O Livro dos médiuns
Versão para cópiaCapítulo IV

SISTEMAS
1ª Parte • NOÇÕES PRELIMINARES • [Sistemas de negação]
Temas Relacionados:
38. — Sistema do charlatanismo. Entre os antagonistas do Espiritismo, muitos atribuem aqueles efeitos ao embuste, pela razão de que alguns puderam ser imitados. Segundo tal suposição, todos os espíritas seriam indivíduos embaídos e todos os médiuns seriam embaidores, de nada valendo a posição, o caráter, o saber e a honradez das pessoas. Se isto merecesse resposta, diríamos que alguns fenômenos da Física também são imitados pelos prestidigitadores, o que nada prova contra a verdadeira ciência. Demais, pessoas há cujo caráter afasta toda suspeita de fraude e preciso é não saber absolutamente viver e carecer de toda urbanidade, para que alguém ouse vir dizer-lhe na face que são cúmplices de charlatanismo. Num salão muito respeitável, um senhor, que se dizia bem educado, tendo-se permitido fazer uma reflexão dessa natureza, ouviu da dona da casa o seguinte: “Senhor, pois que não estais satisfeito, à porta vos será restituído o que pagastes.” E, com um gesto, lhe indicou o que de melhor tinha a fazer. [que era o retirar-se do recinto, posto que ali não era uma casa de espetáculo onde se paga para entrar; a dona da casa que emprestava o salão para reuniões espíritas, indignada com a atitude daquele senhor, pediu que se retirasse.] Dever-se-á por isso afirmar que nunca houve abuso? Para crê-lo, fora mister admitir-se que os homens são perfeitos. De tudo se abusa, até das coisas mais santas. Por que não abusariam do Espiritismo? Porém, o mau uso que de uma coisa se faça não autoriza que ela seja prejulgada desfavoravelmente. Para chegar-se à verificação, que se pode obter, da boa-fé com que obram as pessoas, deve-se atender aos motivos que lhes determinam o procedimento. O charlatanismo não tem cabimento onde não há especulação.39. — Sistema da loucura. Alguns, por condescendência, concordam em por de lado a suspeita de embuste. Pretendem então que os que não iludem são iludidos, o que equivale a qualificá-los de imbecis. Quando os incrédulos se abstém de usar de circunlóquios, declaram, pura e simplesmente, que os que creem são loucos, atribuindo-se a si mesmos, desse modo e sem cerimônias, o privilégio do bom-senso. Esse o argumento formidável dos que nenhuma razão plausível encontram para apresentar. Afinal, semelhante maneira de atacar se tornou ridícula, tal a sua banalidade, e não merece que se perca tempo em refutá-la. Acresce que os espíritas não se alteram com isso; tomam corajosamente o seu partido e se consolam, lembrando-se de que têm por companheiros de infortúnio muitas pessoas de mérito incontestável. Efetivamente, forçoso será convir em que essa loucura, se loucura existe, apresenta uma característica muito singular — a de atingir de preferência a classe instruída, em cujo seio conta o Espiritismo, até ao presente, a imensa maioria de seus adeptos. Se entre estes algumas excentricidades se manifestam, elas nada provam contra a Doutrina, do mesmo modo que os loucos religiosos nada provam contra a religião, nem os loucos melômanos contra a música, ou os loucos matemáticos contra a matemática. Todas as ideias sempre tiveram fanáticos exagerados e é preciso se seja dotado de muito obtuso juízo, para confundir a exageração de uma coisa com a coisa mesma. Para mais amplas explicações a este respeito, recomendamos ao leitor a nossa brochura: O que é o Espiritismo e O Livro dos Espíritos (Introdução, § XV).40. — Sistema da alucinação. Outra opinião, menos ofensiva essa, por trazer um ligeiro colorido científico, consiste em levar os fenômenos à conta de ilusão dos sentidos. Assim, o observador estaria de muito boa-fé; apenas, julgaria ver o que não vê. Quando diz que viu uma mesa levantar-se e manter-se no ar, sem ponto de apoio, a verdade é que a mesa não se mexeu. Ele a viu no ar, por efeito de uma espécie de miragem, ou por uma refração, qual a que nos faz ver, na água, um astro, ou um objeto qualquer, fora da sua posição real. Isto, a rigor, seria possível; mas, os que já testemunharam fenômenos espíritas hão podido certificar-se do isolamento da mesa suspensa, passando por debaixo dela, o que parece difícil de se conseguir, caso o móvel não se houvesse despregado do solo. Por outro lado, muitas vezes tem sucedido quebrar-se a mesa ao cair. Dar-se-á que também aí nada mais haja do que simples efeito de ótica? É fora de dúvida que uma causa fisiológica bem conhecida pode fazer que uma pessoa julgue ver em movimento um objeto que não se moveu, ou que suponha estar ela própria a mover-se, quando permanece imóvel. Mas, quando, rodeando uma mesa, muitas pessoas a veem arrastada por um movimento tão rápido que difícil se lhes torna acompanhá-la, ou que mesmo deita algumas delas ao chão, poder-se-á dizer que todas se acham tomadas de vertigem, como o bêbedo, que acredita estar vendo a casa em que mora passar-lhe por diante dos olhos?41. — Sistema do músculo estalante. Sendo assim, pelo que toca à visão, de outro modo não poderia ser, pelo que concerne à audição. Quando as pancadas são ouvidas por todas as pessoas reunidas em determinado lugar, não há como atribuí-las razoavelmente a uma ilusão. Pomos de parte, está claro, toda ideia de fraude e supomos que uma atenta observação tenha verificado não serem as pancadas atribuíveis a qualquer causa fortuita ou material. É certo que um sábio médico deu desse fenômeno uma explicação, ao seu parecer, peremptória. “A causa, disse ele, reside nas contrações voluntárias, ou involuntárias, do tendão do músculo curto-perônio.” A este propósito, desce às mais completas minúcias anatômicas, para demonstrar por que mecanismo pode esse tendão produzir os ruídos de que se trata, imitar os ruídos do tambor e, até, executar árias ritmadas. Conclui daí que os que julgam ouvir pancadas numa mesa são vítimas de uma mistificação, ou de uma ilusão. O fato, em si mesmo, não é novo. Infelizmente para o autor dessa pretendida descoberta, sua teoria é incapaz de explicar todos os casos. Digamos, antes de tudo, que os que gozam da estranha faculdade de fazer que o seu músculo curto-perônio, ou qualquer outro, estale à vontade, da de executar árias por esse meio, são indivíduos excepcionais, enquanto que muito comum é a de fazer-se que uma mesa dê pancadas e que nem todos, dado que algum exista, dos que gozam desta última faculdade, possuem a primeira. Em segundo lugar, o sábio doutor esqueceu de explicar como o estalido muscular de uma pessoa imóvel e afastada da mesa pode produzir nesta vibrações sensíveis a quem a toque; como pode esse ruído repercutir, à vontade dos assistentes, nas diferentes partes da mesa, nos outros móveis, nas paredes, no forro, etc.; como, finalmente, a ação daquele músculo pode atingir uma mesa em que ninguém toca e faze-la mover-se. Em suma, a explicação a que nos reportamos, se de fato o fosse, apenas infirmaria o fenômeno das pancadas, nada adiantando com relação a qualquer dos outros muitos modos de comunicação. Reconheçamos, pois, que ele julgou sem ter visto, ou sem ter observado tudo e observado bem. É sempre de lamentar que homens de ciência se afoitem a dar, do que não conhecem, explicações que os fatos podem desmentir. O próprio saber que possuem devera torná-los tanto mais circunspectos em seus juízos, quanto é certo que esse saber afasta deles os limites do desconhecido.42. — Sistema das causas físicas. Aqui, estamos fora do sistema da negação absoluta. Averiguada a realidade dos fenômenos, a primeira ideia que naturalmente acudiu ao