Sabedoria do Evangelho - Volume 4

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CAPÍTULO 22

VIAGEM A JERUSALÉM

MT 19:1


1. E aconteceu, quando Jesus acabou esses ensinos, partiu da Galileia e veio para a fronteiras da Judeia, além do Jordão.


LC 9:51


51. Em se completando, porém, os dias de sua elevação, aconteceu que ele fortaleceu sua personagem para ir a Jerusalém.


JO 7:10


10. Mas quando seus irmãos já tinham ido à festa, então ele também foi, não abertamente, mas às ocultas.

Os três dizem a mesma coisa, mas cada um revela um pormenor significativo.

Em Mateus é a primeira vez que Jesus vai à Judeia, onde só estivera (segundo ele) duas vezes: no nascimento (2:
1) e no mergulho do Batista (3:1, 13). É que esse evangelista organizou sua narrativa de forma a dar todos os acontecimentos da Galileia de seguida, para depois fazer o Messias seguir para Jerusalém definitivamente, lá ficando até ser crucificado. Sabemos que não havia preocupação cronol ógica nem histórica: estavam sendo escritos livros de ensinamentos para iniciação dos que desejavam aprofundar-se na Escola de Jesus.

Entretanto, anote-se que em Mateus é dito que Jesus foi "para além Jordão" (a Peréia ou Transjordânia), pois atravessou o Jordão, que é o limite leste extremo da Judeia.

Depois desta viagem, Jesus ainda volta à Galileia, subindo a Jerusalém mais duas vezes (a 1. ª dada em LC 13:22 e JO 7:1-10:39: a segunda em LC 17:11 e JO 11:8), até que segue definitivamente (LC 18:31 e JO 11:55). Mateus, porém, além da vez aqui citada, só relata a viagem definitiva (20:18).

Em João, é afirmado que Jesus vai a Jerusalém (está escrito "a festa", mas, como vamos verificar só compareceu para ensinar no Templo). E sua viagem é feita "às ocultas", isto é, em particular, não em caravana.

Lucas é que apresenta aqui a frase reveladora que, por ser bastante clara, trouxe sempre aos hermeneutas dificuldades de tradução. Observemos.

A primeira frase: "quando se completaram (literalmente: "ao se completarem") os dias de sua elevação" (en tôi symplêroústhai tàs hêméras têsanalépseôs autoú) traz discussões quanto à palavra analépsis (ou analémpsis). Usado apenas aqui, no N. T., embora apareça o perfeito passivo anelémphthê de analambánô em At, l: 2 e 22: e o particípio aoristo passivo analemphtheis (em Art. 1:
11) com os sentidos respectivamente de "foi elevado", referindo-se à chamada "ascensão". Esse termo, entretanto, é usado no Antigo Testamento, quando fala da subida de Elias (2RS 2:11), na de Moisés (1. º Mac. 2:58 e Eccli. 48:
9) e na de Enoch (Eccli. 49:14). Realmente analêpsis exprime "elevação promoção, suspensão".

A segunda frase: "e fortaleceu sua personagem para ir a Jerusalém" (kaí autòs prósôpon autou estérixe tou poreúesthai eis lerousalêm) é geralmente traduzida por "firmou seu rosto" ou "manifestou a firme resolução". No entanto, prósôpon, que literalmente significa "face", "rosto", corresponde "o latim" pessoa" ou "máscara" (persona) e portanto especifica a personagem encarnada, designando o todo pela parte, numa figura de sinédoque. Jesus sabia que iria começar a fase final de sua paixão, e logicamente a coragem da parte humana precisava ser fortalecida pelo Espírito, para que se animasse a enfrentar o cenário dos sofrimentos físicos atrozes.

A revelação que obtemos na frase simples e despretensiosa de Lucas é de molde a tornar claro o sentido oculto: "tirando o véu" da letra, descobrimos o que realmente houve. Há necessidade de penetrar pela meditação o sentido, mas a Luz se fará e tudo será visto.

Enquanto Mateus e João se limitam a citar o fato da ida de Jesus a Jerusalém, Lucas, talvez esclarecido por Paulo, revela o motivo exato da partida de Jesus do "Jardim fechado" de sua vivenda espiritual, para penetrar no ambiente estreito e fanatizado dos religiosos ortodoxos.

A frase de Lucas, embora incompreensível aos profanos, é clara para os que já viveram essas fases.

Suas palavras: "em se completando, porém, os dias de sua elevação", que tantas dúvidas têm suscitado nos hermeneutas, pode ser assim traduzida em linguagem atual: "já tendo, pois, transcorrido os" prazos de carência" para sua promoção ao grau seguinte".

Todos os passos iniciáticos eram dados controladamente e, entre um e outro, o candidato era obrigado a demonstrar o aproveitamento que tivera; mas além disso, era indispensável que respeitasse os intervalos prefixados, os "prazos de carência" determinados para cada intervalo. Só depois de transcorrido o tempo regulamentar, lhe era permitido dar o passo seguinte.

Diz-nos Lucas que terminara o prazo da espera, e chegara a hora de submeter-se à prova para, se aprovado, passar ao grau seguinte, "ser elevado" ou "promovido". As provas desse passo eram duras, rudes, dolorosas. E é dito que a individualidade (Jesus) "fortaleceu sua personagem, para que não esmorecesse e tivesse a coragem de colocar-se entre as mãos daqueles que o fariam passar pelas angústias e aflições da provação violenta a que tinha de submeter-se.


