Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1862
Versão para cópiaCapítulo XVIII
Fevereiro - Meditações filosóficas e religiosas - Ditadas pelo Espírito de Lamennais (Sociedade espírita de Paris - Médium: Sra. A Didier)
Fevereiro
A CRUZ
Em meio às revoluções humanas, em meio a todos os distúrbios, a todos os desencadeamentos do pensamento, eleva-se uma cruz alta e simples, fixada num altar de pedra. Um menino esculpido na pedra tem nas mãos uma bandeirola, sobre a qual se lê uma palavra: Simplicitas. Filantropos, filósofos, deístas e poetas, vinde ler e contemplar esta palavra. Ela é todo o Evangelho, toda a explicação do Cristianismo.
Filantropos, não inventeis a filantropia, pois só existe a caridade. Filósofos, não inventeis uma sabedoria, pois só existe uma. Deístas, não inventeis um Deus, porque só existe um. Poetas, não perturbeis o coração do homem.
Filantropos, quereis quebrar as cadeias materiais que mantêm cativa a Humanidade; filósofos, elevais panteões; poetas, idealizais o fanatismo. Para trás! Sois deste mundo, e o Cristo disse: “Meu reino não é deste mundo.”
Oh! Sois demasiadamente deste mundo de lama para compreenderdes essas sublimes palavras. E se algum juiz suficientemente poderoso vos pudesse perguntar:
─ Sois filhos de Deus? ─ vossa vontade morreria no fundo da garganta e não poderíeis responder como o Cristo em face da Humanidade:
─ Vós o dissestes.
─ Vós todos sois deuses ─ disse o Cristo, quando a língua de fogo desce sobre as vossas cabeças e penetra os vossos corações; vós todos sois deuses, quando percorreis a Terra em nome da Caridade, mas sois filhos do mundo quando contemplais os sofrimentos atuais da Humanidade e não pensais em seu futuro divino.
Homem! Que aquela palavra seja lida por teu coração e não por teus olhos de carne. O Cristo não erigiu um panteão. Ele ergueu uma cruz!
Filantropos, não inventeis a filantropia, pois só existe a caridade. Filósofos, não inventeis uma sabedoria, pois só existe uma. Deístas, não inventeis um Deus, porque só existe um. Poetas, não perturbeis o coração do homem.
Filantropos, quereis quebrar as cadeias materiais que mantêm cativa a Humanidade; filósofos, elevais panteões; poetas, idealizais o fanatismo. Para trás! Sois deste mundo, e o Cristo disse: “Meu reino não é deste mundo.”
Oh! Sois demasiadamente deste mundo de lama para compreenderdes essas sublimes palavras. E se algum juiz suficientemente poderoso vos pudesse perguntar:
─ Sois filhos de Deus? ─ vossa vontade morreria no fundo da garganta e não poderíeis responder como o Cristo em face da Humanidade:
─ Vós o dissestes.
─ Vós todos sois deuses ─ disse o Cristo, quando a língua de fogo desce sobre as vossas cabeças e penetra os vossos corações; vós todos sois deuses, quando percorreis a Terra em nome da Caridade, mas sois filhos do mundo quando contemplais os sofrimentos atuais da Humanidade e não pensais em seu futuro divino.
Homem! Que aquela palavra seja lida por teu coração e não por teus olhos de carne. O Cristo não erigiu um panteão. Ele ergueu uma cruz!
BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO
As várias ações meritórias para o Espírito após a morte são, principalmente, as do coração, mais que as da inteligência. Bem-aventurados os pobres de Espírito não quer dizer bem-aventurados apenas os imbecis, mas bem-aventurados também aqueles que, cumulados de dons intelectuais, não os empregaram para o mal, porque são uma arma muito poderosa para arrastar as massas.