espírito dos que os verificaram foi a de atribuir os movimentos ao magnetismo, à eletricidade, ou à ação de um fluido qualquer; numa palavra, a uma causa inteiramente física e material. Nada apresentava de irracional esta opinião e teria prevalecido, se o fenômeno houvera ficado adstrito a efeitos puramente mecânicos. Uma circunstância parecia mesmo corroborá-la: a do aumento que, em certos casos, experimentava a força atuante, na razão direta do número das pessoas presentes. Assim, cada uma destas podia ser considerada como um dos elementos de uma pilha elétrica humana. Já dissemos que o que caracteriza uma teoria verdadeira é poder dar a razão de tudo. Se, porém, um só fato que seja a contradiz, é que ela é falsa, incompleta, ou por demais absoluta. Ora, foi o que não tardou a reconhecer-se, quanto a esta. Os movimentos e as pancadas deram sinais inteligentes, obedecendo à vontade e respondendo ao pensamento. Haviam, pois, de originar-se de uma causa inteligente. Desde que o efeito deixava de ser puramente físico, outra, por isso mesmo, tinha que ser a causa. Tanto assim, que o sistema da ação exclusiva de um agente material foi abandonado, para só ser esposado ainda pelos que julgam a priori, sem haver visto coisa alguma. O ponto capital, portanto, está em verificar-se a ação inteligente, de cuja realidade se pode convencer quem quiser dar-se ao trabalho de observar.43. — Sistema do reflexo. Reconhecida a ação inteligente, restava saber donde provinha essa inteligência. Julgou-se que bem podia ser a do médium, ou a dos assistentes, a se refletirem, como a luz ou os raios sonoros. Era possível: só a experiência poderia dizer a última palavra. Mas, notemos, antes de tudo, que este sistema já se afasta por completo da ideia puramente materialista. Para que a inteligência dos assistentes pudesse reproduzir-se por via indireta, preciso era se admitisse existir no homem um princípio exterior do organismo. Se o pensamento externado fora sempre o dos assistentes, a teoria da reflexão estaria confirmada. Mas, embora reduzido a estas proporções, já não seria do mais alto interesse o fenômeno? Já não seria coisa bastante notável o pensamento a repercutir num corpo inerte e a se traduzir pelo movimento e pelo ruído? Já não haveria aí o que excitasse a curiosidade dos sábios? Por que então a desprezaram eles, que se afadigam na pesquisa de uma fibra nervosa? Só a experiência, dizemos, podia confirmar ou condenar essa teoria, e a experiência a condenou, porquanto demonstra a todos os momentos, e com os mais positivos fatos, que o pensamento expresso, não somente pode ser estranho ao dos assistentes, mas que lhes é, muitas vezes, contrário; que contradiz todas as ideias preconcebidas e frustra todas as previsões. Com efeito, difícil me é acreditar que a resposta provenha de mim mesmo, quando, a pensar no branco, se me fala em preto. Em apoio da teoria que apreciamos, costumam invocar certos casos em que são idênticos o pensamento manifestado e o dos assistentes. Mas, que prova isso, senão que estes podem pensar como a inteligência que se comunica? Não há por que pretender-se que as duas opiniões devam ser sempre opostas. Quando, no curso de uma conversação, o vosso interlocutor emite um pensamento análogo ao que vos está na mente, direis, por isso, que de vós mesmos vem o seu pensamento? Bastam alguns exemplos em contrário, bem comprovados, para que positivado fique não ser absoluta esta teoria. Como explicar, pela reflexão do pensamento, as escritas feitas por pessoas que não sabem escrever; as respostas do mais alto alcance filosófico, obtidas por indivíduos iletrados; as respostas dadas a perguntas mentais, ou em língua que o médium desconhece e mil outros fatos que não permitem dúvida sobre a independência da inteligência que se manifesta? A opinião oposta não pode deixar de resultar de falta de observação. Provada, como está, moralmente, pela natureza das respostas, a presença de uma inteligência diversa da do médium e da dos assistentes, provada também o está, materialmente, pelo fato da escrita direta, isto é, da escrita obtida espontaneamente, sem lápis, nem pena, sem contato e, mau grado a todas as precauções tomadas contra qualquer subterfúgio. O caráter inteligente do fenômeno não pode ser posto em dúvida: logo, há nele mais alguma coisa do que uma ação fluídica. Depois, a espontaneidade do pensamento expresso contra toda expectativa e sem que alguma questão tenha sido formulada, não consente se veja nele um reflexo do pensamento dos assistentes. Em alguns casos, o sistema do reflexo é bastante descortês. Quando, numa reunião de pessoas honestas, surge inopinadamente uma dessas comunicações de revoltante grosseria, fora desatencioso, para com os assistentes, pretender-se que ela haja provindo de um deles, sendo provável que cada um se daria pressa em repudiá-la. (Vede O Livro dos Espíritos 1ntrodução, § XVI.)
1ª Parte • NOÇÕES PRELIMINARES • [Sistemas de afirmação]
Temas Relacionados:
44. — Sistema da alma coletiva. Constitui uma variante do precedente. Segundo este sistema, apenas a alma do médium se manifesta, porém, identificada com a de muitos outros vivos, presentes ou ausentes, e formando um todo coletivo, em que se achará reunidas as aptidões, a inteligência e os conhecimentos de cada um. Conquanto se intitule A Luz, a brochura onde esta teoria vem exposta, muito obscura se nos afigura o seu estilo. Confessamos não ter logrado compreendê-la e dela falamos unicamente de memória. É, em suma, como tantas outras, uma opinião individual, que conta poucos prosélitos. Pelo nome de Emah Tirpsé, o autor designa o ser coletivo criado pela sua imaginação. Por epígrafe, tomou a seguinte sentença: Nada há oculto que não deva ser conhecido. Esta proposição é evidentemente falsa, porquanto uma imensidade há de coisas que o homem não pode e não tem que saber. Bem presunçoso seria aquele que pretendesse devassar todos os segredos de Deus.45. — Sistema sonambúlico. Mais adeptos teve este, que ainda conta alguns. Admite, como o anterior, que todas as comunicações inteligentes provêm da alma ou Espírito do médium. Mas, para explicar o fato de o médium tratar de assuntos que estão fora do âmbito de seus conhecimentos, em vez de supor a existência, nele, de uma alma múltipla, atribui essa aptidão a uma sobreexcitação momentânea de suas faculdades mentais, a uma espécie de estado sonambúlico, ou extático, que lhe exalta e desenvolve a inteligência. Não há negar, em certos casos, a influência desta causa. Porém, a quem tenha observado como opera a maioria dos médiuns, essa observação basta para lhe tornar evidente que aquela causa não explica todos os fatos, que ela constitui exceção e não regra. Poder-se-ia acreditar que fosse assim, se o médium tivesse sempre ar de inspirado ou de extático, aspecto que, aliás, lhe seria fácil aparentar perfeitamente, se quisesse representar uma comédia. Como, porém, se há de crer na inspiração, quando o médium escreve como uma máquina, sem ter a mínima consciência do que está obtendo, sem a menor emoção, sem se ocupar com o que faz, distraído, rindo e conversando de uma coisa e de outra? Concebe-se a sobre-excitação das ideias, mas não se compreende possa fazer que uma pessoa escreva sem saber escrever e, ainda menos, quando as comunicações são transmitidas por pancadas, ou com o auxílio de uma prancheta, de uma cesta. No curso desta obra, teremos ocasião de mostrar a parte que se deve atribuir à influência das ideias do médium.