Psicologia da Gratidão

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CAPÍTULO 12

10 Técnicas da gratidão

A gratidão pode ser considerada como uma condição para se viver feliz, conforme a definiu Albert Schweitzer, informando que ela era o segredo da vida.

Ele, mais do que qualquer outra pessoa, sempre bendizia a vida, apesar daqueles dias nem sempre confortáveis em Lambaréné, na África Equatorial Francesa, onde mantinha a sua obra de dignificação humana.

Europeu da cidade de Kaysersberg, na Alsácia, ao transferir-se com a esposa para aquela região hostil, experimentou o áspero clima tropical, a elevada umidade do ar na floresta densa, as condições quase inóspitas para alguém que sempre vivera em região fria e civilizada, a falta de recursos para qualquer tipo de comodidade, e, apesar de tudo, manteve o sentimento de gratidão viva em sua existência, cantando louvores a Deus.

Foi ali, em condições desafiadoras que ele escreveu duas obras monumentais: A busca do Jesus histórico e um tratado de ética dos mais belos do século XX. A sua ética estava expressa no conceito: respeito pela vida, que ele defendia com sacrifícios até o máximo possível.

Uma análise das bênçãos que a existência física proporciona seria suficiente para se agradecer por se estar vivo no corpo; pelo ar que se respira; a água, o pão que a natureza fornece, ao lado das maravilhas de que se veste o Cosmo; as noites estreladas, a poderosa força mantenedora do Sol e a tranquilidade magnética da Lua, a brisa refrescante, a chuva generosa, a temperatura agradável...

tudo que vibra e que merece gratidão.

E certo que existem os desastres sísmicos, as tormentas de vário porte, que também são dignos de reconhecimento, facultando a valorização do que é saudável e dignificante.

Fossem apenas agradáveis todos os fenômenos existenciais e não haveria mecanismo válido para se promover o progresso moral do ser assim como o desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade.

Envolto no escafandro material, o Self é candidato à superação das circunstâncias, trabalhando-se com afinco para alcançar a plenitude da sua junção indestrutível.

Inspirando o ego a modificar a estrutura do comportamento, facultalhe, ao longo do tempo, a visão inspiradora do desenvolvimento interno, diluindo a sombra que também se lhe torna motivação para a conquista de novas experiências, proporcionando-se bem-estar, que é essencial para uma existência compensadora.

A busca dessa sensação de alegria e de satisfação transforma-se num motivo estimulante ao ego, mesmo que relutante, porque a ausência desses pequenos prazeres aumenta o sentimento de culpa, frustra a autor realização, empurram para transtornos complexos e mórbidos, que se transformam em enfermidades orgânicas por somatização.

É nesse embate que surge a necessidade da gratidão, não apenas em relação ao que se recebe, mas sobretudo pelo que é possível oferecer-se, participando do espetáculo da vida em sociedade na condição de membro atuante e não de parasita prejudicial.

Sempre há quem justifique não possuir muito para repartir, olvidando-se que a maior doação é aquela que nasce na grandeza do pouco, qual a referência evangélica em torno da oferenda da viúva pobre.

Mesmo ela possuía algo para doar ao templo, cumprindo a lei que assim o estatuía.

Dádivas outras, não menos valiosas, consistiam na oferta do trabalho de limpeza do santuário, dos lugares em que os outros pisavam, na conservação dos objetos do culto, nos cuidados reservados a tudo que dizia respeito ao templo, em razão de não possuírem nem sequer a liberdade, ou porque rastejassem nas situações humilhantes do serviço detestado pelos vãos e orgulhosos sacerdotes, ricos de presunção e pobres de sentimentos...

A gratidão pode também se expressar de forma especial, como respeito e apreço, consideração e amizade, singelos padrões de comportamento social que devem existir em todo grupo humano.

O hábito de retribuir dádivas restringiu o sentimento gratulatório, tirando-lhe a beleza emocional.

