Cartas do Alto
Versão para cópiaTrabalhemos pelo Evangelho
É consolador notar-se, em todos os recantos do Brasil, o incremento das ideias espíritas-cristãs à base do Evangelho de Jesus.
Nesta época dolorosa de mórbidos extremismos, em que as comoções revolucionárias subjugam quase todos os povos do planeta, é necessário considerarmos que a chamada civilização cristã não chegou a se cristianizar.
Tantos e tão comovedores são os flagelos das guerras atuais, crucificando a alma de coletividades atormentadas e sofredoras, que chegamos a ponderar se todos os que trabalharam no passado pelo desdobramento da evolução humana não teriam fracassado em seus propósitos de organizar a vida civilizada no orbe.
Tocais a uma época em que todos os valores religiosos se transformaram em valores transitórios da política e em que as ciências morais, edificadoras da consciência humana, se desorganizam num complexo de utilitarismos que apenas vieram comprometer ainda mais a posição das criaturas humanas a caminho da perfeição integral.
A Europa, que há muitos séculos guarda consigo a liderança da cultura e do progresso de todos os povos do mundo, se debate entre ameaças crudelíssimas. Seus fenômenos políticos são os mais complexos e mais obscuros que se pode conceber. A última guerra, que na opinião de um dos vossos estudiosos de sociologia e de política representou uma chuva de sangue que lavou a cara pintada da sociedade hipócrita do Velho Mundo, veio destruir todos os edifícios que as filosofias ali haviam pacientemente organizado.
Grandes normas da vida coletiva, em todos os setores mais diversos de suas atividades, foram eliminadas, impiedosamente, e do trabalho gigantesco de tantos Espíritos beneméritos do passado restam hoje as experiências do fascismo antirracional e do comunismo antibiológico. Doutrinas políticas perversoras e antagônicas, elas só poderão, no desdobramento das atividades de suas organizações, apressar o choque final dos povos na conflagração esperada. Dentro dos seus programas políticos, faleceram muitos nos mais comezinhos princípios de direito internacional e de posição histórica dos países. Ainda há pouco tempo, a imprensa hitlerista, logo após a reocupação da zona desmilitarizada da Renânia, considerava os tratados de paz como grandes exércitos de parágrafos. Os nacionalismos e os coletivismos, largamente praticados na Europa moderna, estão contra as mais sadias normas da vida. Todos esses sistemas de governo, como têm sido compreendidos e interpretados nos tempos atuais, significam a expressão das mais terríveis ditaduras. O mundo terá de se equilibrar à custa do equilíbrio dos fenômenos da troca entre os países que o constituem geograficamente. A autarquia preconizada pelos nacionalismos extremos, essa doutrina política do “bastar-se a si mesmo”, isolando-se cada qual da comunidade internacional, não poderá presidir os fenômenos da evolução planetária. A Rússia, não obstante os seus rótulos de socialismo avançado, não é menos perigosa que a Itália fascista nesse particular. Ambas são líderes de um movimento mundial de extremismos dissolventes e enquanto os produtos ideológicos dessas nefastas doutrinas de governo se digladiam entre si martirizam-se corações nos seus movimentos corruptores, naufragam caracteres dentro de novas tiranias sociais e o sagrado patrimônio da vida vai-se esboroando, à míngua de ideais renovadores do espírito que surgissem no mundo, sem o concurso das lutas fratricidas e indenes do vírus nefasto da guerra.
Temos já afirmado muitas vezes que toda a civilização ocidental depende da guerra. Dentro do seu mecanismo econômico, científico, industrial e político, a guerra é indispensável. As armas representam sua vitalidade essencial. Todavia é necessário que essa situação se transforme, levando-se às almas algo de esclarecimentos espirituais.
O capitalismo que esquece a agricultura, a indústria, a coletividade para financiar os movimentos destruidores e fratricidas deve ser, sumariamente, condenado.
Ainda agora vemos um exemplo frisante e acabrunhador. Depois de sustentar, com seus vastos capitais, financiando e mantendo os movimentos revolucionários dirigidos pelo General Franco, o capitalista espanhol Juan March repousa tranquilo em Paris, longe do cenário horrível onde, até agora, já se trucidaram algumas centenas de milhares de vidas.
A civilização do Ocidente, apesar de todos os seus monumentos grandiosos, está armando, com a pletora de suas riquezas, o catafalco de suas conquistas.
Não bastaram os sacrifícios de quantos se entregaram, no pretérito, em holocausto à ciência, à política e à religião. A ciência, com honrosas exceções, acastelou-se nas suas concepções transitórias, fechando-se no dogmatismo acadêmico, a política tornou-se um vasto centro de interesses pessoais, onde preponderam os direitos da força, e a religião transformou-se em elemento de conservação de dogmas absurdos, quando não representa para os seus expositores uma indústria de rendas comuns. Dentro do aviltamento dessas forças que, conjugadas, deveriam orientar a evolução coletiva, reconheceis a falência de todas as vossas atividades no sentido de se organizar e construir.
Será agora, depois dos choques próximos das ideologias que envenenaram as fontes de vossa cultura social e política, que os homens terão de voltar os olhos para o microcosmo da Galileia.
O Direito Romano, os princípios liberais da Revolução Francesa, os novos sistemas coletivistas que, atualmente, pondes em prática, têm de passar, futuramente, através da retorta do Evangelho de Jesus para se refundirem, objetivando-se, assim, o vosso progresso comum. Até lá, porém, assistireis a muitas dores. Os homens terão de conhecer o caminho com as suas experiências pessoais, valorizando as suas iniciativas.
Confiamos nas concepções da América, cheia de luz e de liberdade, e observando-se o fenômeno evangélico que vai sendo, lentamente, embora maravilhosamente interpretado por algumas das coletividades brasileiras, concluímos pela grandeza da missão do Brasil como preparador e realizador da política do futuro, política cristã, sobretudo. E que todos nós, desencarnados e encarnados, possamos nos unir, dentro da mesma vibração construtora da fé, laborando ativamente para que a terra brasileira seja o paradigma dos povos no concerto de todas as nacionalidades do mundo.
Reformador — Novembro de 1976.
Segundo consta do original, a mensagem foi psicografada em 13/11/1936.
Em referência à guerra de 1914-1918.
Consta do original a seguinte observação acerca das notas explicativas: “(…) desejamos, à guisa de esclarecimento, aditar o seguinte: a mensagem que ora publicamos, como se vê pela data (13/11/1936), recebeu-a o médium Francisco Cândido Xavier então domiciliado em Pedro Leopoldo (MG), há precisamente quarenta anos. Encontramo-la por um desses chamados “acasos”', entre velhos papéis do arquivo febiano [da FEB]. Ela, porém, sobre ser antiga não é velha, visto que os seus apelos à união, ao trabalho pelo Evangelho, a par de sadias advertências, se encaixam em contexto de orientação doutrinária de inegável atualidade. O diagnóstico dos males do nosso mundo, suas causas e implicações, foi perfeito; seu objetivo, o que prognosticou com destaque em alguns pontos, e, de maneira implícita nos demais, não o foi menos, já que as dolorosas experiências dos últimos quatro decênios são registros indeléveis da história, testificando que a civilização terreal, qual sucede até o presente, não levara a sério os ensinamentos de Jesus, o Cordeiro de Deus. (A Redação)”.
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