[Cap.XX.] Todavia, tão numerosos e evidentes são os fatos em que a inteligência estranha se revela por meio de sinais incontestáveis, que não pode haver dúvida a respeito. O erro da maior parte dos sistemas, que surgiram nos primeiros tempos do Espiritismo, está em haverem deduzido, de fatos insulados, conclusões gerais.46. — Sistema pessimista, diabólico ou demoníaco. Entramos aqui numa outra ordem de ideias. Comprovada a intervenção de uma inteligência estranha, tratava-se de saber de que natureza era essa inteligência. Sem dúvida que o meio mais simples consistia em lhe perguntar isso. Algumas pessoas, contudo, entenderam que esse processo não oferecia garantias bastantes e assentaram de ver em todas as manifestações, unicamente, uma obra diabólica. Segundo essas pessoas, só o diabo, ou os demônios, podem comunicar-se. Conquanto fraco eco encontre hoje este sistema, é inegável que gozou, por algum tempo, de certo crédito, devido mesmo ao caráter dos que tentaram fazer que ele prevalecesse. Faremos, entretanto notar que os partidários do sistema demoníaco não devem ser classificados entre os adversários do Espiritismo: ao contrário. Sejam demônios ou anjos, os seres que se comunicam são sempre seres incorpóreos. Ora, admitir a manifestação dos demônios é admitir a possibilidade da comunicação do mundo visível com o mundo invisível, ou, pelo menos, com uma parte deste último. Compreende-se que a crença na comunicação exclusiva dos demônios, por muito irracional que seja, não houvesse parecido impossível, quando se consideravam os Espíritos como seres criados fora da humanidade. Mas, desde que se sabe que os Espíritos são simplesmente as almas dos que hão vivido, ela perdeu todo o seu prestígio e pode-se dizer que toda a verossimilhança, porquanto, admitida, o que se seguiria é que todas essas almas eram demônios, embora fossem as de um pai, de um filho, ou de um amigo e que nós mesmos, morrendo, nos tornaríamos demônios, doutrina pouco lisonjeira e nada consoladora para muita gente. Bem difícil será persuadir a uma mãe de que o filho querido, que ela perdeu e que lhe vem dar, depois da morte, provas de sua afeição e de sua identidade, é um suposto satanás. Sem dúvida, entre os Espíritos, há-os muito maus e que não valem mais do que os chamados demônios, por uma razão bem simples: a de que há homens muito maus que, pelo fato de morrerem, não se tornam bons. A questão está em saber se só eles podem comunicar-se conosco. Aos que assim pensem, dirigimos as seguintes perguntas:1ª Há ou não Espíritos bons e maus?2ª Deus é ou não mais poderoso do que os maus Espíritos, ou do que os demônios, se assim lhes quiserdes chamar?3ª Afirmar que só os maus se comunicam é dizer que os bons não o podem fazer. Sendo assim, uma de duas: ou isto se dá pela vontade, ou contra a vontade de Deus. Se contra a Sua vontade, é que os maus Espíritos podem mais do que Ele; se, por vontade Sua, por que, em Sua bondade, não permitiria Ele que os bons fizessem o mesmo, para contrabalançar a influência dos outros?4ª Que prova podeis apresentar da impossibilidade em que estão os bons Espíritos de se comunicarem?5ª Quando se vos opõe a sabedoria de certas comunicações, respondeis que o demônio usa de todas as máscaras para melhor seduzir. Sabemos, com efeito, haver Espíritos hipócritas, que dão à sua linguagem um verniz de sabedoria; mas, admitis que a ignorância pode falsificar o verdadeiro saber e uma natureza má imitar a verdadeira virtude, sem deixar vestígio que denuncie a fraude?6ª Se só o demônio se comunica, sendo ele o inimigo de Deus e dos homens, por que recomenda que se ore a Deus, que nos submetamos à vontade de Deus, que suportemos sem queixas as tribulações da vida, que não ambicionemos as honras, nem as riquezas, que pratiquemos a caridade e todas as máximas do Cristo, numa palavra: que façamos tudo o que é preciso para lhe destruir o império, dele, demônio? Se tais conselhos o demônio é quem os dá, forçoso será convir em que, por muito manhoso que seja, bastante inábil é ele, fornecendo armas contra si mesmo.7ª Pois que os Espíritos se comunicam, é que Deus o permite. Em presença das boas e das más comunicações, não será mais lógico admitir-se que umas Deus as permite para nos experimentar e as outras para nos aconselhar ao bem?8ª Que direis de um pai que deixasse o filho à mercê dos exemplos e dos conselhos perniciosos, e que o afastasse de si; que o privasse do contato com as pessoas que o pudessem desviar do mal? Ser-nos-á lícito supor que Deus procede como um bom pai não procederia, e que, sendo ele a bondade por excelência, faça menos do que faria um homem?9ª A Igreja reconhece como autênticas certas manifestações da Virgem e de outros santos, em aparições, visões, comunicações orais, etc. Essa crença não está em contradição com a doutrina da comunicação exclusiva dos demônios? Acreditamos que algumas pessoas hajam professado de boa-fé essa teoria; mas, também cremos que muitas a adotaram unicamente com o fito de fazer que outras fugissem de ocupar-se com tais coisas, pelo temor das comunicações más, a cujo recebimento todos estão sujeitos. Dizendo que só o diabo se manifesta, quiseram aterrorizar, quase como se faz com uma criança a quem se diz: não toques nisto, porque queima. A intenção pode ter sido louvável; porém, o objetivo falhou, porquanto a só proibição basta para excitar a curiosidade e bem poucos são aqueles a quem o medo do diabo tolhe a iniciativa. Todos querem vê-lo, quando mais não seja para saber como é feito e muito espantados ficam por não o acharem tão feio como o imaginavam. E não se poderia achar também outro motivo para essa teoria exclusiva do diabo? Gente há, para quem todos os que não lhe são do mesmo parecer estão em erro. Ora, os que pretendem que todas as comunicações provêm do demônio não serão a isso induzidos pelo receio de que os Espíritos não estejam de acordo com eles sobre todos os pontos, mais ainda sobre os que se referem aos interesses deste mundo, do que sobre os que concernem aos do outro? Não podendo negar os fatos, entenderam de apresentá-los sob forma apavorante. Esse meio, entretanto, não produziu melhor resultado do que os outros. Onde o temor do ridículo se mostre impotente, forçoso é se deixem passar as coisas. O muçulmano, que ouvisse um Espírito falar contra certas leis do Alcorão, certamente acreditaria tratar-se de um mau Espírito. O mesmo se daria com um judeu, pelo que toca a certas práticas da lei de Moisés. Quanto aos católicos, de um ouvimos que o Espírito que se comunica não podia deixar de ser o diabo, porque se permitira a liberdade de pensar de modo diverso do dele, acerca do poder temporal, se bem que, em suma, o Espírito não houvesse pregado senão a caridade, a tolerância, o amor do próximo e a abnegação das coisas deste mundo, preceitos todos ensinados pelo Cristo. Não sendo os Espíritos mais do que as almas dos homens e não sendo estes perfeitos, o que se segue é que há Espíritos igualmente imperfeitos, cujos caracteres se refletem nas suas comunicações. É fato incontestável haver, entre eles, maus, astuciosos, profundamente hipócritas, contra os quais preciso se faz que estejamos em guarda. Mas, porque se encontram no mundo homens perversos, é isto motivo para nos afastarmos de toda a sociedade? Deus nos outorgou a razão e o discernimento para apreciarmos, assim os Espíritos, como os homens. O melhor meio de se obviar aos inconvenientes da prática do Espiritismo não consiste em proibi-la, mas em faze-lo compreendido. Um receio imaginário apenas por um instante impressiona e não atinge a todos. A realidade claramente demonstrada, todos a compreendem.47. — Sistema