Claro está que dividir o que se tem com quem também oferece representa um passo avançado na psicologia da gratidão.

Entretanto, merece que seja considerada a oferta que nasce do coração, sem nenhuma outra motivação material que exija retribuição, transformando-se em oferta da gentileza, da alegria de viver, porque se faz parte da orquestra viva da sociedade.

Esses gestos espontâneos contribuem para a felicidade a que se aspira, gerando situações positivas na existência, por modificarem os sentimentos do gentil doador, que se aureola de harmonia, porquanto o doar é sempre acompanhado pela imensa satisfação de assim proceder.

Todo aquele que aspira a alcançar o planalto da saúde e da harmonia é convidado a exercitar-se na arte de oferecer e de oferecer-se.

Em Atos dos apóstolos, entre muitos outros, há um momento encantador, quando Pedro e João saem do Templo de Jerusalém, e os pobres, os enfermos, os aflitos distendem-lhes as mãos, suplicando auxílio monetário, especialmente um coxo que aguardava a esmola em forma de moeda.

Percebendo-se destituídos desses recursos, Pedro, com ênfase, olhando João, disse ao sofredor: Não tenho prata nem ouro, mas o que tenho isso te dou: em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, anda! (At 3:6) Ante o assombro geral, o enfermo recuperou os movimentos, deslindou os membros paralisados e ergueu-se jubilosamente...

A partir daí, dessa dádiva de amor, as pessoas colocavam os seus pacientes por onde os dois passavam, a fim de que a sua sombra cobrisse alguns deles (At 5:15), na expectativa de que os curasse.

Todas as coisas são boas e merecem respeito, no entanto aquelas que são conseguidas como dádivas do sentimento, que não são compradas, possuem um valor emocional muito maior.

Desse modo, ninguém se pode escusar de oferecer algo de si mesmo, contribuindo para o bem-estar geral, que começa no ato da oferta.

É sempre melhor doar do que receber, porquanto aquele que doa é possuidor, ocorrendo com quem recebe a situação de devedor, e uma das maiores dívidas que existem é a da gratidão, porque um socorro em momento especial define todo o rumo da existência, que passa a dignificar-se, a crescer, a produzir, após esse instante significativo.

Quando se mata a fome ou a sede, oferece-se segurança e trabalho a quem os necessita, doa-se paz e alegria de viver àquele que se encontra à borda do desespero suicida, tudo quanto lhe vem a suceder é fruto daquele gesto salvador.

A dívida, pois, ao que recebeu não pode ser resgatada senão por outra vida.

Narra-se que um indiano, que tivera o filho assassinado por um paquistanês, nos hórridos dias da guerra entre as duas nações, buscou o Mahatma Gandhi e contou-lhe a tragédia que se permitiu, rogando-lhe ajuda, orientação.


O sábio mestre meditou e respondeu-lhe:

— A única maneira de resgatar o seu crime é educar uma criança órfã paquistanesa como se fora seu filho.


O interrogante argumentou:

— Mas somos inimigos e um deles matou o meu filho.


Tranquilo, redarguiu o mestre:

— Tornamo-nos inimigos uns dos outros porque isso nos compraz.

Somente porque o alucinado matou o seu filho, você não tem nenhum direito de retribuir-lhe o crime, tornando-se igualmente homicida.

O homem, sensibilizado, adotou uma criança paquistanesa e dela fez um cidadão de bem.


Gratidão a curto e a longo prazo

As emoções constituem reflexos do Self, exteriorizando as construções e ideações mentais.

Quanto mais diluída a sombra que se lhe integra ao longo da evolução, mais fortes emoções tornam-se factíveis.

Ressumando as fixações perturbadoras do inconsciente pessoal assim como do coletivo, mais imperioso faz-se administrá-las mediante a sua substituição por formulações opostas, que irão superando-as no transcurso do tempo, através da repetição.

O exercício de qualquer função é sempre o meio mais hábil para que se faça a sua fixação valiosa, tornando-se um hábito novo que se insculpe no comportamento.

