o que aconteceu, passei a sofrer de um tremendo complexo de culpa. Sabia-me destruindo-lhe o lar. À medida que passava o tempo, defini-me por abandoná-lo. Escrevi-lhe uma longa missiva, relatando meu dilema e partindo para outro país...
Enxugou as lágrimas copiosas, continuando a narração.
—Não o olvidei nunca. Um ano depois, arrasada pelas saudades, retornei.
Procurei-o. Soube que na minha ausência, ele ia ao lupanar, sentava-se em silêncio na cadeira onde nos conhecemos, na recepção, e saía. Noite, após noite, sem uma palavra, sucumbindo... Depois, não mais voltou... Certamente morrera... "Como lhe soubesse a residência fui até lá.
Recebeu-me a viúva. Expliquei-lhe que seu esposo fora-me um benfeitor e eu desejava, ao retornar do estrangeiro onde me encontrava a estudar, e sabendo do seu desenlace, apresentar condolências, agradecer... " "A respeitável e bela senhora recebeu-me compungida. Frente a frente eu repassava toda experiência, mentalmente, fazendo-me uma cruel interrogação: "Fora melhor assim, ou se houvesse ficado, tê-lo-íamos ambas?" Ele havia perecido de angústia, de saudade. "Sem diagnóstico", afirmou-me a dama... " "Começou, então, minha decadência. Passei a usar drogas... Fui presa duas vezes... Hoje, ao sair do cárcere, resolvi matar-me.
Vesti-me bem, dirigi-me ao bar, preparava-me para tomar um refrigerante com veneno, quando ouvi dois cavalheiros que falavam sobre o suicídio, a conferência... Interpelei-os. Pacientes, explicaram-me que não há morte, trouxeram-me aqui. Que faço, agora?
—Necessitaríamos de tempo, minha irmã.
Neste momento outro compromisso me aguardava e amanhã deverei viajar a outra Cidade...
Enquanto dialogavam, acercou-se a anfitrioa do orador, sorrindo, e lembroulhe o compromisso.
Ante a difícil conjuntura ele olhou para uma e outra personagem, sem saber o que fazer.
A senhora, acostumada aos dramas humanos, compreendeu o problema e sugeriu:
—Por que não convidamos a jovem a vir à nossa casa, a fim de continuar o assunto.
—Eu?! Perdão, senhora, não posso lá ir.
Eu sou uma pecadora...
—Não lhe estou a perguntar quem você é.
Isto não importa. O essencial é o que pretende ser a partir deste momento. Vamos!
A decisão não permitia qualquer outra alternativa.
Terminado o compromisso a jovem e o mensageiro da Verdade conversaram demoradamente, até a alvorada do dia imediato. Foram examinados os diversos ângulos da difícil questão em face da sua complexidade, a senhora propôs:
—Fique, aqui, minha filha, a fim de bem refletir, até o nosso amigo retornar, dando curso ao seu programa de reabilitação.
Ela esquivou-se a aceitar.
Havia, porém, tão sincero desejo de ajudar, por parte da senhora, que terminou por aquiescer, ali permanecendo, transitoriamente, e meditando em tudo quanto ouvira.
Três dias após, retornou o orador a continuar as conferências na Capital.
A jovem acompanhou-as todas. Recebeu conselhos e diretrizes.
—Diga-me, por favor, ele morreu por minha culpa? - Inquiriu, magoada, oportunamente.
—Não, pela própria responsabilidade.
Você fez o que deveria fazer.
—Graças a Deus! Há quase dois anos, porém, sofro terrivelmente.
—O Senhor resolverá tudo.
Entregue-se a ele. Tentou entrar em contato com sua mamãe, neste ínterim?
—Sim, várias vezes.
Estava envenenada pelo meu padrasto. Amaldiçoou-me, pedindo-me que nunca mais tentasse falar-lhe. Não lhe pude dizer a verdade. Fá-la-ia mais inditosa.
—Agiu corretamente.
Os dias se passaram animosos. A jovem, hospedada no lar em que se encontrava o conferencista, renascia.
À despedida, antes de retornar aos seus penates, o trabalhador rogou-lhe forças e coragem para prosseguir no bem.
O casal, que não tinha filho, à guisa de gratidão ao amigo consolador, ofereceu o lar à moça atormentada, insistindo com veemente decisão.
Ela terminou por ceder.
Dois meses depois, a ex-decaída parecia renovada.
Fizera tratamentos médicos, submetera-se às disciplinas morais e exultava.
Escreveu ao amigo distante, narrando suas novas disposições íntimas, sua felicidade.
Passara a frequentar a Instituição Espirita dirigida pelos seus atuais benfeitores.
Quatro meses após informava que encontrara um confrade que lhe propusera afetividade.
Não sabia o que fazer. Tinha receio de enganar-se outra vez.
Seis meses passados narrava que usara de toda franqueza com o enamorado, minudenciando-lhe o pretérito próximo.
Ele não lhe perguntava pelo já ocorrido. Oferecia-lhe o futuro...
Casou-se um ano após a entrevista e estava ditosa.
No segundo aniversário na sua renovação, tornara-se mãe de um varão.
Retornava aos seus braços e sentimentos o antigo apaixonado que se frustrara, na condição de filho dileto, a fim de sublimar o amor, graças à bênção da reencarnação.
O drama humano fora solucionado pela sabedoria do Pai que tudo prevê e provê com perfeição.
Nada, nenhum drama justificará a fuga pelo suicídio.
A manhã nova trará, com certeza, resposta ao problema sombrio da noite em que o homem se debate.
Conveniente esperar.
Há sempre soluções felizes para as questões mais complexas, se as colocamos nas mãos do Senhor.
Ter paciência é confiar.