otimista. Ao lado dos que nestes fenômenos unicamente veem a ação do demônio, estão outros que tão somente hão visto a dos bons Espíritos. Supuseram que, estando liberta da matéria a alma, nenhum véu mais lhe encobre coisa alguma, devendo ela, portanto, possuir a ciência e a sabedoria supremas. A confiança cega, nessa superioridade absoluta dos seres do mundo invisível, tem sido, para muitos, a causa de não poucas decepções. Esses aprenderão à sua custa a desconfiar de certos Espíritos, quanto de certos homens.48. — Sistema unispírita ou mono-espírita. Como variedade do sistema otimista, temos o que se baseia na crença de que um único Espírito se comunica com os homens, sendo esse Espírito o Cristo, que é o protetor da Terra. Diante das comunicações da mais baixa trivialidade, de revoltante grosseria, impregnadas de malevolência e de maldade, haveria profanação e impiedade em supor-se que pudessem emanar do Espírito do Bem por excelência. Se os que assim o creem nunca tivessem obtido senão comunicações inatacáveis, ainda se lhes conceberia a ilusão. A maioria deles, porém concordam em que têm recebido algumas muito ruins, o que explicam dizendo ser a prova a que o bom Espírito os sujeita, com o lhes ditar coisas absurdas. Assim, enquanto uns atribuem todas as comunicações ao diabo, que pode dizer coisas excelentes para tentar, pensam outros que só Jesus se manifesta e que pode dizer coisas detestáveis, para experimentar os homens. Entre estas duas opiniões tão opostas, quem sentenciará? O bom-senso e a experiência. Dizemos: a experiência, por ser impossível que os que professam ideias tão exclusivas tudo tenham visto e visto bem. Quando se lhes objeta com os fatos de identidade, que atestam, por meio de manifestações escritas, visuais, ou outras, a presença de parentes ou conhecidos dos circunstantes, respondem que é sempre o mesmo Espírito, o diabo, segundo aqueles, o Cristo, segundo estes, que toma todas as formas. Porém, não nos dizem por que motivo os outros Espíritos não se podem comunicar, com que fim o Espírito da Verdade nos viria enganar, apresentando-se sob falsas aparências, iludir uma pobre mãe, fazendo-lhe crer que tem ao seu lado o filho por quem derrama lágrimas. A razão se nega a admitir que o Espírito, entre todos santo, desça a representar semelhante comédia. Demais, negar a possibilidade de qualquer outra comunicação não importa em subtrair ao Espiritismo o que este tem de mais suave: a consolação dos aflitos? Digamos, pura e simplesmente, que tal sistema é irracional e não suporta exame sério.49. — Sistema multispírita ou polispírita. Todos os sistemas a que temos passado revista, sem excetuar os que se orientam no sentido de negar, fundam-se em algumas observações, porém, incompletas ou mal interpretadas. Se uma casa for vermelha de um lado e branca do outro, aquele que a houver visto apenas por um lado afirmará que ela é branca, outro declarará que é vermelha. Ambos estarão em erro e terão razão. No entanto, aquele que a tenha visto dos dois lados dirá que a casa é branca e vermelha e só ele estará com a verdade. O mesmo sucede com a opinião que se forme do Espiritismo: pode ser verdadeira, a certos respeitos, e falsa, se generalizarem aquilo que é parcial, tomando como regra o que constitui exceção, como o todo o que é apenas a parte. Por isso dizemos que quem deseje estudar esta ciência deve observar muito e durante muito tempo. Só o tempo lhe permitirá apreender os pormenores, notar os matizes delicados, observar uma imensidade de fatos característicos, que lhe serão outros tantos raios de luz. Se, porém, se detiver na superfície, expõe-se a formular juízo prematuro e, conseguintemente, errôneo. Eis aqui as consequências gerais deduzidas de uma observação completa e que agora formam a crença, pode-se dizer, da universalidade dos espíritas, visto que os sistemas restritivos não passam de opiniões insuladas: — 1.° Os fenômenos espíritas são produzidos por inteligências extracorpóreas, às quais também se dá o nome de Espíritos;2.° Os Espíritos constituem o mundo invisível; estão em toda parte; povoam infinitamente os espaços; temos muitos, de contínuo, em torno de nós, com os quais nos achamos em contato;3.° Os Espíritos reagem incessantemente sobre o mundo físico e sobre o mundo moral e são uma das potências da Natureza;4.° Os Espíritos não são seres à parte, dentro da criação, mas as almas dos que hão vivido na Terra, ou em outros mundos, e que despiram o invólucro corpóreo; donde se segue que as almas dos homens são Espíritos encarnados e que nós, morrendo, nos tornamos Espíritos;5.° Há Espíritos de todos os graus de bondade e de malícia, de saber e de ignorância;6.° Todos estão submetidos à lei do progresso e podem todos chegar à perfeição; mas, como têm livre arbítrio, lá chegam em tempo mais ou menos longo, conforme seus esforços e vontade;7.° São felizes ou infelizes, de acordo com o bem ou o mal que praticaram durante a vida e com o grau de adiantamento que alcançaram. A felicidade perfeita e sem mescla é partilha unicamente dos Espíritos que atingiram o grau supremo da perfeição;8.° Todos os Espíritos, em dadas circunstâncias, podem manifestar-se aos homens; indefinido é o número dos que podem comunicar-se;9.° Os Espíritos se comunicam por médiuns, que lhes servem de instrumentos e intérpretes;10.° Reconhecem-se a superioridade ou a inferioridade dos Espíritos pela linguagem de que usam; os bons só aconselham o bem e só dizem coisas proveitosas; tudo neles lhes atesta a elevação; os maus enganam e todas as suas palavras trazem o cunho da imperfeição e da ignorância. Os diferentes graus por que passam os Espíritos se acham indicados na Escala Espírita. (O Livro dos Espíritos, parteII, capítulo I, n.°100.) O estudo dessa classificação é indispensável para se apreciar a natureza dos Espíritos que se manifestam, assim como suas boas e más qualidades.50. — Sistema da alma material. Consiste apenas numa opinião particular sobre a natureza íntima da alma. Segundo esta opinião, a alma e o perispírito não seriam distintos uma do outro, ou, melhor, o perispírito seria a própria alma, a se depurar gradualmente por meio de transmigrações diversas, como o álcool se depura por meio de diversas destilações, ao passo que a Doutrina Espírita considera o perispírito simplesmente como o envoltório fluídico da alma, ou do Espírito. Sendo matéria o perispírito, se bem que muito etérea, a alma seria de uma natureza material mais ou menos essencial, de acordo com o grau da sua purificação. Este sistema não infirma qualquer dos princípio fundamentais da Doutrina Espírita, pois que nada altera com relação ao destino da alma; as condições de sua felicidade futura são as mesmas; formando a alma e o perispírito um todo, sob a denominação de Espírito, como o gérmen e o perisperma o formam sob a de fruto, toda a questão se reduz a considerar homogêneo o todo, em vez de considerá-lo formado de duas partes distintas. Como se vê, isto não leva a consequência alguma e de tal opinião não houvéramos falado, se não soubéssemos de pessoas inclinadas a ver uma nova escola no que não é, em definitivo, mais do que simples interpretação de palavras. Semelhante opinião, restrita, aliás, mesmo que se achasse mais generalizada, não constituiria uma cisão entre os espíritas, do mesmo modo que as duas teorias da emissão e das ondulações da luz não significam uma cisão entre os físicos. Os que se decidissem a formar grupo à parte, por uma questão assim pueril, provariam, só com isso, que ligam mais importância ao acessório do que ao principal e que se acham compelidos à desunião por Espíritos que não podem ser bons, visto que os bons Espíritos jamais insuflam a acrimônia, nem a cizânia. Daí o concitarmos todos os verdadeiros espíritas a se manterem em guarda contra tais sugestões e a não darem a certos pormenores mais importância do que merecem. O essencial é o fundo. Julgamo-nos, entretanto, na obrigação de dizer algumas palavras acerca dos fundamentos em que repousa a opinião dos que consideram distintos a alma e o perispírito. Ela se baseia no ensino dos Espíritos, que nunca divergiam esse respeito. Referimo-nos aos esclarecidos, porquanto, entre os Espíritos em geral, muitos há que não sabem mais, que sabem mesmo menos do que os homens, ao passo que a teoria contrária é de concepção humana. Não inventamos, nem imaginamos o perispírito, para explicar os fenômenos. Sua existência nos foi revelada pelos Espíritos e a experiência no-la confirmou. (O Livro dos Espíritos n.