Nisso consiste a educação mental que proporciona a renovação moral.

A saúde emocional, desse modo, faz-se consequência do empenho do Self, quando se resolve pela mudança de atitude perante a vida, não mais aceitando os condicionamentos perniciosos, os vícios morais, as atitudes de agressividade e de perturbação.

Os conflitos, que são as heranças doentias do ego e da sombra, quando delinquiram, são psicoterapeuticamente transformados em segurança pessoal, em harmonia do comportamento - mente e emoção, graças ao empenho do Self dando lugar ao bem-estar que se expressa como saúde interior.

Eis por que os velhos refrões: pensa no bem e o bem te acontecerá, tanto quanto pensa no mal e pior te tomaras transformam-se em fenômenos da conduta do Self na manutenção dos equipamentos delicados da emoção.

O pensamento é desse modo um dínamo gerador de ondas que movimentam a maquinaria orgânica, exteriorizando-se dos neurônios cerebrais em direção ao sistema nervoso central, que as envia às glândulas endócrinas, e, por fim, vibrando no sistema imunológico, por extensão, repercutindo no emocional e dando lugar a efeitos perfeitamente equivalentes.

Pensamento é força dinâmica e vital.

O que se fixa no pensamento, a vida responde em forma de ideoplastia ou concretiza-se inconscientemente, desde que o automatismo da repetição na mente faz-se responsável pela condução a que o indivíduo se entrega.

No que diz respeito aos fenômenos psicológicos de pequena ou de grande monta, ei-los que se traduzem como sentimentos de variada expressão, desde aqueles que consomem as energias, resultando em depressões, distúrbios do pânico, pavores diversos, síndromes de Parkinson e de Alzheimer ou esperança, alegria, equilíbrio, gratidão...

A gratidão moral é de suma importância para o engrandecimento do Self Isto é: a lúcida compreensão da conduta irregular de outrem, ao lado da tolerância e da humildade pessoal proporcionam o reconhecimento de que cada qual se comporta de acordo com o seu nível de consciência e o seu estágio intelecto-moral.

Compreende-se, desse modo, que um gênero de gratidão desconhecido é o perdão real.

Para que se expresse esse sentimento nobre - o perdão! -, é imprescindível maturidade emocional, compreensão da realidade da existência, respeito ético pelo próximo, cultura da compaixão, sem o que mui dificilmente pode ser exercido.

Quando o amor se expande, o perdão torna-se um fenômeno natural, porquanto ao espraiar-se, a afetividade supera qualquer limite imposto pelas convenções para se tornar um oceano de generosidade.

Quando alguém se permite a preservação do ressentimento em relação a outrem que lhe não haja correspondido à expectativa, acreditando-se em postura melhor, supondo-se merecedor de mais cuidadosa consideração, realmente se encontra no mesmo nível, porque a mágoa é escara moral de inferioridade e de presunção...

A diferença, portanto, entre aquele que perdoa e o que vai perdoado, é que o primeiro se encontra em superior patamar de evolução, podendo estar aberto ao retorno do ofensor, sem nenhuma censura ou reprimenda, o que corresponde ao legítimo esquecimento do mal para somente se recordar do bem edificante.

O perdão dignifica aquele que o favorece, como necessidade de conceder ao outro o pleno direito de caminhar conforme as próprias possibilidades.

A luz sempre dilui sem alarde a sombra da ignorância, da maldade, da perversidade...

A gratidão a curto prazo logo se faz um verdadeiro automatismo, no receber e no retribuir, no oferecer antes de conseguir, no ato de estar-se livre para a vida.

Quando, ao contrário, espera-se a retribuição, vive-se a síndrome de Peter Pan, mantendo-se interessado em coisas e negando-se ao amadurecimento, à reflexão, à autodoação que dignificam.