Já tinham sido superadas as fases iniciais:

1. º - Vencera a grande dificuldade do mergulho consciente na matéria, com todos os horrores causados pelas limitações à liberdade de um Espírito infinitamente superior, como era o de Jesus (vol. 2). Vencida a prova, tivera a primeira promoção, quando conseguira, na presença do "mestre" João Batista, dar, enquanto na carne, o mergulho no Espírito (vol. 1). 2. º - O segundo passo, a "confirmação", veio em virtude do adiantamento de seu espírito, nesse mesmo momento do mergulho, com a epifania, ou "manifestação" da aprovação divina, por meio da frase: " este é meu Filho, o amado" (vol. 1). Com um ato, superara os dois primeiros graus. 3. º - Para galgar o terceiro, tinha de comprovar o resultado da "metánoia", ou seja, a modificação da mente. É então submetido às "tentações" ocasionadas pela matéria: vaidade, orgulho e ambição. Superouas a todas, dando inequívocas provas de superioridade e elevação máxima. Provava na prática que o Espírito já dominara a matéria totalmente (vol. 1). Podia então dar o passo seguinte.


4. º - O ingresso fora feito com a espetacular manifestação da "Transfiguração", a "ação de graças"

("eucharistía") do homem pela vitória obtida, recebendo a plena efusão do Espírito Divino, com a aprovação confirmada: "este é meu Filho, o amado, ouvi-lo". Depois desse passo, unido já à Divindade, pode Jesus dar as lições maiores: "minha carne é verdadeiramente comida, e meu sangue é verdadeiramente bebida" (JO 6:55). Ensinou-o com clareza absoluta e mais tarde, na chamada "última ceia", iria revelar integralmente o mistério cristão da união com Deus.

Mas agora chegara o momento de preparar-se para as provas dolorosas em que teria que submeter-se ao violento afastamento dos veículos físicos, para unir-se inteiramente a Deus, num "matrimônio" místico total e definitivo: "o que Deus uniu, o homem não separe" (MT 19:6). Mas, para esse grau superior, havia necessidade absoluta da "experiência sofrida", o "páthos" ou paixão. Era o ponto crucial, em que mergulharia em cheio na DOR-AMOR, desligando-se violentamente da parte inferior de seu ser, em holocausto cruento, a fim de libertar a parte superior para a união definitiva com a Divindade no matrimônio indissolúvel.

Diante dessas perspectivas sombrias, a parte física assusta-se, teme e treme, procurando subtrair-se às provas (coisa que, veremos adiante, ocorre com o homem Jesus no instante decisivo). Tudo isso é explicado pelo evangelista com a frase: "fortaleceu sua personagem", para que tivesse a coragem indispensável de colocar-se espontaneamente entre as mãos dos algozes.

No momento crucial do passo decisivo, quando as forças começam a fraquejar, Ele recorre à prece a fim de receber novas energias; e as recebe. E impertérrito segue adiante até o sacrifício final. Exemplo magnífico para todos nós, revelando que realmente "a carne é fraca" (MT 26:41 e MC 14:38), mas que nem por isso devemos esmorecer nem desesperar-nos: os grandes Espíritos também sofrem, quando na carne, as limitações que a carne impõe a todos.



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Lucas 9:51

E aconteceu que, completando-se os dias para a sua assunção, manifestou o firme propósito de ir a Jerusalém.

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João 7:10

Mas, quando seus irmãos já tinham subido à festa, então subiu ele também não manifestamente, mas como em oculto.

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Lucas 13:22

E percorria as cidades e as aldeias, ensinando, e caminhando para Jerusalém.

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João 7:1

E DEPOIS disto Jesus andava pela Galileia, e já não queria andar pela Judeia, pois os judeus procuravam matá-lo.

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João 7:2

E estava próxima a festa dos judeus, a dos tabernáculos.

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João 7:3

Disseram-lhe pois seus irmãos: Sai daqui, e vai para a Judeia, para que também os teus discípulos vejam as obras que fazes.

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João 7:4

Porque não há ninguém que procure ser conhecido que faça coisa alguma em oculto. Se fazes estas coisas, manifesta-te ao mundo.

jo 7:4
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João 7:5

Porque nem mesmo seus irmãos criam nele.

jo 7:5
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João 7:6

Disse-lhes pois Jesus: Ainda não é chegado o meu tempo, mas o vosso tempo sempre está pronto.

jo 7:6
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João 7:7

O mundo não vos pode aborrecer, mas ele me aborrece a mim, porquanto dele testifico que as suas obras são más.

jo 7:7
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João 7:8

Subi vós a esta festa: eu não subo ainda a esta festa; porque ainda o meu tempo não está cumprido.

jo 7:8
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João 7:9

E, havendo-lhes dito isto, ficou na Galileia.

jo 7:9
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João 11:8

Disseram-lhe os discípulos: Rabi, ainda agora os judeus procuravam apedrejar-te, e tornas para lá?

jo 11:8
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Lucas 18:31

E, tomando consigo os doze, disse-lhes: Eis que subimos a Jerusalém, e se cumprirá no Filho do homem tudo o que pelos profetas foi escrito;

lc 18:31
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João 11:55

E estava próxima a páscoa dos judeus, e muitos daquela região subiram a Jerusalém antes da páscoa para se purificarem.

jo 11:55
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II Reis 2:11

E sucedeu que, indo eles andando e falando, eis que um carro de fogo, com cavalos de fogo, os separou um do outro: e Elias subiu ao céu num redemoinho.

2rs 2:11
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Mateus 19:6

Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto o que Deus ajuntou não o separe o homem.

mt 19:6
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João 6:55

Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida.

jo 6:55
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Mateus 26:41

Vigiai e orai, para que não entreis em tentação: na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca.

mt 26:41
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Marcos 14:38

Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca.

mc 14:38
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