°93.) Apoia-se também no estudo das sensações dos Espíritos, (O Livro dos Espíritos, n.°257,) e, sobretudo, no fenômeno das aparições tangíveis, fenômeno que, de conformidade com a opinião que estamos apreciando, implicaria a solidificação e a desagregação das partes constitutivas da alma e, pois, a sua desorganização. Fora mister, além disso, admitir-se que esta matéria, que pode ser percebida pelos nossos sentidos, é, ela própria, o princípio inteligente, o que não nos parece mais racional do que confundir o corpo com a alma, ou a roupa com o corpo. Quanto à natureza íntima da alma, essa desconhecemo-la. Quando se diz que a alma é imaterial, deve-se entendê-lo em sentido relativo, não em sentido absoluto, por isso que a imaterialidade absoluta seria o nada. Ora, a alma, ou o Espírito, são alguma coisa. Poder-se-ia dizer que sua essência é de tal modo superior, que nenhuma analogia tem com o que chamamos matéria e que, assim, para nós, ela é imaterial. (O Livro dos Espíritos, n.°23 e n.°82.)51. Eis aqui a resposta que, sobre este assunto, deu um Espírito: “O que uns chamam perispírito não é senão o que outros chamam envoltório material fluídico. Direi de modo mais lógico, para me fazer compreendido, que esse fluido é a perfectibilidade dos sentidos, a extensão da vista e das ideias. Falo aqui dos Espíritos elevados. Quanto aos Espíritos inferiores, os fluidos terrestres ainda lhes são de todo inerentes; logo, são, como vedes, matéria. Daí os sofrimentos da fome, do frio, etc., sofrimentos que os Espíritos superiores não podem experimentar, visto que os fluidos terrestres se acham depurados em torno do pensamento, isto é, da alma. Esta, para progredir, necessita sempre de um agente; sem agente, ela nada é, para vós, ou, melhor, não a podeis conceber. O perispírito, para nós outros Espíritos errantes, é o agente por meio do qual nos comunicamos convosco, quer indiretamente, pelo vosso corpo ou pelo vosso perispírito, quer diretamente, pela vossa alma; donde, infinitas modalidades de médiuns e de comunicações. “Agora o ponto de vista científico, ou seja: a essência mesma do perispírito. Isso é outra questão. Compreendei primeiro moralmente. Resta apenas uma discussão sobre a natureza dos fluidos, coisa por ora inexplicável. A ciência ainda não sabe bastante, porém lá chegará, se quiser caminhar com o Espiritismo. O perispírito pode variar e mudar ao infinito. A alma é o pensamento: não muda de natureza. Não vades mais longe, por este lado; trata-se de um ponto que não pode ser explicado. Supondes que, como vós, também eu não perquiro? Vós pesquisais o perispírito; nós outros, agora, pesquisamos a alma. Esperai, pois.”Lamennais. Assim, Espíritos, que podemos considerar adiantados, ainda não conseguiram sondar a natureza da alma. Como poderíamos nós faze-lo? É, portanto, perder tempo querer perscrutar o princípio das coisas que, como foi dito em O Livro dos Espíritos (n.°17 e n.°49), está nos segredos de Deus. Pretender esquadrinhar, com o auxílio do Espiritismo, o que escapa à alçada da humanidade, é desviá-lo do seu verdadeiro objetivo, é fazer como a criança que quisesse saber tanto quanto o velho. Aplique o homem o Espiritismo em aperfeiçoar-se moralmente, eis o essencial. O mais não passa de curiosidade estéril e muitas vezes orgulhosa, cuja satisfação não o faria adiantar um passo. O único meio de nos adiantarmos consiste em nos tornamos melhores. Os Espíritos que ditaram o livro que lhes traz o nome demonstraram a sua sabedoria, mantendo-se, pelo que concerne ao princípio das coisas, dentro dos limites que Deus não permite sejam ultrapassados e deixando aos Espíritos sistemáticos e presunçosos a responsabilidade das teorias prematuras e errôneas, mais sedutoras do que sólidas, e que um dia virão a cair, ante a razão, como tantas outras surgidas dos cérebros humanos. Eles, ao justo, só disseram o que era preciso para que o homem compreendesse o futuro que o aguarda e para, por essa maneira, animá-lo à prática do bem. (Vede, aqui, adiante, na 2ª parte, o capítulo I: Ação dos Espíritos sobre a matéria.) [1] Foi o Sr. Jobert (de Laballe). † Para sermos justos, devemos dizer que a descoberta é devida ao Sr. Schiff. † O Sr. Jobert lhe deduziu as consequências perante a Academia de Medicina, pretendendo dar assim o golpe de morte nos Espíritos batedores. (Na Revista Espírita do mês de junho de 1859, encontrar-se-ão todos os pormenores da explicação do médico, Sr. Jobert). [2] Comunhão. A luz do fenômeno do Espírito. Mesas falantes, sonâmbulos, médiuns, milagres. Magnetismo espiritual: poder da prática da fé. Por Emah Tirpsé, uma alma coletiva que escreve por intermédio de uma prancheta. Bruxelas, 1858, casa Devroye. [3] Esta questão foi tratada em O Livro dos Espíritos (n.°128 e seguintes); mas, com relação a este assunto, como acerca de tudo o que respeita à parte religiosa, recomendamos a brochura intitulada: Carta de um católico sobre o Espiritismo, do Dr. Grand, ex-cônsul da França (à venda na livraria Ledoyen, in-18; preço 1 franco), bem como a que vamos publicar sob o título: Os contraditores do Espiritismo, do ponto de vista da religião, da ciência e do materialismo..
TEORIA DAS MANIFESTAÇÕES FÍSICAS
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [Sobre o fluido universal]
Temas Relacionados:
74. As respostas seguintes nos foram dadas pelo Espírito São Luís. Muitos outros, depois, as confirmaram:1° Será o fluido universal uma emanação da divindade?“Não.”2° Será uma criação da divindade?“Tudo é criado, exceto Deus.”3° O fluido universal será ao mesmo tempo o elemento universal?“Sim, é o princípio elementar de todas as coisas.”4° Alguma relação tem ele com o fluido elétrico, cujos efeitos conhecemos?“É o seu elemento.”5° Em que estado o fluido universal se nos apresenta, na sua maior simplicidade?“Para o encontrarmos na sua simplicidade absoluta, precisamos ascender aos Espíritos puros. No vosso mundo, ele sempre se acha mais ou menos modificado, para formar a matéria compacta que vos cerca. Entretanto, podeis dizer que o estado em que se encontra mais próximo daquela simplicidade é o do fluido a que chamais fluido magnético animal.”6° Já disseram que o fluido universal é a fonte da vida. Será ao mesmo tempo a fonte da inteligência?“Não, esse fluido apenas anima a matéria.”7° Pois que é desse fluido que se compõe o perispírito, parece que, neste, ele se acha num como estado de condensação, que o aproxima, até certo ponto, da matéria propriamente dita?“Até certo ponto, como dizes, porquanto não tem todas as propriedades da matéria. É mais ou menos condensado, conforme os mundos.”
