Sabedoria do Evangelho - Volume 7
Versão para cópiaA ESMOLA DA VIÚVA
MC 12:41-44
LC 21:1-4
A frase "sentado em frente ao tesouro" revela-nos que Jesus se achava no ádrio das mulheres. Este era um quadrado cercado de três lados por colunas, sobre as quais havia uma galeria, de onde as mulheres podiam assistir às cerimônias litúrgicas. No quarto lado estava uma larga escada semicircular, com quinze degraus (o templo de Jerusalém dessa época, construído por Herodes, já não tinha as medidas áureas, nem obedecia aos símbolos esotéricos) que levava ao "ádrio de Israel". Num desses degraus sentara-se Jesus, para breve descanso.
Daí via-se, à esquerda, o Tesouro (gazophilácio), que consistia em treze salas (cfr. Chekkina, 6. 1. 5), cada uma das quais exteriorizava um "tronco", de gargalo estreito em cima, que alargava na parte de baixo, donde serem chamados shofarôth ("trombetas"). Aí eram lançadas as esmolas para o gasto do templo. Os exibicionistas trocavam a importância que desejavam dar em moedinhas de cobre (chalkón), para terem grande número e fazerem bastante barulho ao serem lançadas, atraindo dessa forma a atenção dos demais peregrinos.
O Mestre estava a olhar aquela multidão, que tanto se avolumava nos dias da Páscoa, enquanto observava as reações dos discípulos, que se admiravam, arregalando os olhos e cutucando-se, quando algum ricaço, ruidosamente, despejava sua bolsa cheia de moedas, causando um tilintar que trazia alegria aos corações dos sacerdotes que serviam no tempo.
Nisso surge pobre viúva, que deixa escorregar, envergonhada, dois leptas (dois centavos!). Um sorriso fugaz dançou sub-reptício nos lábios dos discípulos, revelando compaixão por aquele gesto inútil.
Marcos esclarece seus leitores de Roma que o lepta vale um quadrante, ou seja, a quarta parte do asse.
O lepta era a menor fração monetária, e pesava cerca de um grama.
Ao ver o gesto da viúva - que Lucas qualifica com o hápax neotestamentário penichrá (paupérrima) e depois a diz ptôchê (mendiga) - e ao observar o desdém "compassivo" dos discípulos, o Mestre, que via além das aparências chama-lhes a atenção para o fato e explica: - Olhem, ela deu mais que todos...
Os olhares dos discípulos se transformam em outros tantos pontos de interrogação duvidosos, até que o Mestre completa a frase:
—... todos deram do que lhes sobrava, mas esta, deu tudo o que tinha para viver.
Todos eles abaixaram as pálpebras de seus olhos: as cenas exteriores deviam desaparecer, para que pudesse sua visão ser preenchida pela luz que lhes nascia, na meditação a respeito de ensino tão inopinado e contundente.
E não era para menos. Invertiam-se de golpe todos os valores até então vigentes! Naquela época, como ainda hoje para as personagens, sem exceção - vale mais quem mais dá: nos templos, nas igrejas, nos centros espíritas, nas associações e fraternidades, e até na vida particular: "temos que dar um presente mais caro a Fulano, que foi quem nos deu mais"! ... E as pessoas jurídicas dão títulos de "benemérito", de "sócio vitalício", de "presidente de honra" ...
Ninguém olha com olhos espirituais para a empregadinha que tirou de seu sustento, deixando de tomar uma "média", para doar um tostãozinho: dá-se-lhe em troco um sorriso de favor complacente, com um agradecimento pro forma, e logo se esquece o gesto que tanto lhe custou! ...
A personagem ambiciosa, materialista, interesseira, só avalia as pessoas pelos valores materiais; só ajuda se é ajudado; só dá bons ordenados a quem traz lucros maiores para a organização, como no comércio que rende preito a Mammon. Os que dão pouco rendimento material, os que se dedicam doando de si mesmos mas sem aumentar os lucros, os que dão espiritualmente - esses nada valem para as instituições, mesmo as que se ufanam de ser espiritualistas.
Só quando a humanidade atingir o Espírito e sentir com a Individualidade, é que poderá mudar-se o padrão de aferimento de valores. Por enquanto, nem sequer ouvindo durante dois mil anos a lição d "óbulo da viúva", os cristãos conseguiram despertar da matéria para o Espírito. Ainda não subimos da personagem à individualidade, não aprendemos a lição do Mestre, não fugimos da orientação de Mammon para a de Cristo, não começamos sequer a sair do Antissistema para ingressarmos no Sistema.