A largo prazo, a gratidão irisa-se de sabedoria para enriquecer a sociedade com as bênçãos do conhecimento e do amor, como resultado de um grande esforço para atingir a meta que lhe faculte servir com abnegação e devotamento.

O profissional de qualquer área que aplica largo período da existência preparando-se para adquirir conhecimentos e habilidades específicas para serem aplicadas posteriormente, alcança o patamar da gratidão, que ajuda a satisfação pessoal, o progresso dos demais indivíduos e, por extensão, da Humanidade.

De maneira pessimista, alguém enunciou que a Terra é um grande hospital, sem dar-se conta de que essa conclusão é resultado de uma óptica moral distorcida a respeito da realidade, que é sempre promissora e rica de oportunidades felizes.

Pode-se, isso sim, afirmar de maneira correta que a Terra é uma escola de bênçãos, na qual ocorre o aprimoramento moral e espiritual do ser no rumo do estado numinoso que o aguarda.

Esse estado é o nível superior de integração do eixo ego self alcançando a sua plenitude.

Todo esforço, portanto, direcionado à conquista do padrão de equilíbrio emocional mediante os sentimentos edificantes deve ser tido em consideração para o encontro com o Si profundo, transmudando as experiências perturbadoras em aquisições relevantes, capazes de alterar toda a estrutura do comportamento.

O Self possui condições inatas para essa realização, porque procede de conquistas contínuas no larguíssimo processo de desenvolvimento das suas possibilidades de realização plena.


Gratidão como norma de conduta

Do ponto de vista teológico, pode-se considerar a gratidão como uma virtude semelhante às demais, entre as quais a fé, a esperança e a caridade.

Uma observação cuidadosa perceberá que, para se ser grato, é necessário possuir fé, ter a certeza do significado da vida, dos seus valores e possibilidades; é indispensável acreditar no ser humano, considerando que, momentaneamente em transição para logros mais significativos, merece apoio e consideração que o ajudem a autossuperar-se, galgando mais elevado degrau da evolução.

De igual maneira, no ato gratulatório encontra-se a esperança que aformoseia a vida, apresentando o futuro como meta a alcançar-se mediante a vivência dos sentimentos enobrecedores, a certeza de que vale a pena todo e qualquer investimento que dignifica.

E, por fim, torna-se presente a essência da caridade, que é o significado do ato de agradecer, expressando o amor que é vital para quaisquer investimentos de natureza moral e espiritual.

Sem essa presença, a gratidão é pobre de vigor e de enriquecimento emocional.

Cada experiência vivenciada no processo da evolução, qual ocorre com a gratidão, representa uma forma adequada de amadurecimento psicológico, capaz de produzir harmonia interior e estimular o esforço para o autocrescimento.

Ainda não liberto dos atavismos, o Self investe esforços para a sublimação da sua sombra, ao mesmo tempo influenciando o ego a respeito da necessidade de autotransformação das metas próximas para aquelas de ordem transcendente.

Desmaterializar as ambições egoicas para transcendê-las em forma de aspirações psicológicas profundas que dão significado à existência deve ser-lhe o constante esforço no seu relacionamento com a persona.

Fixada por interesses imediatos de respostas agradáveis, mesmo que mentirosas, a persona compraz-se em manter-se vibrante, mesmo quando constata não mais poder ocultar as necessidades emocionais daqueles que se lhe submetem cativos ao seu encantamento.

Vestir-se de realidade, desnudando-se das fantasias e dos mitos enganosos, deve sempre ser a proposta do Si profundo, por conhecer o que é legítimo e proporciona harmonia, em relação ao que é prazeroso, mas de sabor amargo e enfermiço para a emoção.

Ninguém pode viver ocultando a sua realidade, razão por que o tempo, na sua voragem inevitável, sempre retira os véus que disfarçam os contornos da existência e obscurecem a percepção da sua autenticidade.

É essa teimosa fuga de si mesmo que dá lugar nas criaturas a muitos conflitos e transtornos na área do comportamento, pelo consumo de energia emocional para parecer, em vez de aplicá-la no esforço natural criativo e renovador para ser.