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [Movimentos e suspensões]
Temas Relacionados:
8° Como pode um Espírito produzir o movimento de um corpo sólido?“Combinando uma parte do fluido universal com o fluido, próprio àquele efeito, que o médium emite.”9° Será com os seus próprios membros, de certo modo solidificados, que os Espíritos levantam a mesa?“Esta resposta ainda não te levará até onde desejas. Quando, sob as vossas mãos, uma mesa se move, o Espírito haure no fluido universal o que é necessário para lhe dar uma vida factícia. Assim preparada a mesa, o Espírito a atrai e move sob a influência do fluido que de si mesmo desprende, por efeito da sua vontade. Quando quer pôr em movimento uma massa por demais pesada para suas forças, chama em seu auxílio outros Espíritos, cujas condições sejam idênticas às suas. Em virtude da sua natureza etérea, o Espírito, propriamente dito, não pode atuar sobre a matéria grosseira, sem intermediário, isto é, sem o elemento que o liga à matéria. Esse elemento, que constitui o que chamais perispírito, vos faculta a chave de todos os fenômenos espíritas de ordem material. Julgo ter-me explicado muito claramente, para ser compreendido.” NOTA. Chamamos a atenção para a seguinte frase, primeira da resposta acima: Esta resposta AINDA te não levará até onde desejas. O Espírito compreendera perfeitamente que todas as questões precedentes só haviam sido formuladas para chegarmos a esta última e alude ao nosso pensamento que, com efeito, esperava por outra resposta muito diversa, isto é, pela confirmação da ideia que tínhamos sobre a maneira por que o Espírito obtém o movimento da mesa.10° Os Espíritos, que aquele que deseja mover um objeto chama em seu auxílio, são-lhe inferiores? Estão-lhe sob as ordens?“São-lhe iguais, quase sempre. Muitas vezes acodem espontaneamente.”11° São aptos, todos os Espíritos, a produzir fenômenos deste gênero?“Os que produzem efeitos desta espécie são sempre Espíritos inferiores, que ainda se não desprenderam inteiramente de toda a influência material.”12° Compreendemos que os Espíritos superiores não se ocupam com coisas que estão muito abaixo deles. Mas, perguntamos se, uma vez que estão mais desmaterializados, teriam o poder de faze-lo, dado que o quisessem?“Os Espíritos superiores têm a força moral, como os outros têm a força física. Quando precisam desta força, servem-se dos que a possuem. Já não se vos disse que eles se servem dos Espíritos inferiores, como vós vos servis dos carregadores?” NOTA. Já foi explicado que a densidade do perispírito, se assim se pode dizer, varia de acordo com o estado dos mundos. Parece que também varia, em um mesmo mundo, de indivíduo para indivíduo. Nos Espíritos moralmente adiantados, é mais sutil e se aproxima da dos Espíritos elevados; nos Espíritos inferiores, ao contrário, aproxima-se da matéria e é o que faz que os Espíritos de baixa condição conservem por muito tempo as ilusões da vida terrestre. Esses pensam e obram como se ainda fossem vivos; experimentam os mesmos desejos e quase que se poderia dizer a mesma sensualidade. Esta grosseria do perispírito, dando-lhe mais afinidade com a matéria, torna os Espíritos inferiores mais aptos às manifestações físicas. Pela mesma razão é que um homem de sociedade, habituado aos trabalhos da inteligência, franzino e delicado de corpo, não pode suspender fardos pesados, como o faz um carregador. Nele, a matéria é, de certa maneira, menos compacta, menos resistentes os órgãos; há menos fluido nervoso. Sendo o perispírito, para o Espírito, o que o corpo é para o homem e sua densidade estando em razão da inferioridade do Espírito, essa densidade substitui no Espírito a força muscular, isto é, dá-lhe, sobre os fluidos necessários às manifestações, um poder maior do que o de que dispõem aqueles cuja natureza é mais etérea. Querendo um Espírito elevado produzir tais efeitos, faz o que entre nós fazem as pessoas delicadas: chama para executá-los um Espírito do ofício.13° Se compreendemos bem o que disseste, o princípio vital reside no fluido universal; o Espírito tira deste fluido o envoltório semimaterial que constitui o seu perispírito e é ainda por meio deste fluido que ele atua sobre a matéria inerte. É assim?“É. Quer dizer: ele empresta à matéria uma espécie de vida factícia; a matéria se anima da vida animal. A mesa, que se move debaixo das vossas mãos, vive como animal; obedece por si mesma ao ser inteligente. Não é este quem a impele, como faz o homem com um fardo. Quando ela se eleva, não é o Espírito quem a levanta, com o esforço do seu braço: é a própria mesa que, animada, obedece à impulsão que lhe dá o Espírito.”14° Que papel desempenha o médium nesse fenômeno?“Já eu disse que o fluido próprio do médium se combina com o fluido universal que o Espírito acumula. É necessária a união desses dois fluidos, isto é, do fluido animalizado e do fluido universal para dar vida à mesa. Mas, nota bem que essa vida é apenas momentânea, que se extingue com a ação e, às vezes, antes que esta termine, logo que a quantidade de fluido deixa de ser bastante para a animar.”15° Pode o Espírito atuar sem o concurso de um médium?“Pode atuar à revelia do médium. Quer isto dizer que muitas pessoas, sem que o suspeitem, servem de auxiliares aos Espíritos. Delas haurem os Espíritos, como de uma fonte, o fluido animalizado de que necessitem. Assim é que o concurso de um médium, tal como o entendeis, nem sempre é preciso, o que se verifica principalmente nos fenômenos espontâneos.”16° Animada, atua a mesa com inteligência? Pensa?“Pensa tanto quanto a bengala com que fazes um sinal inteligente. Mas, a vitalidade de que se acha animada lhe permite obedecer à impulsão de uma inteligência. Fica, pois, sabendo que a mesa que se move não se torna Espírito e que não tem, em si mesma, capacidade de pensar, nem de querer.” NOTA. Muito amiúde, na linguagem usual, servimo-nos de uma expressão análoga. Diz-se de uma roda, que gira velozmente, que está animada de um movimento rápido.17° Qual a causa preponderante, na produção desse fenômeno: o Espírito, ou o fluido?“O Espírito é a causa, o fluido o instrumento, ambos são necessários.”18° Que papel, nesse caso, desempenha a vontade do médium?“O de atrair os Espíritos e secundá-los no impulso que dão ao fluido.” — É sempre indispensável a ação da vontade?“Aumenta a força, mas nem sempre é necessária, pois que o movimento pode produzir-se contra essa vontade, ou a seu malgrado, e isso prova haver uma causa independente do médium.” NOTA. Nem sempre o contato das mãos é necessário para que um objeto se mova. As mais das vezes esse contato só se faz preciso para dar o primeiro impulso; porém, desde que o objeto está animado, pode obedecer à vontade do Espírito, sem contato material. Depende isto, ou da potencialidade do médium, ou da natureza do Espírito. Nem sempre mesmo é indispensável um primeiro contato, do que são provas os movimentos e deslocamentos espontâneos, que ninguém cogitou de provocar.19° Por que é que nem toda gente pode produzir o mesmo efeito e não têm todos os médiuns o mesmo poder?“Isto depende da organização e da maior ou menor facilidade com que se pode operar a combinação dos fluidos. Influi também a maior ou menor simpatia do médium para com os Espíritos que encontram nele a força fluídica necessária. Dá-se com esta força o que se verifica com a dos magnetizadores, que não é igual em todos. A esse respeito, há mesmo pessoas que são de todo refratárias; outras com as quais a combinação só se opera por um esforço de vontade da parte delas; outras, finalmente, com quem a combinação dos fluidos se efetua tão natural e facilmente, que elas nem dão por isso e servem de instrumento a seu mau grado, como atrás dissemos.” (Vede aqui adiante o capítulo das Manifestações espontâneas.) NOTA. Estes fenômenos têm sem dúvida por princípio o magnetismo, porém, não como geralmente o entendem. A prova está na existência de poderosos magnetizadores que não conseguiram fazer que uma pequenina mesa se movesse e na de pessoas que não logram magnetizar a ninguém, nem mesmo a uma criança, às quais, no entanto, basta que ponham os dedos sobre uma mesa pesada, para que esta se agite. Assim, desde que a força mediúnica não guarda proporção com a força magnética, é que outra causa existe.20° As pessoas qualificadas de elétricas podem ser consideradas médiuns?“Essas pessoas tiram de si mesmas o fluido necessário à produção do fenômeno e podem operar sem o concurso de outros Espíritos. Não são, portanto, médiuns, no sentido que se atribui a esta palavra. Mas, também pode dar-se que um Espírito as assista e se aproveite de suas disposições naturais.” NOTA. Sucede com essas pessoas o que ocorre com os que podem operar com ou sem o concurso de Espíritos estranhos. (Veja-se, no capítulo dos Médiuns, o artigo relativo aos médiuns sonambúlicos.)21° O Espírito que atua sobre os corpos sólidos para movê-los se coloca na substância mesma dos corpos, ou fora dela?“Dá-se uma e outra coisa. Já dissemos que a matéria não constitui obstáculos para os Espíritos. Em tudo eles penetram. Uma porção do perispírito se identifica, por assim dizer, com o objeto em que penetra.”