Doloroso e lamentável.
Sobretudo porque observamos isso nos ambientes mais "espiritualistas", ou que tais se creem e se dizem.
Nas igrejas, "Santas-Casas", e Centros Espíritas, é comum vermos o retrato do doador da sede e dos benfeitores, embora não se saibam mais os nomes das médiuns passistas "anônimos" e das irmãsdecaridade, que deram sua vida para atender aos enfermos.
Após essa "lamentação" extensa, procuremos os elementos positivos do ensino, para buscar sua realização.
A escala de valores, para a Individualidade, é aferida pelo grau de renúncia e de sacrifício que cada criatura tenha a capacidade de realizar.
Mas não é fácil apurar esse grau, porque aqueles que são capazes de renúncia, também renunciam à palavra autoelogiosa; e os que aprenderam a sacrificar-se, nem sequer percebem o que estão fazendo: esse sacrifício lhes é tão natural e espontâneo, que apenas verificam que estão cumprindo sua obrigação; uns e outros só sabem que "são ser-vos inúteis, que fizeram o que deviam fazer" (LC
Se eles mesmos não se reconhecem superiores, como o farão os outros que não têm olhos de águia para descortinar as grandes altitudes?
Não obstante, os que seguem espiritualmente os cursos da Escola de Jesus, são obrigados a mudar o metro-padrão de sua conceituação. Lembremos o apreço que no oriente é dado aos chamados gurus, que ensinam mais pelo exemplo que pelas palavras, mais pela vivência que pelas pregações. Como disse Gandhi ao missionário cristão, que lhe perguntava qual o melhor meio de atingir os hindus: "VIVER o Evangelho é o meio mais eficiente... Gosto dos que nunca pregam, mas vivem... A rosa não precisa pregar: simplesmente esparze seu perfume" (Harijan, 29-3-935; veja o texto todo em "Sabedoria" n. º 46, outubro 1967, pág. 186).
Portanto, este é o modo de agir. Mas com a capacidade de observação espiritual bem alertada, procuremos sentir o perfume da vivência de nossos companheiros, para dar mais valor aos valores reais, e menor às contribuições materiais, embora isso venha a chocar e ofender fundamente as personagens deles, que julgam muito mais importante a ajuda financeira que a espiritual. Se sofremos com esse nosso modo de agir evangélico, consolemo-nos: o Mestre foi crucificado por não ceder às injunções terrestres dos terrenos, e nós, por mais que soframos, ainda não temos o merecimento suficiente para morrermos mártires... Compreendamos, pois que somos iguais a todos, e não atingimos o grau que aqui assinalamos!
Uma nota mais: não esqueçamos que Jesus afirma que "a viúva deu toda a sua vida" (bíon) ao templo.
Embora possa essa palavra ser traduzida como "seu sustento", o símbolo da doação da vida, de todos os minutos de nossa vida ao Espírito, é de importância, para calcularmos o valor que é atribuído, pelo Mestre, ao trabalho espiritual.
Veja mais em...
Marcos 12:41
E, estando Jesus assentado defronte da arca do tesouro, observava a maneira como a multidão lançava o dinheiro na arca do tesouro; e muitos ricos deitavam muito.
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Marcos 12:42
Vindo, porém, uma pobre viúva, deitou duas pequenas moedas, que valiam cinco réis.
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Marcos 12:43
E, chamando os seus discípulos, disse-lhes: Em verdade vos digo que esta pobre viúva deitou mais do que todos os que deitaram na arca do tesouro;
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Marcos 12:44
Porque todos ali deitaram do que lhes sobejava, mas esta, da sua pobreza, deitou tudo o que tinha, todo o seu sustento.
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Lucas 21:1
E, OLHANDO ele, viu os ricos lançarem as suas ofertas na arca do tesouro;
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Lucas 21:2
E viu também uma pobre viúva lançar ali duas pequenas moedas;
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Lucas 21:3
E disse: Em verdade vos digo que lançou mais do que todos, esta pobre viúva;
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Lucas 21:4
Porque todos aqueles deitaram para as ofertas de Deus, do que lhes sobeja; mas esta, da sua pobreza, deitou todo o sustento que tinha.
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Lucas 17:10
Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer.
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