Arquétipos novos podem, então, ser gerados, favorecendo a edificação dos significados da evolução, enquanto outros que são perturbadores irão cedendo lugar às novas formulações que proporcionam inefável alegria pelo seu cultivo.

Quando se é capaz do autoenfrentamento sem receio e como fenômeno próprio do auto amor, inúmeros tesouros da emoção podem ser descobertos, e a alegria de viver deixa de ser através do consumismo e da troca de quinquilharias para adquirir conteúdos valiosos de amor, de intercâmbio, de paz e de gratidão.

A gratidão envolve-se em força estimuladora para todos os empreendimentos vitais, tornando-se uma forma, uma norma de conduta.

Quem é grato, naturalmente é abençoado pela felicidade, pela saúde, esparzindo as ondas de júbilo que o envolvem, contaminando todos aqueles que se lhe acercam.

Habitualmente, as referências dizem respeito ao contágio do mal, das doenças, dos dissabores, da infelicidade, nada obstante também ocorre o que diz respeito à alegria, à esperança, à comunicação jubilosa, ao serviço edificante e à conquista da saúde.

A convivência com pessoas saudáveis permite impregnação de estímulos que já não funcionavam.

Diante de alguém que sorri, abençoado pela conquista da harmonia pessoal, todos sentem um imenso desejo de alegrar-se também, de participar do festival do júbilo, como ocorre ao botão de rosa que desata as pétalas, exteriorizando o perfume que lhe é inerente, abrindo-se delicadamente à luz do Sol.

Na etapa final da imaginação ativa é necessário que cada qual realize a sua experiência para que as verdades profundas se transformem em realidade.

É o caso da gratidão, que necessita ser vivenciada, já que ninguém pode defini-la por palavras, de modo que outrem a possa sentir ou mesmo entender.

Kierkegaard afirmava que ninguém pode dar a fé a outrem.

Isso porque se trata de uma conquista pessoal, intransferível.

É possível, desse modo, crer-se no inacreditável, e estão embutidos aí todos os tabus e superstições que afloram do inconsciente coletivo e assumem realidade na imaginação daqueles que creem.

Essas heranças arquetípicas de tal modo estão vivas no inconsciente que, ao ressumarem, modificam-se para realidades que impregnam aqueles que as vivenciam.

O mesmo pode-se dizer da gratidão.

É uma experiência pessoal, embora possa também se expressar coletivamente, que não resulta de nenhuma herança arquetípica, sendo uma conquista do Self, expressando libertação do comportamento egoísta.

Há conquistas que somente se originam na experiência, embora possam ser formuladas teoricamente, tornando-se válidas somente quando passam pela vivência.

Afirmava Jung que cada avanço, mesmo o menor, através deste caminho de realização consciente, acrescenta muito para o mundo.

A fim de que o indivíduo se liberte dos conflitos, especialmente daquele gerador da ingratidão, é necessário que tenha vida interior, que se organize internamente para expressar ao mundo aquilo que anela e alcançará.

Não há por que ignorar-se o conflito, mas antes enfrentá-lo, envolvendo-o nos ideais e aspirações, reunindo a dualidade (gratidão e ingratidão) num todo harmônico, transformando-as em unidade (sentimento de gratidão) que passará a vigorar no dia a dia existencial.

Muitas vezes a gratidão se apresentará como um paradoxo.

Por que se há de agradecer, quando se pode prosseguir no prazer? Ocorre que o prazer cansa, perde o sentido, produz o tédio, exige renovação.

Ademais, nenhum prazer pode ter lugar no consciente sem que haja uma perfeita liberação do inconsciente, identificação dos fatores que o produzem, entre os quais as pessoas, as circunstâncias envolvidas.

Ignorar todas essas condições é manter-se em delírio distante da realidade, que se impõe pela própria razão de ser.