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [Ruídos]
Temas Relacionados:
22° Como faz o Espírito para bater? Serve-se de algum objeto material?“Tanto quanto dos braços para levantar a mesa. Sabes perfeitamente que nenhum martelo tem o Espírito à sua disposição. Seu martelo é o fluido que, combinado, ele põe em ação, pela sua vontade, para mover ou bater. Quando move um objeto, a luz vos dá a percepção do movimento; quando bate, o ar vos traz o som.”23° Concebemos que seja assim, quando o Espírito bate num corpo duro; mas como pode fazer que se ouçam ruídos, ou sons articulados na massa instável do ar?“Pois que é possível atuar sobre a matéria, tanto pode ele atuar sobre uma mesa, como sobre o ar. Quanto aos sons articulados, pode imitá-los, como o pode fazer com quaisquer outros ruídos.”24° Dizes que o Espírito não se serve de suas mãos para deslocar a mesa. Entretanto, já se tem visto, em certas manifestações visuais, aparecerem mãos a dedilhar um teclado, a percutir as teclas e a tirar dali sons. Neste caso, o movimento das teclas não será devido, como parece, a pressão dos dedos? E não é também direta e real essa pressão, quando se faz sentir sobre nós, quando as mãos que a exercem deixam marcas na pele?“Não podeis compreender a natureza dos Espíritos nem a maneira por que atuam, senão mediante comparações, que de uma e outra coisa apenas vos dão ideia incompleta, e errareis sempre que quiserdes assimilar aos vossos os processos de que eles usam. Estes, necessariamente, hão de corresponder à organização que lhes é própria. Já te não disse eu que o fluido do perispírito penetra a matéria e com ela se identifica, que a anima de uma vida factícia? Pois bem! Quando o Espírito põe os dedos sobre as teclas, realmente os põe e de fato as movimenta. Porém, não é por meio da força muscular que exerce a pressão. Ele as anima, como o faz com a mesa, e as teclas, obedecendo-lhe à vontade, se abaixam e tangem as cordas do piano. Em tudo isto uma coisa ainda se dá, que difícil vos será compreender: é que alguns Espíritos tão pouco adiantados se encontram e, em comparação com os Espíritos elevados, tão materiais se conservam, que guardam as ilusões da vida terrena e julgam obrar como quando tinham o corpo de carne. Não percebem a verdadeira causa dos efeitos que produzem, mais do que um camponês compreende a teoria dos sons que articula. Perguntai-lhes como é que tocam piano e vos responderão que batendo com os dedos nas teclas, porque julgam ser assim que o fazem. O efeito se produz instintivamente neles, sem que saibam como, se bem lhes resulte da ação da vontade. O mesmo ocorre, quando se exprimem por palavras.” NOTA. Destas explicações decorre que os Espíritos podem produzir todos os efeitos que nós outros homens produzimos, mas por meios apropriados à sua organização. Algumas forças, que lhes são próprias, substituem os músculos de que precisamos para atuar, da mesma maneira que, para um mudo, o gesto substitui a palavra que lhe falta.
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [Fenômenos aparentemente contrários às leis conhecidas da natureza]
Temas Relacionados:
25° Entre os fenômenos que se apontam como probantes da ação de uma potência oculta, alguns há evidentemente contrários a todas as conhecidas leis da Natureza. Nesses casos, não será legítima a dúvida?“É que o homem está longe de conhecer todas as leis da Natureza. Se as conhecesse todas, seria Espírito superior. Cada dia que se passa desmente os que, supondo tudo saberem, pretendem impor limites à Natureza, sem que por isso, entretanto, se tornem menos orgulhosos. Desvendando-lhe, incessantemente, novos mistérios, Deus adverte o homem de que deve desconfiar de suas próprias luzes, porquanto dia virá em que a ciência do mais sábio será confundida. Não tendes todos os dias, sob os olhos, exemplos de corpos animados de um movimento que domina a força da gravitação? Uma pedra, atirada para o ar, não sobrepuja momentaneamente aquela força? Pobres homens, que vos considerais muito sábios e cuja tola vaidade a todos os momentos está sendo desbancada, ficai sabendo que ainda sois muito pequeninos.”