Contudo, como dizia Gérard de Nerval ultimamente[1], a inteligência desconhecida na Terra terá um grande mérito perante Deus. Com efeito, o homem de inteligência poderosa, lutando contra todas as circunstâncias infelizes que vêm assaltá-lo, deve regozijar-se com estas palavras: “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros”. Isso não se deve entender unicamente na ordem material, mas também nas manifestações do Espírito e nas obras da inteligência humana. As qualidades de coração são meritórias, porque as circunstâncias que as podem impedir são muito pequenas, muito raras e muito fúteis. A caridade deve brilhar por toda parte, apesar de tudo e para todos, como brilha o Sol para todo o mundo. O homem pode impedir a inteligência do seu próximo de se manifestar, mas nada pode sobre o coração. As lutas contra a adversidade, as angústias da dor, podem paralisar os impulsos do gênio, mas não podem parar os da caridade.
Contudo, como dizia Gérard de Nerval ultimamente[1], a inteligência desconhecida na Terra terá um grande mérito perante Deus. Com efeito, o homem de inteligência poderosa, lutando contra todas as circunstâncias infelizes que vêm assaltá-lo, deve regozijar-se com estas palavras: “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros”. Isso não se deve entender unicamente na ordem material, mas também nas manifestações do Espírito e nas obras da inteligência humana. As qualidades de coração são meritórias, porque as circunstâncias que as podem impedir são muito pequenas, muito raras e muito fúteis. A caridade deve brilhar por toda parte, apesar de tudo e para todos, como brilha o Sol para todo o mundo. O homem pode impedir a inteligência do seu próximo de se manifestar, mas nada pode sobre o coração. As lutas contra a adversidade, as angústias da dor, podem paralisar os impulsos do gênio, mas não podem parar os da caridade.
A ESCRAVIDÃO
Escravidão! Quando se pronuncia este nome, o coração sente frio, porque vê à sua frente o egoísmo e o orgulho. Quando um padre vos fala de escravidão, refere-se a esta escravidão da alma, que rebaixa o Espírito do homem e o faz esquecer a sua consciência, isto é, a sua liberdade. Oh! sim, essa escravidão da alma é horrível e diariamente excita a eloquência de muitos pregadores. Mas a escravidão do hilota, a escravidão do negro, que se torna aos seus olhos? Diante dessa questão o sacerdote mostra a cruz e diz: “Esperai!”. Com efeito, para esses infelizes é a consolação a oferecer; e ela lhes diz: “Quando vosso corpo for dilacerado pelo chicote e morrerdes de sofrimento, não penseis mais na Terra. Pensai no Céu.”
Tocamos aqui uma das questões mais graves e terríveis que agitam a alma humana e a lançam na incerteza. Está o negro à altura dos povos da Europa e a prudência humana, ou antes, a justiça humana deve mostrar-lhe a emancipação como o meio mais seguro de chegar ao progresso da civilização? Nessa questão os filantropos mostram o Evangelho e dizem: “Jesus falou de escravos?” Não, mas Jesus falou da resignação e disse estas sublimes palavras: “Meu reino não é deste mundo”.
John Brown, quando eu contemplo teu cadáver na forca, sinto-me tomado de profunda piedade e de admiração entusiasta, mas a razão, essa brutal razão que incessantemente nos arrasta ao porquê, nos leva a nos perguntarmos a nós mesmos: “Que teríeis feito após a vitória?”.
ALLAN KARDEC
Tocamos aqui uma das questões mais graves e terríveis que agitam a alma humana e a lançam na incerteza. Está o negro à altura dos povos da Europa e a prudência humana, ou antes, a justiça humana deve mostrar-lhe a emancipação como o meio mais seguro de chegar ao progresso da civilização? Nessa questão os filantropos mostram o Evangelho e dizem: “Jesus falou de escravos?” Não, mas Jesus falou da resignação e disse estas sublimes palavras: “Meu reino não é deste mundo”.
John Brown, quando eu contemplo teu cadáver na forca, sinto-me tomado de profunda piedade e de admiração entusiasta, mas a razão, essa brutal razão que incessantemente nos arrasta ao porquê, nos leva a nos perguntarmos a nós mesmos: “Que teríeis feito após a vitória?”.
ALLAN KARDEC