A gratidão, então, pode parecer paradoxal, pelo fato de manifestar-se também quando cessa o prazer, quando surgem a dor e a desdita, como sentido natural do processo da vida.

Não fosse dessa maneira e se viveria em uma fantasia ativa que sempre alcançará a realidade existencial.

Nenhum paradoxo, portanto, na gratidão em todas e quaisquer circunstâncias, como sentimento de júbilo pela presença da vida que estua triunfante.

Por fim, aplique-se o enunciado de Nietzsche, quando afirma: Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisardes passar para atravessar o rio.

Ninguém, exceto tu!


Gratidão e alegria de viver

Na busca da solução dos conflitos, a aplicação da imaginação ativa é essencial, ao lado dos sonhos, para se encontrar a sua psicogênese.

Na aplicação da imaginação ativa é imprescindível encontrar-se um nível que penetre na fronteira da consciência com o inconsciente e faculte a vivência de muitas ocorrências que não foram realmente vividas.

Transferidas automaticamente umas e outras como mecanismo de fuga da realidade, permanecem adormecidas e ressumam, não poucas vezes, como expressões perturbadoras.

Cada indivíduo é o resumo complexo de energias, possibilidades e arquétipos que não foram utilizados, isso porque um grande número tem caráter prejudicial, conforme a conceituação do ego, que tenta selecionar o que é positivo daquilo que lhe pode ser prejudicial, reprimindo-as imediatamente.

O devir, de alguma forma, fica vinculado a essas ocorrências que o impedem de realizar-se.

Considere-se alguém que dispõe de possibilidades para as artes, no entanto é atraído para uma profissão liberal através da qual adquire garantia financeira para manter a existência.

É natural que essa tendência e todo o séquito de recursos fiquem reprimidos no inconsciente por falta de tempo, de ocasião para se expressar.

O mesmo sucede com uma mulher que se dedica ao lar, embora sentisse imensa aptidão para atividades universitárias ou outras fora do ninho doméstico.

Todas essas tendências irão permanecer-lhe no subsolo da consciência vibrando palidamente ou gerando desconforto no trato com a família, a sua escolhida realidade.

Certamente, um e outra poderão vivenciar essas tendências por intermédio da imaginação ativa, de maneira simbólica ou mesmo real, quando surgirem momentos adequados, sem nenhum prejuízo para os deveres já assumidos.

Assim, é possível viver essas potencialidades de maneira consciente no mundo dos relacionamentos sociais, tanto quanto intimamente no prazer de as realizar de forma simbólica, aplicando os seus recursos na atividade elegida.

Provavelmente os sonhos proporcionarão essa realização, como se a pessoa houvesse encontrado o roteiro de harmonia que tanto desejava, havendo ficado frustrada pela correspondente falta de vivência.

Quando não se consegue a experiência vivida, podem surgir tons de amargura no comportamento feliz, assim como de incompletude, de traumas psicológicos...

E muito comum, numa vivência pela imaginação ativa, sentir-se que teria sido ideal que a vida houvesse tomado outro rumo...

Muitas ocorrências dessas têm lugar no momento, por exemplo, da eleição dos vestibulares acadêmicos, quando o jovem inexperiente luta entre o que gostaria de realizar e aquilo que é mais lucrativo.

Ao eleger a segunda possibilidade, durante o curso, porque se sente incompleto e incapaz, abandona-o, e volta a iniciar aquilo que lhe dita o inconsciente mediante a tendência predominante no mundo interior.

Encontram-se pessoas que têm uma vida acomodada, abonada pelos recursos financeiros, uma família bem-estruturada, cumpridoras dos deveres, e apesar disso são sempre levadas a devaneios da imaginação, vivendo outras condutas que lhe dão alegrias.

Nesses momentos em que estão a sós e dão largas à imaginação, sorriem, gesticulam, expressam felicidade, logo retornando à realidade com frustrações...