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [O fluido universal é o principal agente das manifestações]
Temas Relacionados:
75. Estas explicações são claras, categóricas e isentas de ambiguidade. Delas ressalta, como ponto capital, que o fluido universal, onde se contém o princípio da vida, é o agente principal das manifestações, agente que recebe impulsão do Espírito, seja encarnado, seja errante. Condensado, esse fluido constitui o perispírito, ou invólucro semimaterial do Espírito. Encarnado este, o perispírito se acha unido à matéria do corpo; estando o Espírito na erraticidade, ele se encontra livre. Quando o Espírito está encarnado, a substância do perispírito se acha mais ou menos ligada, mais ou menos aderente, se assim nos podemos exprimir. Em algumas pessoas se verifica, por efeito de suas organizações, uma espécie de emanação desse fluido e é isso, propriamente falando, o que constitui o médium de influências físicas. A emissão do fluido animalizado pode ser mais ou menos abundante, como mais ou menos fácil a sua combinação, donde os médiuns mais ou menos poderosos. Essa emissão, porém, não é permanente, o que explica a intermitência do poder mediúnico.76. Façamos uma comparação. Quando se tem vontade de atuar materialmente sobre um ponto colocado à distância, quem quer é o pensamento, mas o pensamento por si só não irá percutir o ponto; é-lhe preciso um intermediário, posto sob a sua direção: uma vara, um projétil, uma corrente de ar, etc. Notai também que o pensamento não atua diretamente sobre a vara, porquanto, se esta não for tocada, não se moverá. O pensamento, que não é senão o Espírito encarnado está unido ao corpo pelo perispírito e não pode atuar sobre o corpo sem o perispírito, como não o pode sobre a vara sem o corpo. Atua sobre o perispírito, por ser esta a substância com que tem mais afinidade; o perispírito atua sobre os músculos, os músculos tomam a vara e a vara bate, no ponto visado. Quando o Espírito não está encarnado, faz-se-lhe mister um auxiliar estranho e este auxiliar é o fluido, mediante o qual toma ele o objeto, sobre que quer atuar, apto a lhe obedecer à impulsão da vontade.77. Assim, quando um objeto é posto em movimento, levantado ou atirado para o ar, não é que o Espírito o tome, empurre e suspenda, como o faríamos com a mão. O Espírito o satura, por assim dizer, do seu fluido, combinado com o do médium, e o objeto, momentaneamente vivificado desta maneira, obra como o faria um ser vivo, com a diferença apenas de que, não tendo vontade própria, segue o impulso que lhe dá a vontade do Espírito. Pois que o fluido vital, que o Espírito, de certo modo, emite, dá vida factícia e momentânea aos corpos inertes; pois que o perispírito não é mais do que esse mesmo fluido vital, segue-se que, quando o Espírito está encarnado, é ele próprio quem dá vida ao seu corpo, por meio do seu perispírito, conservando-se unido a esse corpo, enquanto a organização deste o permite. Quando se retira, o corpo morre. Agora, se, em vez de uma mesa, esculpirmos uma estátua de madeira e sobre ela atuarmos, como sobre a mesa, teremos uma estátua que se moverá, que baterá, que responderá com os seus movimentos e pancadas. Teremos, em suma, uma estátua animada momentaneamente de uma vida artificial. Em lugar de mesas falantes, ter-se-iam estátuas falantes. Quanta luz esta teoria não projeta sobre uma imensidade de fenômenos até agora sem solução! Quantas alegorias e efeitos misteriosos ela não explica!78. Os incrédulos ainda objetam que o fenômeno da suspensão das mesas, sem ponto de apoio, é impossível, por ser contrário à lei de gravitação. Responder-lhes-emos que, em primeiro lugar, a negativa não constitui uma prova; em segundo lugar, que, sendo real o fato, pouco importa contrarie ele todas as leis conhecidas, circunstância que só provaria uma coisa: que ele decorre de uma lei desconhecida e os negadores não podem alimentar a pretensão de conhecerem todas as leis da Natureza. Acabamos de explicar uma dessas leis, mas isso não é razão para que eles a aceitem, precisamente porque ela nos é revelada por Espíritos que despiram a veste terrena, em vez de o ser por Espíritos que ainda trazem essa veste e têm assento na Academia. De modo que, se o Espírito de Arago, vivo na Terra, houvesse enunciado essa lei, eles a teriam admitido de olhos fechados; mas, desde que vem do Espírito de Arago, morto, é uma utopia. Por que isto? Porque acreditam que, tendo Arago morrido, tudo o que nele havia também morreu. Não temos a presunção de os dissuadir; entretanto, como tal objeção pode causar embaraço a algumas pessoas, tentaremos dar-lhes resposta, colocando-nos no ponto de vista em que eles se colocam, isto é, abstraindo, por instante, da teoria da animação factícia.
2ª Parte • DAS MANIFESTAÇÕES ESPÍRITAS • [Aumento e diminuição de peso dos corpos]
Temas Relacionados:
79. Quando se produz o vácuo na campânula da máquina pneumática, essa campânula adere com força tal ao seu suporte, que impossível se torna suspendê-la, devido ao peso da coluna de ar que sobre ela faz pressão. Deixe-se entrar o ar e a campânula pode ser levantada com a maior facilidade, porque o ar que lhe fica por baixo contrabalança o ar que, pela parte exterior, a comprime. Contudo, se ninguém lhe tocar, ela permanecerá assente no suporte, por efeito da lei de gravidade. Agora, comprima-se-lhe o ar no interior, dê-se-lhe densidade maior que a do que está por fora, e a campânula se erguerá, apesar da gravidade. Se a corrente de ar for violenta e rápida, a mesma campânula se manterá suspensa no espaço, sem nenhum ponto visível de apoio, à guisa desses bonecos que se fazem rodopiar em cima de um repuxo d’água. Por que então o fluido universal, que é o elemento de toda a Natureza, acumulado em torno da mesa, não poderia ter a propriedade de lhe diminuir ou aumentar o peso específico relativo, como faz o ar com a campânula da máquina pneumática, como faz o gás hidrogênio com os balões, sem que para isso seja necessária a derrogação da lei de gravidade? Conheceis, porventura, todas as propriedades e todo o poder desse fluido? Não. Pois, então, não negueis a realidade de um fato, apenas por não o poderdes explicar.80. Voltemos à teoria do movimento da mesa. Se, pelo meio indicado, o Espírito pode suspender uma mesa, também pode suspender qualquer outra coisa: uma poltrona, por exemplo. Se pode levantar uma poltrona, também pode, tendo força suficiente, levantá-la com uma pessoa assentada nela. Aí está a explicação do fenômeno que o Sr. Home produziu inúmeras vezes consigo mesmo e com outras pessoas. Repetiu-o durante uma viagem a Londres e, para provar que os espectadores não eram joguetes de uma ilusão de ótica, fez no forro, enquanto suspenso, uma marca a lápis e que muitas pessoas lhe passassem por baixo. Sabe-se que o Sr. Home é um poderoso médium de efeitos físicos. Naquele caso, era ao mesmo tempo a causa eficiente e o objeto.81. Falamos, há pouco, do possível aumento de peso. Efetivamente, esse é um fenômeno que às vezes se produz e que nada apresenta de mais anormal do que a prodigiosa resistência da campânula, sob a pressão da coluna atmosférica. Têm-se visto, sob a influência de certos médiuns, objetos muito leves oferecerem idêntica resistência e, em seguida, cederem de repente ao menor esforço. Na experiência de que acima tratamos, a campânula não se torna realmente mais nem menos pesada em si mesma; mas, parece ter maior peso, por efeito da causa exterior que sobre ela atua. O mesmo provavelmente se dá aqui. A mesa tem sempre o mesmo peso intrínseco, porquanto sua massa não aumentou; porém, uma força estranha se lhe opõe ao movimento e essa causa pode residir nos fluidos ambientes que a penetram, como reside no ar a que aumenta ou diminui o peso aparente da campânula. Fazei a experiência da campânula pneumática diante de um campônio ignorante, incapaz de compreender que o que atua é o ar, que ele não vê, e não vos será difícil persuadi-lo de que aquilo é obra do diabo. Dirão talvez que, sendo imponderável esse fluido, um acúmulo dele não pode aumentar o peso de qualquer objeto. De acordo; mas notai que, se nos servimos do termo acúmulo, foi por comparação, não por que assimilemos em absoluto aquele fluido ao ar. Ele é imponderável: seja. Entretanto, nada prova que o é. Desconhecemos a sua natureza íntima e estamos longe de lhe conhecer todas as propriedades. Antes que se houvesse experimentado a gravidade do ar, ninguém suspeitava dos efeitos dessa mesma gravidade. Também a eletricidade se classifica entre os fluidos imponderáveis; no entanto, um corpo pode ser fixado por uma corrente elétrica e oferecer grande resistência a quem queira suspendê-lo. Tornou-se, assim, aparentemente mais pesado. Fora ilógico afirmar-se que o suporte não existe, simplesmente por não ser visível. O Espírito pode ter alavancas que nos sejam desconhecidas: a Natureza nos prova todos os dias que o seu poder ultrapassa os limites do testemunho dos sentidos. Só por uma causa semelhante se pode explicar o singular fenômeno, tantas vezes observado, de uma pessoa fraca e delicada levantar com dois dedos, sem esforço e como se fosse uma pena, um homem forte e robusto, juntamente com a cadeira em que está assentado. As intermitências da faculdade provam que a causa é estranha à pessoa que produz o fenômeno..