Sabedoria do Evangelho - Volume 5

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CAPÍTULO 3

MARIA E MARTA

LC 10:38-42


38. E aconteceu que, na ida deles, entrou numa aldeia, e certa mulher de nome Marta recebeuo na casa dela.

39. E tinha uma irmã, chamada Maria, a qual, sentada aos pés de Jesus ouvia o seu ensino.

40. Maria entretanto, estava atarefada com muito serviço; e disse: "Senhor, a ti não importa que minha irmã me tenha deixado sozinha a servir? Dize-lhe, pois, que me ajude".

41. Mas, responcendo-lhe, Jesus disse: "Marta, Marta, estás ansiosa e preocupada com muitas coisas,

42. no entanto, poucas são necessárias, ou melhor, uma só; como Maria escolheu a parte boa, esta não lhe será tirada".



Lucas não nos diz qual a aldeia, mas João (João 11:1) esclarece tratar-se de Betânia, situada no sopé do monte das Oliveiras, na estrada que levava a Jerusalém, 2 km a leste.

Quem hospeda Jesus é Marta, a mais velha, o que significa ser ela solteira. Não fora assim, o marido é que receberia o hóspede. Maria, sem deveres de hospitalidade a desempenhar, senta-se ao chão junto aos pés de Jesus, indiferente ao serviço da casa. Lucas apresenta-a como "uma irmã, chamada Maria", o que afasta a hipótese de identificá-la quer com a pecadora (7:37), quer com Maria Madalena (na 8:2), ambas já apresentadas anteriormente ao leitor pelo evangelista.

Em suas intermináveis idas e vindas, para preparar a casa e a refeição, Marta aflige-se, ao ver que perde grande parte dos ensinos de Jesus. Mas o sentido da obrigação de dona-de-casa é mais forte que o desejo de aprender. Aproveitando-se, então, de uma aproximação, reclama com o Mestre da calma despreocupada de Maria, e pede-Lhe que diga à irmã que venha ajudá-la, condividindo a tarefa doméstica.

A resposta de Jesus é clara, e condena as preocupações de Marta, louvando a preferência de Maria. Há duas lições: A, C1, P, delta e pi escrevem como a Vulgata: "uma só coisa é necessária" (henós dé estin chreían); mas a melhor lição é a de aleph, B, C2, L e versões coptas, etiópicas e siríacas: "poucas coisas são necessárias ou melhor, só uma (olígon dé estin chreía hé henós).

Realmente, de bem pouco precisa o homem na Terra para seu sustento. As complicações e complexidades são criadas pelos desejos do próprio homem, não pela necessidade. Ora, não há razão para preocupações desnecessárias: o essencial é pouca coisa; aliás, o essencial é apenas uma coisa: o reino de Deus.

Assim sendo, Maria é que está com a razão. Escolheu o que é bom, a "parte boa", e esta jamais lhe será tirada. Trata-se da conquista do Espírito que, à medida da evolução, aprende a selecionar o essencial do supérfluo.

Lição curta em seus termos, mas profunda em seus significados. É dada por meio de um fato vivo e autêntico, donde possamos deduzir mais seguramente as conclusões para nosso aprendizado e evolução.

A primeira lição bem compreendida por todos, é que a "vida contemplativa" apresenta, realmente, incontestável superioridade em relação à vida ativa", que é classificada, por exclusão, como a "parte não-boa". Observemos que o Mestre não se refere à primeira dizendo a "a melhor", como que comparando um bem menor a outro maior. Diz, taxativamente, "a parte BOA", opondo-a a uma "parte MÁ".

A vida ativa, a que se refere o Mestre é precisamente a de atender ao necessitado, já que Marta preparava, atarefadamente, alimentos para Ele, o hóspede amorosamente tratado.

Mas a lição mais profunda ensina-nos algo diferente. O hóspede divino de todos nós está caminhando conosco, na "ida" do Antissistema para o Sistema. Nessa viagem, permanece hospedado, recebido em nossa casa. E a "dona-da-casa" (significado da palavra "marta") faz todas as honras ao ilustre Senhor.

Portanto, trata-se de uma criatura que já atingiu elevado grau evolutivo, que já compreendeu a sublimidade daquele que habita em "sua casa".

Acontece, porém, que essa "dona-de-casa", a personagem, vive atarefada e preocupada com os afazeres do mundo, ao passo que a individualidade, "sentada aos pés do Mestre", procura manter-se em contato permanente com Ele. A queixa da personagem não se faz esperar: quer trazer para sua companhia a individualidade, fazendo-a baixar suas vibrações, para mergulhar no azáfama externo e inútil das coisas materiais.

Recorre ao Mestre, e este, alertando-a para o sem-valor dessas coisas, garante a permanência de Maria ("a exaltada" ou "a extática") em seu êxtase maravilhoso. A contemplação é a "parte boa" da vida: jamais a ação divina afastará um Espírito de sua união plena. As tentações materiais e terrenas poderão pretender influir, para afastá-la dessa união. Mas, do lado divino, jamais provirá uma iniciativa dessas. As crenças terrenas de que a "caridade" material sobreleva e vale mais que a contemplação, podem iludir as criaturas imaturas; mas os que já sentiram a presença do Mestre, SABEM que mais vale um minuto de unificação com o Cristo, que uma vida inteira de agitação caritativa. Então, a criatura evoluída, o ser iniciado, mesmo quando precisa desdobrar-se em atividades externas, só o faz com o espírito "sentado aos pés" de seu apaixonado amor.

Como vemos, lição prática, para ensinar-nos a manter os dois lados em equilíbrio, embora bem distintos um do outro. As tarefas terrenas que nos "ocupam", não nos "preocupem": realizemo-las com os veículos externos, sem nelas imiscuir o Espírito. Este deve permanecer na contemplação e na união divina. Agir com as mãos, meditar com o coração. Andar com os pés do corpo, enquanto o Espírito permanece "sentado" a conversar com o Amigo Sublime. Olhar as coisas com os olhos físicos, mantendo o olhar do Espírito preso às belezas do Amor. Raciocinar com o intelecto, deixando a mente a contemplar o Amor do Amado.

E o evangelista soube, perfeitamente, estabelecer a sequência, dando-nos esta lição logo a seguir à d "samaritano", como que prendendo uma à outra, afim de alertar-nos que o atendimento ao próximo, embora necessário e sublimador, não deve afastar-nos, de modo algum, do ambiente místico da contemplação interior.



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Lucas 10:38

E aconteceu que, indo eles de caminho, entrou numa aldeia; e certa mulher, por nome Marta, o recebeu em sua casa;

lc 10:38
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Lucas 10:39

E tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual, assentando-se também aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra.

lc 10:39
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Lucas 10:40

Marta, porém, andava distraída em muitos serviços, e, aproximando-se, disse: Senhor, não se te dá de que minha irmã me deixe servir só? Dize-lhe pois que me ajude.

lc 10:40
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Lucas 10:41

E, respondendo Jesus, disse-lhe: Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas.

lc 10:41
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Lucas 10:42

Mas uma só é necessária; e Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada.

lc 10:42
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João 11:1

ESTAVA então enfermo um certo Lázaro, de Betânia, aldeia de Maria e de sua irmã Marta.

jo 11:1
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