Naturalmente, o ego, identificando que tal e qual comportamentos não são convenientes ou podem produzir dissabores, reprime essas possibilidades, empurrando-as para os porões do inconsciente onde ficam aguardando...

É perfeitamente lícita e ética a vivência, mesmo que através da imaginação ativa, dessas aspirações não realizadas.

Não são prejudiciais - há, sem dúvida, exceção -, porquanto constituem estímulo para o prosseguimento da existência no labor eleito como mais produtivo.

Depois de vivenciar pela imaginação o real significado existencial, pode-se manter o compromisso assumido e também experimentar viver alguns momentos reais daqueles desejos reprimidos sem que se esteja cometendo nenhum crime.

O executivo ou o profissional liberal bemsituados na sociedade podem tentar a utilização da arte nos seus compromissos, pelo menos como hobby, como divertimento terapêutico.

De igual maneira, a mãe e esposa dedicada pode reservar-se o direito de administrar a família de maneira racional, aplicando os seus conhecimentos na empresa doméstica ou mesmo, simultaneamente, após utilizar o tempo de que dispõe de maneira equânime, dedicar-se a qualquer empreendimento que a enriqueça interiormente, completandolhe as aspirações saudáveis.

Inúmeras vezes a gratidão insinua-se no comportamento dos indivíduos que, por falta de hábito, por timidez e constrangimento, não se encorajam a expressá-la, reprimindo-a injustificadamente.

Como a gratidão necessita do combustível do amor para poder atingir o seu grau de completude, a pessoa deve exercitar a imaginação ativa, vivenciando-a em todas as situações da sua existência, expressando-a intimamente, oferecendo-a com sorrisos silenciosos, sendo útil à comunidade que começa na intimidade da família, mediante os esforços para manter a gentileza e o carinho em qualquer circunstância.

Também poderá fazê-lo através da oração direcionada ao seu próximo, em vibrações harmônicas de bondade e de desejos fervorosos em benefício dos outros.

A fé adquire expressão inesperada, capaz de emular o indivíduo a ações mais audaciosas e a atitudes mais eloquentes, nunca revidando mal por mal, porque descobre no aparente mal com que lhe desejam afligir um grande bem, pela possibilidade que se lhe desenha de superar a inferioridade moral que sempre reage, agindo com equilíbrio e compaixão pelo outro, o opositor.

Nesse capítulo, a fé deve ser sem dúvida racional, mas também momento chega em que ela ultrapassa o limite da lógica e entrega-se em totalidade.

Assim procederam os mártires de todos os tempos e de todos os ideais...

Doaram-se sem quaisquer excogitações. Conta-se que um alpinista galgava um paredão desafiador à noite, quando derrapou no abismo e, durante a queda que seria fatal, foi salvo por um solavanco da corda de proteção cravada por grampos seguros na montanha.

Recuperando a calma e temendo morrer enregelado durante a madrugada, orou afervorado, suplicando o socorro de Deus.

Ouviu uma voz que lhe propôs que cortasse a corda que o prendia à altura.

Parecendo-lhe inusitado o auxílio, receou que, ao fazê-lo, cairia no despenhadeiro em morte certa.

Não se encorajou a fazê-lo.

No dia seguinte, quando chegou o socorro e o encontrou congelado, os membros lamentaram que ele não tivesse cortado a corda, porquanto estava a menos de um metro do solo protetor, quando teria salvado a vida...

Quem é grato, naturalmente é abençoado pela felicidade, pela saúde, esparzindo as ondas de júbilo que o envolvem, contaminando todos aqueles que se lhe acercam.



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Atos 5:15

De sorte que transportavam os enfermos para as ruas, e os punham em leitos e em camilhas para que ao menos a sombra de Pedro, quando este passasse, cobrisse alguns deles.

at 5:15
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Atos 3:6

E disse Pedro: Não tenho prata nem ouro; mas o que tenho isso te dou. Em nome de Jesus Cristo o Nazareno, levanta-te e anda.

at 3:6
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